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Com mentiras, Trump e Barr atacam adversários, a ciência e até a história

Enquanto especialista afirma que vacina contra covid-19 chega em meados de 2021, Trump a anuncia para outubro - LEAH MILLIS/REUTERS
Enquanto especialista afirma que vacina contra covid-19 chega em meados de 2021, Trump a anuncia para outubro Imagem: LEAH MILLIS/REUTERS

Colunista do UOL

17/09/2020 11h35

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A um mês e meio das eleições, o presidente Donald Trump e seus aliados vêm subindo o tom dos ataques aos adversários, à ciência e até a história.

Trump fez nesta quarta-feira um pronunciamento na Casa Branca para desmentir o diretor do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), Robert Redfield. O presidente teve intenção de humilhar um cientista responsável por dar orientações sanitárias a todos os americanos.

O presidente disse que Redfield, que prestara depoimento ao Congresso sob juramento, havia entendido mal e confusamente indagações a respeito de vacinas e máscaras. O diretor do CDC apresentou versão realista que contrasta com o cenário cor-de-rosa que Trump quer vender aos eleitores.

Segundo Redfield, vacinas deverão estar disponíveis em larga escala para o público americano somente no segundo ou terceiro trimestre de 2021. Ele também falou que, caso a vacina tenha resposta imunológica limitada, o uso da máscara seria uma forma mais segura de se proteger contra a covid-19.

Mas Trump, interessado em anunciar a vacina antes das eleições de 3 de novembro, não hesitou em atacar Redfield, chegando a criticar até a óbvia afirmação de que uma máscara protegeria mais do que uma vacina, caso uma eventual eficiência limitada não imunizasse uma pessoa. O presidente reiterou que a vacina estará pronta em outubro.

Atrás do democrata Joe Biden nas pesquisas, Trump mente sem hesitar a respeito de sua resposta negligentemente homicida à pandemia de coronavírus, que sempre classifica como um "grande trabalho".

Na terça à noite, Trump tentou transferir para Biden, que não é presidente, a falha de ter implementado uma ordem nacional para uso de máscaras. Foi uma das muitas respostas absurdas que ele deu de cara lavada a um grupo de eleitores indecisos na rede de TV ABC. A CNN contabilizou, pelo menos, 12 mentiras nesse encontro com eleitores.

Falseando a História na ABC, Trump mentiu ao dizer que Winston Churchill fez pronunciamento do topo de edifícios em Londres para tranquilizar a população enquanto caíam bombas nazistas. Isso nunca aconteceu. Também comparou sua conduta na pandemia à de Franklin Delano Roosevelt, presidente dos EUA durante a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial.

Churchill e Roosevelt disseram à verdade aos britânicos e americanos sobre os perigos que enfrentavam. Trump escondeu dos americanos a letalidade do coronavírus e a sua fácil e veloz transmissibilidade.

Outra mentira histórica

Na quarta, o procurador-geral William Barr comparou a escravidão às medidas de quarentena adotadas pelos Estados para combater a pandemia de coronavírus: "Você sabe, ordenar um fechamento nacional, dar ordem para ficar em casa, é quase prisão domiciliar. Além da escravidão, que era um tipo diferente de restrição, esta é a maior intromissão nas liberdades civis na história americana", disse Barr.

Escravidão não é restrição a liberdades civis. É a falta completa delas, é a mais condenável forma de opressão. Quarentena é medida para enfrentar a maior crise sanitária em um século, adotada para salvar vidas e realizada por orientação científica com eficácia comprovada.

Conservador, Barr se especializou na defesa de Trump, contrariando uma tradição de independência do Departamento de Justiça e desencadeando uma série de críticas internas à sua parcialidade no cargo. Não é mera coincidência com o que acontece no Brasil na relação entre o presidente Jair Bolsonaro e o procurador-geral da República, Augusto Aras. Barr e Aras prevaricam.

O procurador-geral brasileiro considerou que não houve crime quando Bolsonaro disse que queria encher de porrada a cara de um repórter. Julgou normal abusar do cargo, exatamente como Barr se comporta em relação a Trump.

Para completar o show de horrores trumpista, um integrante da Guarda Nacional que estava na praça Lafayette em 1º de junho, quando houve dura repressão a manifestantes, contou que houve checagem oficial para saber se o arsenal previa um raio de calor que causa sensação de fogo na pele.

A ideia era usar a arma contra manifestantes. Trump já aventara recorrer a ela contra imigrantes que tentam cruzar a fronteira sul. O integrante da Guarda Nacional quebrou o silêncio e causou choque ao revelar até onde a Casa Branca estava disposta a chegar para reprimir manifestantes que protestavam legalmente em Washington.

A exemplo do que faz o presidente Jair Bolsonaro no Brasil, Trump aposta no obscurantismo e na mentira como forma de governar e manter o poder. Isso enfraquece as democracias brasileira e americana.

Como as pesquisas sinalizam que o presidente não conseguiu virar até agora o jogo contra os democratas, é lícito supor que a baixaria trumpista vai se intensificar até 3 de novembro. Apertem os cintos!