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Contrariando Bolsonaro, comitê coloca OMS como líder na resposta à pandemia

Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e presidente Jair Bolsonaro no resort de Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida - TOM BRENNER
Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e presidente Jair Bolsonaro no resort de Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida Imagem: TOM BRENNER

Colunista do UOL

01/05/2020 14h50

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Reunidos nesta sexta-feira, o Comitê de Emergência Sanitária consolidou o papel da OMS como central no combate à pandemia. O organismo é formado por 20 especialistas de todo o mundo e atua de forma independente. Sua recomendação foi a de fortalecer o poder da agência, hoje duramente questionada por presidentes como Donald Trump e Jair Bolsonaro.

Foi esse mesmo Comitê que, há três meses, sugeriu que a emergência global fosse declarada. 90 dias depois, eles voltaram a se reunir e confirmaram que a situação continua sendo classificada como uma emergência. Desta vez, porém, os principais especialistas insistiram sobre a necessidade de que a resposta à pandemia tenha uma resposta coordenada.

Para os especialistas, governos precisam "apoiar a liderança da OMS e continuar a colaborar com a OMS em todos os níveis da organização e com outros países para permitir uma preparação e resposta global eficaz à pandemia COVID-19".

Numa declaração emitida após o encontro, os especialistas sugerem que a OMS "lidere e coordene a resposta global à pandemia da COVID-19 em colaboração com os países, a Organização das Nações Unidas (ONU) e outros parceiros".

Será de responsabilidade da entidade "fornecer orientações adicionais aos países sobre o ajuste das medidas de saúde pública, levando em conta as diferentes situações epidemiológicas da pandemia".

A agência seria a responsável por "continuar a coordenar redes globais de especialistas em epidemiologia, laboratório, vacinas, cuidados clínicos, prevenção e controle de infecções, ciências sociais e pesquisa operacional; modelagem; e outros suportes técnicos".

No Brasil, Bolsonaro criticou o papel da agência de Saúde, questionou as competências de seu diretor e seu chanceler sugeriu que haveria um plano comunista para fortalecer a entidade. Nos EUA, Trump suspendeu o repasse de recursos para a entidade e quer uma reforma da OMS.

Para os maiores especialistas do setor, porém, a crise global vai exigir que a agência lidere uma resposta e pedem que governos coloquem a OMS no centro da resposta.

Num comunicado emitido nesta sexta-feira, em Genebra, também é sugerido que a OMS ainda atue para apoiar os esforços de governos para "interromper a transmissão". Os países devem, assim, "manter sistemas de vigilância robustos; aumentar as capacidades de detecção de casos, testes, isolamento de casos, rastreamento de contatos, quarentena de contatos e resposta rápida; fortalecer a força de trabalho da saúde pública; e envolver ativamente as comunidades para o rastreamento de contatos, com foco especial nas áreas de alto risco".

O comitê ainda sugere que governos compartilhem com a OMS todos os dados necessários para realizar avaliações globais de risco.

A OMS ainda teria o papel de coordenar ensaios clínicos para terapêutica e vacinas e garantir "acesso equitativo a equipamentos de proteção individual, diagnósticos e equipamentos biomédicos essenciais para a resposta à pandemia".


Os especialistas ainda listaram dezenas de recomendações para governos e para o setor de saúde. Eis algumas delas:


- Fortalecer a preparação para emergências de saúde e construir sistemas de saúde resilientes, incorporando lições aprendidas durante diferentes estágios da pandemia e compartilhando experiências com outros países.

- Em locais onde não é possível testar uma grande proporção de casos suspeitos, monitorar as tendências gerais; realizar a detecção precoce através da confirmação laboratorial de um número limitado de casos com foco em trabalhadores da saúde; e implementar rapidamente medidas de saúde pública.

- Evitar restrições ao transporte internacional de alimentos, suprimentos médicos e outros suprimentos essenciais e permitir a movimentação segura do pessoal essencial necessário para uma resposta pandêmica eficaz.

- Implementar medidas de viagem apropriadas com consideração de seus benefícios de saúde pública, incluindo triagem de entrada e saída, educação dos viajantes sobre o comportamento responsável de viagem, descoberta de casos, rastreamento de contatos, isolamento e quarentena, incorporando evidências sobre o papel potencial da transmissão pré-sintomática e assintomática.

- Implementar e monitorar o rastreamento de casos e contatos de viajantes, usando ferramentas digitais quando apropriado.

- Continuar a rever as medidas de viagem e comércio com base em avaliações regulares de risco, padrões de transmissão na origem e no destino, análise de custo-benefício, evolução da pandemia e novos conhecimentos da COVID-19.

- Envolver-se em esforços globais para responder aos desafios da COVID-19 no gerenciamento de embarcações marítimas.

-Não implementar restrições comerciais além daquelas consideradas de importância para a saúde pública, de acordo com os acordos internacionais relevantes.

- Priorizar a proteção da força de trabalho da saúde através do acesso a treinamento e fornecimento de equipamentos de proteção individual, medidas de prevenção e controle de infecções, melhoria das condições de trabalho, aplicação das estratégias de testes recomendadas pela OMS e prevenção de estigma e ataques aos profissionais de saúde.

- Trabalhar com a OMS e parceiros para fortalecer a cadeia global de fornecimento de alimentos, proteger os trabalhadores do setor de alimentos, gerenciar adequadamente os mercados de alimentos e mitigar possíveis interrupções no fornecimento de alimentos, especialmente para populações vulneráveis.

- Promover boas práticas para gerenciar os riscos do comércio de animais vivos nos mercados de alimentos e regular o comércio de animais silvestres exóticos.

- Continuar engajando as comunidades para lidar com rumores e desinformações e manter o público informado, com foco nas populações vulneráveis.

- Abordar lacunas de pesquisa, tais como: rotas de transmissão, incluindo o papel das gotículas de infecção assintomática e pré-sintomática, contato, fomento e transmissão de aerossóis; e hospedeiros de origem animal e intermediários, em colaboração com parceiros.

- Continuar a apoiar e conduzir a pesquisa COVID-19, em linha com o Plano de Pesquisa e Desenvolvimento da OMS, e o roteiro das vacinas, diagnósticos e terapêuticas COVID-19.

- Manter os serviços essenciais de saúde através de uma provável resposta ampliada da COVID-19. Isso deve incluir prevenção essencial para doenças transmissíveis, particularmente vacinação; serviços relacionados à saúde reprodutiva, incluindo cuidados durante a gravidez e o parto; cuidados com populações vulneráveis, como bebês e adultos mais velhos; fornecimento de medicamentos e suprimentos para o manejo contínuo de doenças crônicas, incluindo condições de saúde mental; continuidade de terapias críticas de internação; manejo de condições de saúde de emergência e apresentações agudas comuns que requerem intervenção sensível ao tempo; e serviços auxiliares, como imagens diagnósticas básicas, serviços laboratoriais e serviços de banco de sangue.


Os especialistas ainda apresentaram recomendações para a OMS. São elas:

- Trabalhar com a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e países para identificar a fonte zoonótica do vírus e a rota de introdução à população humana, incluindo o possível papel dos hospedeiros intermediários. Isto deve ser realizado através de esforços como missões científicas e de campo colaborativas, o que permitirá intervenções direcionadas e uma agenda de pesquisa para reduzir o risco de eventos similares.

- Trabalhar em estreita colaboração com a OIE e a FAO para fornecer orientações sobre como prevenir infecções pelo SRA-CoV-2 em animais e humanos e prevenir o estabelecimento de novos reservatórios zoonóticos.

- Trabalhar com organizações e países parceiros para fortalecer a cadeia global de fornecimento de alimentos, proteger os trabalhadores do setor de alimentos, gerenciar adequadamente os mercados de alimentos e mitigar possíveis interrupções no fornecimento de alimentos.

- Apoiar os países na avaliação e gestão das consequências não intencionais das medidas de saúde pública implementadas para controlar a pandemia da COVID-19, incluindo a violência baseada em gênero e a negligência infantil.

- Apoiar os países para enfrentar a escassez de medicamentos essenciais e produtos de saúde, equipamentos de proteção individual e outros suprimentos médicos e estabelecer práticas sustentáveis de gerenciamento de risco para prevenir futuras faltas.

- Combater rumores e desinformações.

- Trabalhar com parceiros e países para articular potenciais conseqüências a longo prazo da pandemia da COVID-19, enfatizando a necessidade de fortalecer a preparação intersetorial, a transparência e a coordenação global.

- Esclarecer a estratégia de testes, apoiar os países para aumentar a capacidade de testes, e objetivar o acesso equitativo a testes diagnósticos e suprimentos em função de falhas de mercado e escassez global.

- Continuar trabalhando com países e parceiros para possibilitar as viagens essenciais necessárias para a resposta à pandemia, ajuda humanitária, repatriação e operações de carga.

- Desenvolver orientação estratégica com parceiros para o retorno gradual às operações normais de viagem de passageiros de forma coordenada que proporcione proteção adequada quando o distanciamento físico não for viável.

- Atualizar recomendações sobre medidas de viagem apropriadas e analisar seus efeitos na transmissão internacional da COVID-19, com consideração do equilíbrio entre benefícios e conseqüências não intencionais, incluindo triagem de entrada e saída, educação dos viajantes sobre comportamento responsável de viagem, descoberta de casos, rastreamento de contatos, isolamento e quarentena, incorporando evidências sobre o papel potencial da transmissão pré-sintomática e assintomática.