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Josmar Jozino

REPORTAGEM

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"Tenho medo de morrer", diz piloto apontado como o inimigo número 1 do PCC

o piloto de helicóptero Felipe Ramos Morais, 34, autor de delação premiada envolvendo a cúpula do PCC - Divulgação
o piloto de helicóptero Felipe Ramos Morais, 34, autor de delação premiada envolvendo a cúpula do PCC Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

05/05/2021 04h00

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Desde que saiu pela porta da frente da Penitenciária Federal de Campo Grande (MS), no dia 16 de abril deste ano, o piloto de helicóptero Felipe Ramos Morais, 34, autor de delação premiada envolvendo a cúpula do PCC (Primeiro Comando da Capital), só anda sob escolta de policiais federais.

"Eu não posso negar para você. Tenho muito medo de morrer", disse Felipe ao UOL na noite de terça-feira (3). Depois das delações dele, a Polícia Federal desarticulou o maior braço financeiro do PCC, prendeu dezenas de pessoas e bloqueou ao menos R$ 1 bilhão em bens e em contas bancárias.

Felipe foi libertado por determinação da Justiça do Ceará, onde responde a processo pela acusação de envolvimento nas mortes de Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, e Fabiano Alves de Souza, o Paca, mortos a tiros em fevereiro de 2018 na região metropolitana de Fortaleza.

Foi o piloto quem levou os dois líderes do PCC para a morte a bordo de um helicóptero de propriedade de Wagner Ferreira da Silva, o Cabelo Duro, um narcotraficante da Baixada Santista. Uma semana após as mortes de Gegê do Mangue e de Paca, Cabelo Duro foi assassinado com tiros de fuzil no Tatuapé, zona leste de São Paulo.

Segundo a Polícia Federal e a Polícia Civil do Ceará, Cabelo Duro recebeu a ordem do também narcotraficante Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, braço direito de Marco Willians Herbas Camacho, apontado como líder máximo do PCC, para assassinar Gegê e Paca.

Piloto de helicóptero Felipe Morais diz que foi agredido por membros do PCC - Reprodução - Reprodução
Piloto de helicóptero Felipe Morais diz que foi agredido por membros do PCC
Imagem: Reprodução

O piloto chegou a ser torturado por integrantes do PCC em uma favela no Guarujá, Baixada Santista, em 13 de janeiro de 2018, um mês antes das mortes de Gegê e Paca, conforme divulgou o UOL em reportagem publicada em 28 de agosto de 2020.

Eu nunca trabalhei para o PCC nem era integrante da facção criminosa. Eu prestava serviços para o Wagner e fui contratado por ele para fazer um voo no Ceará e transportar duas pessoas. Nem sabia quem era o Gegê nem Paca e muito menos que ambos seriam mortos."
Felipe Ramos Morais

Ele se entregou à polícia de Goiás alguns dias após o duplo assassinato e, depois disso, resolveu fazer delação premiada. Ele poderia ter sido libertado bem antes caso o Ministério Público do Ceará não tivesse insistido em dizer que Felipe não havia feito nenhum acordo com as autoridades.

Banho de sol com Ronnie Lessa

Felipe garante que ainda tem muitas revelações bombásticas a fazer, algumas delas envolvendo inclusive a ligação de políticos com a maior organização criminosa do Brasil. "Nos próximos dias vou contar tudo com todos os detalhes. Haverá muitas prisões", previu ele.

Nos bastidores policiais eu já sou chamado de Alberto Youssef, em referência ao doleiro que delatou políticos e empresários envolvidos no escândalo da Petrobras, presos em várias fases da Operação Lava-Jato. E minhas delações são chamadas de lava-jato do crime."

Considerado o inimigo número 1 do PCC, Felipe contou ao UOL que no presídio de Campo Grande ficava em uma cela vizinha ao xadrez de Ronnie Lessa, acusado de participar dos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista dela, Anderson Gomes, em 14 de março de 2018 no Rio de Janeiro.

"Eu saia para o banho de sol durante duas horas e conversava muito com ele no pátio. Também costumava jogar damas com o Adélio Bispo de Souza", lembrou. Adélio foi preso sob a acusação de ter esfaqueado Jair Bolsonaro (sem partido), durante campanha eleitoral para a presidência da República em 6 de setembro de 2018, em Juiz de Fora, Minas Gerais.

Guantánamo brasileira

A Penitenciária Federal de Campo Grande foi comparada por Felipe a Guantánamo, uma prisão militar dos Estados Unidos na Baía de Guantánamo, onde ficam os prisioneiros acusados de envolvimento com terrorismo.

"Ficar em presídio federal no Brasil é o mesmo que ser torturado 24 horas todos os dias. O tratamento é cruel e desumano. O de Campo Grande é o inferno na Terra", queixou-se.

Felipe afirmou que leu ao menos 300 livros no período em que ficou na penitenciária federal. "Li muito sobre aviação e agricultura, temas que gosto muito. Mas também escrevi um livro com o título 'Comando' narrando a minha história e que espero que seja publicado", acrescentou.

Além da publicação do livro, a esperança de Felipe é a de não ser injustiçado: "Se eu for condenado tem de ser pelo crime que cometi, o de associação criminosa, porque prestei serviços para o Wagner (Cabelo Duro) sabendo que ele era bandido. Mas do duplo homicídio eu não participei. Sou inocente. Espero que haja Justiça", ressaltou o piloto.