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Leonardo Sakamoto

"Penso duas vezes": Quem deveria adotar a abstinência é o governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro e Damares Alves em solenidade no Palácio do Planalto - Frederico Brasil/Futura Press/Folhapress
Jair Bolsonaro e Damares Alves em solenidade no Palácio do Planalto Imagem: Frederico Brasil/Futura Press/Folhapress

Colunista do UOL

29/01/2020 09h40

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"Eu penso duas vezes." A ministra Damares Alves (Direitos Humanos) tem defendido uma campanha para que jovens decidam postergar o início da vida sexual como forma de reduzir o alto índice de gravidez precoce no país.

A efetividade do método é semelhante ao de atirar flechas contra um eclipse para afastar o monstro que quer devorar o sol.

Tanto que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, baseado em pesquisas, insiste na saída racional como foco de campanha: conscientizar os jovens sobre os impactos de uma gravidez antes da hora, mas ensinando o uso correto e adequado de preservativos e anticoncepcionais a fim de que possam se proteger.

Contudo o mote é muito bom e não deve ser descartado. A questão é que ele está, apenas, fora de lugar.

"Eu penso duas vezes" deveria ser uma frase enquadrada nos gabinetes de toda Esplanada dos Ministérios. Isso evitaria determinadas declarações que mostram a precariedade do governo ou que colocam em risco nossa economia, nossa democracia ou mesmo o futuro da raça humana.

Talvez se tivesse ouvido Damares, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, não teria dito, no último dia (17), que este foi "o melhor Enem de todos os tempos" para, logo depois, ser desmentido pela realidade de um Exame Nacional do Ensino Médio bichado. Judicializado, o impasse em torno dele está causando sofrimento e ansiedade a estudantes de todo o país.

Talvez se tivesse ouvido Damares, o ministro da Economia, Paulo Guedes, não teria ameaçado, no dia 25 de novembro, a sociedade brasileira. "Não se assustem então se alguém pedir o AI-5", afirmou ele sobre as consequências de uma radicalização em protestos de rua. Repete assim, gratuitamente, uma insanidade que havia sido dita pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro.

Talvez se tivesse ouvido Damares, o chanceler Ernesto Araújo não teria dito que o aumento de temperatura global ocorreu pelo fato de termômetros, "que, nos anos 30 e 40, ficavam no meio do mato, hoje ficarem no asfalto, na beira do estacionamento", reforçando a imagem de negacionista climático que nosso governo tem no mundo - o que é péssimo para os negócios.

Talvez se tivesse ouvido Damares, o presidente da República, Jair Bolsonaro, não ofendesse a mãe de repórteres, não teria dito que não existe fome no Brasil ou que uma deputada é tão feia que não merece ser estuprada. Não teria chamado, de forma preconceituosa, nordestino de "Paraíba" e cravado que a alta na taxa de desmatamento da Amazônia, identificada por cientistas e satélites era mentirosa. Não teria feito campanha pelo fim da obrigatoriedade da cadeirinha para salvar vidas de crianças em automóveis, apologia ao trabalho infantil, passado pano para milicianos ou inventado um Queiroz em nossas vidas.

A questão é que todo esse pessoal pensou duas vezes e, mesmo assim, quis fazer o que fez, conscientemente.

O que prova a necessidade do povo ser racional e conscientizar-se sobre o uso correto e adequado do voto e da manifestação de sua indignação a fim de que possa se proteger.