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Josias de Souza

Bolsonaro torna o Ministério da Saúde irrelevante

                                AGÊNCIA BRASIL
Imagem: AGÊNCIA BRASIL

Colunista do UOL

15/05/2020 15h19

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Durou menos ele um mês a paciência do oncologista Nelson Teich. É o segundo ministro da Saúde a perder a cabeça sob Jair Bolsonaro em meio à pandemia. O antecessor Henrique Mandetta não foi demitido, ele se deu alta. Teich não pediu demissão, foi empurrado para fora do governo.

Bolsonaro quis impor a Teich o uso indiscriminado de cloroquina no tratamento da covid-19. E o doutor não concordou em alterar o protocolo do ministério, que prevê a utilização do remédio apenas em casos graves —ainda assim sob prescrição médica e com autorização por escrito do paciente.

O debate sobre a substituição de Teich foi aberto. Mas a escolha do próximo ministro tem pouca importância. Bolsonaro tornou a pasta da Saúde irrelevante em plena crise sanitária. Governadores e prefeitos já entenderam que, para enfrentar o coronavírus adequadamente, é preciso virar as costas para Brasília.

Estados e municípios não contam mais com a coordenação ou a orientação de Brasília. Reivindicam da União apenas equipamentos, sobretudo respiradores, e dinheiro —verbas constitucionais e emergenciais, do socorro recém-aprovado pelo Congresso para compensar a perda de arrecadação agravada pelo desligamento parcial da economia.

Já se sabia que o presidente da República, PhD em bula de cloroquina, ignora a sua própria ignorância científica. Mas alguns governadores e prefeitos tentavam restabelecer com Teich um diálogo que fluía com Mandetta. O ministro caiu na semana em que pretendia levar à vitrine um plano de gerenciamento da crise.

O próximo ministro da Saúde, ainda que queira dialogar, terá dificuldades para encontrar interlocutores. Está entendido que vale para o governo federal não as receitas dos doutores, mas a autoprescrição de Bolsonaro. E os remédios do presidente, por anticientíficos, são inaplicáveis.

Na origem da pandemia, Bolsonaro acorrentou-se a um negacionismo pueril. Desde então, sempre que não tem o que dizer sobre mortes do coronavírus, agora na casa de 14 mil, o presidente retira da gaveta duas ideias fixas: o fim do isolamento social, única alternativa à ausência da vacina; e o uso da cloroquina, remédio de serventia não comprovada.

Nos dois casos, Bolsonaro se comporta como um sujeito que bate com a cabeça na parede, na expectativa de que a qualquer momento a parede pode virar uma porta.