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Juliana Dal Piva

REPORTAGEM

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Cinco coisas que você não sabia sobre 'João de Deus' e seus crimes

João Teixeira de Faria - Reprodução
João Teixeira de Faria Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

03/10/2021 07h00

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Apesar a ampla divulgação dos crimes de João Teixeira de Faria, autointitulado "médium João de Deus", ainda há muito a ser desvendado sobre ele e o maior caso de violência sexual já investigado no Brasil.

No livro "João de Deus — O Abuso da Fé", a jornalista Cristina Fibe, uma das responsáveis pela revelação dos crimes pela imprensa, em 2018, conta diversos detalhes desconhecidos sobre a vida do ex-líder espiritual João Teixeira de Faria, condenado a mais de 60 anos de prisão. A obra será lançada em 14 de outubro pela Globo Livros.

Livro de Cristina Fibe sobre "João de Deus" - Reprodução - Reprodução
Livro de Cristina Fibe sobre "João de Deus"
Imagem: Reprodução

O aniversário do "santo"

João diz ter nascido em 24 de junho de 1942. A data, que consta em suas biografias oficiais, era motivo de grandes festas em Abadiânia, nas quais o ex-líder espiritual recebia governadores, prefeitos, promotores, militares e ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Os documentos do goiano, no entanto, mostram que ele não nasceu no Dia de São João, mas em 16 de junho de 1941. A diferença no registro nem seus amigos nem seus advogados conseguem explicar.

Mortes misteriosas

Um dos assessores mais próximos de João Teixeira foi assassinado no estacionamento da Casa de Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia, em 1995. Era uma noite de dezembro quando Mário Rodrigues dos Reis, que trabalhava para João havia mais de 15 anos, foi perfurado por dez tiros dentro de um Fusca azul. Apontado pelo MP-GO (Ministério Público de Goiás) como mandante do homicídio, Urubatan Andrade da Mota, sobrinho de João de Deus, jamais foi punido. Quarenta e dois dias depois do assassinato de Mário Reis, Urubatan morreu num acidente de avião, deixando quatro filhos, três mulheres, uma fazenda, sete veículos, 140 vacas e inúmeras dívidas, acertadas pessoalmente pelo tio.

Expulso de casa

João de Deus chegou a ter uma filial da Casa de Dom Inácio no Rio Grande do Sul — e acabou expulso de lá depois de abusar da filha menor de idade de um dos empresários locais que mantinham a sucursal funcionando. A Casa Sul, localizada entre Canela e Três Coroas, abriu em 2007 para atender à alta demanda de clientes do dito médium na região. O goiano ia para lá regularmente, e a filial era mantida por voluntários que faziam desde a faxina até a sopa servida aos fiéis. Quando souberam da violência sexual cometida contra a filha de um deles, em 2012, os empresários se reuniram e convocaram João para uma reunião. O ex-líder foi ameaçado de morte e saiu para nunca mais voltar. Ninguém, porém, formalizou a denúncia.

Violação "sem fraude"?

Na mesma época, João Teixeira enfrentava seu primeiro julgamento por crime sexual. A denúncia era de 2008, feita por uma menina de 16 anos que foi abusada ao procurar a Casa de Dom Inácio, em Abadiânia, para se tratar de síndrome do pânico. Os advogados de João recorreram à Wikipédia para explicar o quadro clínico da vítima, reproduzindo onze parágrafos da biblioteca colaborativa virtual, como "breves referências do que as pessoas que têm a doença podem sentir, imaginar, e o que pode ocorrer em seu dia a dia, com o intuito único e exclusivo de se evitarem pré-julgamentos e injustiças". A estratégia da defesa era chamar a sobrevivente de louca, e tratar o abuso — enquadrado pelo MP-GO como violação sexual mediante fraude — como um delírio. Em 2013, João acabou inocentado. A juíza, mulher, reconheceu que houve violação, mas não admitiu a fraude, alegando que a vítima sabia que estava sendo abusada e poderia ter chamado por seu pai, que estava na sala, de costas e de olhos fechados, a mando do dito médium.

Crianças entre as vítimas

Mais de 300 mulheres já denunciaram o ex-líder espiritual por crimes sexuais. Segundo o Ministério Público, João Teixeira costumava seguir um padrão ao escolher as mulheres que ele queria ver a sós, em um de seus aposentos privativos, durante os atendimentos ditos espirituais. Em sua maioria, eram jovens, brancas e magras. Menores de idade não foram poupadas — correspondem a mais de 15% das vítimas, segundo o MP-GO: 4,7% tinham entre 0 e 13 anos, e 13,2% tinham de 14 a 17. A faixa etária que predomina é de 18 a 30, com 25,4% dos casos.