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Leonardo Sakamoto

Brasil chega a 55 mil libertados com covid pressionando trabalho escravo

Policial federal observa fiscal do trabalho tomando depoimento de resgatados da escravidão no Pará - Leonardo Sakamoto
Policial federal observa fiscal do trabalho tomando depoimento de resgatados da escravidão no Pará Imagem: Leonardo Sakamoto

Colunista do UOL

21/07/2020 12h43

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O Ministério da Economia, que incorporou a área de fiscalização do extinto Ministério do Trabalho, anunciou que o Brasil atingiu oficialmente a marca de 55 mil trabalhadores resgatados da escravidão contemporânea. Os números, que estão no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, referem-se ao período entre maio de 1995, quando o país criou seu sistema de combate a esse crime, e o final do primeiro semestre de 2020.

No total, R$ 108 milhões foram quitados por empregadores como salários atrasados e verbas rescisórias, sem contar indenizações.

Também informou que 231 pessoas foram libertadas do trabalho escravo no primeiro semestre deste ano, em 45 ações realizadas tanto pelos grupos de fiscalização móvel, que respondem diretamente a Brasília, quanto pelas estruturas da fiscalização do trabalho nos Estados. A pandemia reduziu um pouco a quantidade de operações em relação ao mesmo período no ano passado - 52, que resgataram 232 pessoas.

"Desde que o primeiro caso de covid no Brasil foi registrado, no dia 26 de fevereiro, 201 trabalhadores foram resgatados em 22 operações", explica Maurício Krepsky, chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae). Não é possível saber exatamente quando o coronavírus aportou por aqui.

Inicialmente, as operações haviam sido interrompidas para evitar que os grupos, formados por auditores fiscais do trabalho, procuradores do trabalho, procuradores da República, policiais e defensores públicos fossem vetores de contaminação e eles próprios se contaminassem.

Pandemia deve elevar casos de trabalho escravo

O relator especial das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão, Tomoya Obokata, cobrou de governos que melhorem a proteção dos mais vulneráveis, que estão em situação ainda mais precária por conta do aumento do desemprego relacionado ao fechamento de empresas em meio ao coronavírus. Ele afirma que a pandemia deve aumentar o número de escravizados no mundo.

"Durante a atual emergência sanitária, exorto os Estados a identificar as pessoas que enfrentam o maior risco de cair em trabalhos exploradores e aumentar sua proteção por meio de políticas de salvaguarda", diz Obokata. "Se nenhuma ação for tomada nesse sentido, existe o risco de que significativamente mais pessoas sejam empurradas para a escravidão agora e no longo prazo."

Para ele, embora bilhões de trabalhadores tenham sido afetados pela covid-19, o impacto é muito mais forte para quem está na economia informal, além de diaristas e temporários, muitos dos quais mulheres e migrantes. E ressalta que devido à falta de apoio adequado por parte de governos, crianças enfrentam um risco maior de exposição às piores formas de trabalho infantil. A Organização Internacional do Trabalho estima a existência de mais de 40 milhões de escravizados no planeta.

De acordo com o artigo 149 do Código Penal, quatro elementos podem definir escravidão contemporânea por aqui: trabalho forçado (que envolve cerceamento da possibilidade de se desligar do empregador), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes contraídas de forma fraudulenta), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva (que leva o trabalhador ao completo esgotamento dada à intensidade e a frequência da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).

Trabalhadores têm sido resgatados em fazendas de gado, soja, algodão, café, frutas, erva-mate, batatas, na derrubada de mata nativa, na produção de carvão para a siderurgia, na construção civil, em oficinas de costura, em bordeis, entre outras atividades.