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Leonardo Sakamoto

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Wajngarten enrola CPI sobre responsáveis por promover fake news da covid-19

Colunista do UOL

12/05/2021 13h39

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Fabio Wajngarten, ex-chefe da Secom, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, tinha a fama de atacar jornalistas e críticos do governo federal. Em seu depoimento na CPI da Pandemia, nesta quarta (12), contudo, até se fez de bobo tanto para evitar incriminar o ex-chefe quanto para não dar detalhes sobre o uso da máquina pública na promoção da desinformação on-line da covid-19.

Ele, que se vangloria de ser especialista em comunicação, chegou a afirmar que não sabe "qual o alcance de uma fala presidencial" ao ser instado a comentar as declarações de Jair Bolsonaro contrárias ao isolamento social e críticas à vacina da Pfizer. Ou seja, preferiu demonstrar ignorância sobre um tema que qualquer estudante de primeiro ano de comunicação é capaz de discorrer do que apontar o óbvio, que o presidente contribuiu para promover o negacionismo e o comportamento irresponsável junto a uma parcela da população.

Como comentou um senador à coluna: "Ele é tigrão no Twitter, mas foi tchuchuca na CPI".

Questionado pelo relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), se o ataque a jornalistas fazia parte de uma estratégia do governo na pandemia, Wajngarten disse que não, mas indicou que é muito difícil ficar em silêncio diante de algumas críticas de profissionais de imprensa.

Além disso, o ex-chefe da Secom afirmou que Bolsonaro sempre deixou claro que compactua com a liberdade de imprensa, chamando a atenção pelo cinismo. Desde que assumiu, o presidente elegeu a imprensa como inimiga a ser destruída e tem sido agressivo contra jornalistas, principalmente as mulheres. Levantamento da organização Repórteres Sem Fronteiras apontou que o presidente e seus filhos políticos foram responsáveis por 469 dos 508 ataques a jornalistas feitos por autoridades públicas no ano passado.

Uma frase síntese disso foi "Minha vontade é encher tua boca com uma porrada", dita por Bolsonaro no dia 23 de agosto do ano passado, a um repórter de O Globo que perguntou sobre os depósitos de R$ 89 mil que Fabrício Queiroz e esposa realizaram na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Relator quis saber envolvimento do 'Gabinete do Ódio' na desinformação sobre covid-19

A Justiça proibiu, em março do ano passado, a Secom de circular peças de uma campanha batizada de "O Brasil não pode parar", que tentava empurrar trabalhadores para a rua em meio à primeira onda de covid-19 no país, copiando a fracassada campanha da prefeitura de Milão. Fracassada porque a doença acabou vindo avassaladora sobre cidade italiana.

Postando declarações nas redes sociais como "No mundo todo, são raros os casos de vítimas fatais do coronavírus entre jovens e adultos", ela tentava vender a ideia de normalidade e trazia a marca da Secom.

Após as críticas, as postagens foram apagadas das redes da secretaria na época. Wajngarten negou, nesta quarta, responsabilidade pela campanha e disse que nada havia sido divulgado nas redes da secretaria, sendo que efetivamente foi. O que enfureceu senadores.

Independente das esquivas e negativas na comissão, há farto material comprovatório de que o governo usou sua máquina de comunicação para sabotar as medidas adotadas por governadores e prefeitos no combate à doença. Vale lembrar que Bolsonaro tachou a covid-19 de "resfriadinho" e "gripezinha", menosprezando a pandemia, em um pronunciamento oficial de rádio e TV, por exemplo.

Sobre a parte da máquina que opera nas sombras, centrada na figura do "Gabinete do Ódio", como é chamada a estrutura de desinformação e ataques a reputações que funciona dentro do Palácio do Planalto, Fabio Wajngarten afirmou que o único gabinete que conhece na Presidência da Republica é o da Secom. Disse que Tercio Arnaud Tomaz, assessor do governo acusado de fazer parte da estrutura, nunca trabalhou para ele. E que tinha pouco contato com o vereador Carlos Bolsonaro, que comanda a comunicação informal do presidente.

A CPI da Pandemia já havia sinalizado que iria se debruçar, a partir desta semana, no financiamento de campanhas de desinformação que defendem tanto a eficácia da cloroquina, ivermectina e outros produtos que a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma serem inúteis contra a covid-19 quanto no ataque ao isolamento social e às vacinas. Renan Calheiros abordou o tema em sua inquirição a Wajngarten, mas não ficou satisfeito com as respostas fugitivas do ex-chefe da Secom.

A comissão deve convidar empresários próximos ao bolsonarismo para verificar se, a pedido ou por sugestão do governo federal, houve impulsionamento de conteúdos em redes sociais e o financiamento do disparo em aplicativos de mensagens com desinformação sobre a covid-19. Avaliam quebrar sigilos bancário, fiscal e telemático.

Senadores da oposição chamam o impulsionamento de conteúdo danoso à saúde durante a pandemia de "marketing da morte".

A CPI da Pandemia também espera receber informações por parte de outra comissão parlamentar de inquérito, a das Fake News, para ajudar nessa linha de investigação. Além da publicidade oficial, senadores querem verificar se dinheiro público foi usado para anunciar em páginas que pregam desinformação. E querem envolver não apenas a publicidade direta, mas a indireta, através de anúncios do Google. Wajngarten entrou no assunto, mas não falou sobre os sites e páginas financiados com recursos da plataforma de anúncios do gigante de tecnologia.

O Brasil registrou, nesta terça (11), 425.711 mortes - número que Renan Calheiros colocou no lugar de seu nome na placa sobre a bancada da CPI.