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Chico Alves

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Bolsonaristas usam morte de PM baiano para incitar insubordinação nas redes

Colunista do UOL

29/03/2021 11h02

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Há muito se sabe que a tropa de choque de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais não está nem um pouco preocupada com a pandemia de covid-19. Desde o ano passado, esses personagens ocupam-se de divulgar tratamentos ineficazes contra a doença e tentar desacreditar a vacina. Agora, no momento mais dramático da crise sanitária, acharam outra prioridade: incitar a insubordinação nas PMs.

O episódio em que ontem o policial militar Wesley Góes aparentemente teve surto psicótico na Bahia, deu tiros para o alto e disparou contra os próprios colegas, está sendo usado como ponto de partida para uma ofensiva pesada de fake news contra o governador da Bahia, Rui Costa (PT). Ao revidar ao ataque, integrantes do Bope alvejaram Góes, que acabou morrendo no hospital.

A história criada pelos bolsonaristas é de que o PM foi alvejado por se insurgir contra as ordens do comando para "prender trabalhadores" que desobedeciam às medidas restritivas determinadas pelo governador. Na verdade, ele atirou contra os colegas de farda. Em pouco tempo se multiplicaram os vídeos e áudios nas plataformas virtuais tratando Góes como mártir.

Com esse festival de mentiras, de uma tacada só as redes bolsonaristas miram dois objetivos: atacam a adoção de medidas restritivas e incitam policiais à insubordinação da PM contra um adversário político. Difícil saber qual dos dois é mais grave.

Uma das pontas de lança nessa divulgação de mensagens é ninguém menos que a deputada Bia Kicis (PSL-DF), conhecida por divulgar fake news — é inclusive investigada no inquérito do Supremo Tribunal Federal sobre o tema —, que atualmente preside a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (!).

A responsável pela principal comissão da Casa fez várias postagens nas redes sociais divulgando áudio e vídeos de origem duvidosa sobre o caso, classificou o PM morto como herói e incentivou o motim na corporação baiana. Kicis tratou a orientação para reprimir a desobediência às medidas restritivas como "ordens ilegais do governador Rui Costa". Desvario total.

No início da manhã de hoje, a deputada disse que "foi informada" de que o soldado teve um surto e removeu o post ara aguardar as investigações — algo que qualquer pessoa responsável faria. Termina sua tímida errata citando "o reconhecimento da fundamental hierarquia militar".

Outros bolsonaristas tentam surfar na onda da desordem, como o deputado Soldado Prisco (PSC-BA), que fez um vídeo pouco após o tiroteio no Farol da Barra, pedindo para a PM parar de trabalhar. Carla Zambelli (PSL-SP) foi outra a engrossar as fileiras do oportunismo — com o agravante de ser casada com o coronel Aginaldo, comandante da Força Nacional, que tratou como heróis os PMs amotinados do Ceará, há dois anos.

E não podia faltar o filho do presidente da República, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). "Aos vocacionados em combater o crime prender trabalhador é a maior punição", escreveu ele no Twitter. "Esse sistema ditatorial vai mudar".

Vários bolsonaristas divulgaram vídeos de uma multidão, que seria formada por policiais, à porta do hospital onde Góes estava internado na noite de ontem, gritando " A PM parou!".

Enfim, é a essa campanha de desestabilização que os bolsonaristas se dedicam desde ontem, enquanto diariamente milhares de brasileiros estão morrendo de covid-19. Não querem saber de unir forças para salvar vidas, querem a guerra, como a coluna afirmou dias atrás.

Se as instituições realmente estivessem funcionando, os parlamentares que insuflam os PMs ao motim seriam punidos exemplarmente, para que o país pudesse recuperar a paz e concentrar esforços em salvar vidas na pandemia.

Como estamos institucionalmente combalidos, fica tudo por isso mesmo. O presidente Jair Bolsonaro continua com seu desgoverno dando todas as chances possíveis ao vírus e os bolsonaristas — inclusive seu filho —- seguem tentando incendiar o Brasil.

O primeiro objetivo foi alcançado. Atingirão a segunda meta?