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Josmar Jozino

Direção de penitenciária confisca livro escrito por Tiriça, número 2 do PCC

05.jul.2017 -- Roberto Soriano, conhecido como "Tiriça", integrante do PCC, em foto de 2013 - Divulgação/SSP-SP
05.jul.2017 -- Roberto Soriano, conhecido como "Tiriça", integrante do PCC, em foto de 2013 Imagem: Divulgação/SSP-SP

Colunista do UOL

26/10/2020 10h54

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A direção da Penitenciária Federal de Brasília confiscou o livro escrito pelo preso Roberto Soriano, 47, o número 2 na hierarquia do PCC (Primeiro Comando da Capital), por entender que a obra pode trazer mensagens cifradas para a facção criminosa sobre a segurança da unidade prisional.

A Divisão de Inteligência da penitenciária recolheu as folhas de rascunhos em poder do prisioneiro e não autorizou a entrega do material literário para os familiares ou advogados de Roberto Soriano, também conhecido como Tiriça.

"Considerando o perfil do autor e o local onde se encontra, naturalmente que o texto pode e deve ser interpretado como possível referência à Penitenciária Federal de Brasília", argumentam o Depen (Departamento Penitenciário Nacional) e a diretoria do presídio.

No entendimento das autoridades carcerárias federais, o texto produzido pelo detento narra detalhes de batalhas ocorridas numa época medieval, havendo referências a reinos, castelos, muralhas, escudos, balas de canhões, escadas, cordas, túneis, plano de invasões, massacres e execuções.

Porém, na avaliação de quem o confiscou, a narrativa literária pode se tratar na realidade de uma tentativa de repassar mensagens codificadas sobre a segurança do presídio, oferecendo para os criminosos da organização em liberdade informações sobre uma possível ação de resgate.

O preso ficou inconformado com a censura. Em carta de duas páginas escrita dois meses atrás, ele explica que terminou o livro no dia 17 de março de 2020. Soriano diz na correspondência que só soube cinco meses depois, por meio de advogado, que a obra que deveria ser entregue para a família dele havia sido recolhida pelo Departamento de Inteligência.

Segundo o prisioneiro, um relatório feito pela diretoria do presídio concluiu que a obra é "imprópria e atenta contra a segurança". Soriano reclama também que nenhuma autoridade do sistema penitenciário federal o procurou para perguntar ou tirar qualquer dúvida sobre o livro.

O autor ressalta que escreveu um romance de ficção com narrativas sobre um período medieval. Acrescenta que fala sobre ruínas, oceanos e que fez mapas para poder situar geograficamente os leitores.

Afirma também que os personagens têm nomes de seus familiares, como as netas de 4 e 6 anos, além dos sogros e avós paternos e maternos. "Fiz essa escolha para homenageá-los", justifica.

O preso escritor descreve um castelo com tapeçarias, velas de cera, pisos de mármore, muralhas com fosso e sentinelas. Para os censores, essa parte do romance é a que mais intriga e pode ser alusão à segurança do presídio.

Mas para Soriano, essa narrativa não pode ser comparada às penitenciárias federais porque as unidades são de segurança máxima, modernas e nem muralhas possuem. "Fazer analogia de um castelo medieval com um presídio é errôneo", defende-se o prisioneiro.

Na obra, Soriano escreve sobre os soldados e diz que eles usam armadura, espadas, arco e flecha, facas, machados e catapultas. Os meios de transportes são carroças, cavalos e barcos. "Não é nada moderno que traga à luz algo subversivo", complementa o escritor.

As batalhas —continua Soriano— fazem parte do romance de ficção e "a invasão por meio de túnel a uma cidade sitiada pelo exército inimigo não significa alusão a presídio e não se pode fazer essa comparação", reclama o autor.

O presidiário menciona na carta que se inspirou no livro "Guerra dos Tronos", do escritor norte-americano George R.R. Martin, e diz ter esperança de que seu romance seja publicado e vire filme.

Ele afirma que se sente injustiçado e perseguido por uma censura fantasiosa e arbitrária. "O sistema prisional brasileiro desestimula o apenado", queixou-se. A defesa de Soriano pediu à Justiça o fim da censura e a devolução dos rascunhos do livro para a família do detento.
Roberto Soriano foi transferido do CRP (Centro de Readaptação Penitenciária) de Presidente Bernardes (SP) para presídio federal em novembro de 2012, após ser acusado de envolvimento em um plano para matar policiais militares.
Ele também foi acusado de mandar matar agentes penitenciários federais para intimidar autoridades e desestabilizar o sistema penitenciário coordenado pelo Depen.
Em depoimentos à Justiça, Soriano negou ser integrante de facção criminosa e disse que jamais mandou matar alguém. Para o Ministério Público do Estado de São Paulo, ele é líder do PCC e só está abaixo de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, chefe máximo do grupo.