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OMS: Com 90% da população sem anticorpo, imunidade de rebanho não é viável

Diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durate entrevista coletiva em Genebra -
Diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durate entrevista coletiva em Genebra

Colunista do UOL

18/08/2020 08h24Atualizada em 18/08/2020 15h01

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A OMS (Organização Mundial da Saúde) informou hoje que descarta a imunidade de rebanho como forma de superar a pandemia do novo coronavírus e aponta que, com mais de 720 mil mortos pelo mundo e oito meses depois da eclosão da crise, estudos revelam que, em média, 90% da população do planeta continua suscetível ao vírus.

Para Mike Ryan, diretor de operações da OMS, o mundo não pode apostar numa estratégia de criar uma imunidade de rebanho como forma de barrar a proliferação da covid-19, que já atinge quase 22 milhões de casos. Tal proposta chegou a ser considerada por governos, como forma de manter as economias abertas e, ao mesmo tempo, acelerar a proteção de suas populações.

De acordo com a agência, estudos em mais de 50 países indicaram que menos 10% da população apresenta algum tipo de evidência da presença de anticorpos e, mesmo entre os profissionais de saúde e pessoas mais exposta ao vírus, a taxa não passa de 20% ou 25%.

"Isso significa que a maioria da população mundial continua suscetível à infecção e que o vírus tem a oportunidade de circular", declarou Maria van Kerkhove, diretora técnica da OMS. Mais de cem estudos estudos estão sendo realizados para avaliar tal situação.

A especialista ainda lançou um apelo para que cada indivíduo entenda os riscos que atravessa. "As pessoas precisam tomar decisões. Suas vidas dependem disso", afirmou, ao ser questionada sobre fotos de aglomerações em Wuhan, capital da província chinesa de Hubei, apontada como a origem no vírus.

"As pessoas precisam entender que as pessoas estão morrendo", insistiu. "Todos precisam entender quais são os riscos e se é possível evitar aglomerações", insistiu.

Ryan também criticou governos que busquem esse caminho. "Não sabemos qual o nível de imunidade de rebanho", disse. "Não há, para mim, uma questão. Há um longo caminho para isso e vamos continuar longe disso sem uma vacina", afirmou.

"Como planeta, como uma população global, não estamos nem perto dos níveis de imunidade capaz de parar essa doença", insistiu. Para a agência, falar em circular o vírus como forma de criar uma proteção envolveria um número elevado de mortes, algo inaceitável para a entidade.

"Precisamos nos focar em suprimir a transmissão e não esperar que a imunidade de rebanho seja nossa salvação", declarou.

De acordo com Ryan, existe a possibilidade de que a imunidade de rebanho ocorra a taxas inferiores a 80%, 70% ou 60% da população. Mas, ainda assim, a agência descarta a estratégia como uma via possível. "Isso não é a salvação e nem deve ser a solução", insistiu.

"Se o vírus circula na comunidade, ele pode entrar na escola"

A OMS ainda voltou a alertar sobre a reabertura de escolas. Maria van Kerkhove insistiu que os estabelecimentos de ensino não estão numa situação de isolamento e que, se uma sociedade vive uma transmissão intensa do vírus da covid-19, ela pode também ser afetada.

"Escolas não operam em isolamento. Se o vírus circula na comunidade, há uma possibilidade de que entre na escola", afirmou a especialista.

Ela não minimiza a importância da reabertura de escolas, inclusive para proteger crianças. Mas insistiu que adaptações precisam ser realizadas e que as reaberturas precisam ocorrer de maneira segura.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou, no começo de agosto, que escolas públicas e particulares poderão reabrir para aulas de reforço e atividades em bibliotecas e laboratórios a partir de 8 de setembro, nas regiões que permanecerem por 28 dias na fase amarela do Plano São Paulo.

As aulas presenciais só deverão ser retomadas em 7 de outubro, desde que seguidos todos os protocolos de segurança e de ocupação máxima das salas —na primeira etapa do plano de retorno, será de 35% dos alunos.

Nacionalismo contribuiu para acelerar pandemia

Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, ainda usou a coletiva de imprensa em Genebra para alertar que o nacionalismo no fornecimento de equipamentos e itens de proteção permitiu que a pandemia da covid-19 se acelerasse e ampliou fracasso da comunidade internacional diante da crise.

Segundo ele, governos impediram a exportação de materiais, o que deixou milhões sem proteção. Tedros indicou que, mesmo hoje, o fornecimento de certos equipamentos continua sendo um problema.

?"Qual a lição? Ainda que exista a vontade de líderes de proteger suas populações, a resposta deve ser coletiva", disse. "Não se trata de caridade. A forma mais rápida de reabrir as economias é proteger os mais vulneráveis em todos os lugares e não proteger 100% de um só país", alertou. "Ninguém está seguro até que todos estejam seguros", disse Tedros.

O diretor da OMS espera que os erros dos primeiros meses da pandemia não se repitam no momento da distribuição da futura vacina. "Na medida que novos remédios apareçam, é crítico que governos não repitam os mesmos erros", disse. "Precisamos evitar o nacionalismo de vacinas", defendeu.

Tedros explicou que o plano global que está sendo estabelecido prevê o envio de vacinas para 20% da população de cada um dos países. Isso permitiria vacinar os profissionais de saúde, as pessoas com mais de 65 anos e indivíduos com doenças crônicas.

Tal estratégia serviria para estabilizar os sistemas de saúde e permitir a retomada da economia

De acordo com Tedros, ele enviou uma carta a todos os governos do mundo para que se unam ao projeto. "Precisamos de soluções globais", disse. Entre os governos que ainda não fazem parte do projeto estão os EUA.