Topo

Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Mentiras da CPI da Covid põem em risco a saúde da população 

Colunista do UOL

26/05/2021 09h40

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Um dos argumentos para a instalação urgente da CPI da Covid é que, mais do que trazer punições, ela ajudaria a impor limites à sabotagem de Jair Bolsonaro no combate à pandemia. Já há resultados nesse sentido. Mas depoentes e senadores governistas também transformam audiências em um centro dispersor de desinformação, colocando em risco a vida dos brasileiros.

São ajudados por grupos bolsonaristas em aplicativos de mensagens, que divulgam trechos das intervenções destacando positivamente as declarações dadas na bancada ou no plenário que são um show de horrores da ciência.

Logo após o depoimento de Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde, conhecida como "Capitã Cloroquina" por sua defesa enfática do medicamento considerado ineficaz para tratamento da covid, já circulavam trechos de sua fala junto a mensagens elogiosas nesta terça (25).

Reforçavam a defesa, sem embasamento científico, de que cloroquina e ivermectina devem ser tomados preventivamente para evitar formas mais graves da doença. Ou seja, a CPI usada como centro de produção de fake news.

O problema é que, como disse o médico e senador Otto Alencar (PSD-BA), essa discussão não é como torcer para um time de futebol, em que cada pessoa tem o seu e ninguém está errado. Comportamentos equivocados levam a mortes em massa.

Em outra postagem desses grupos, o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, diz que as medidas de isolamento social não têm eficácia cientificamente comprovada - o que é uma mentira. Em mais um vídeo, a importância da máscara é relativizada usando depoimentos críticos às recomendações da Organização Mundial da Saúde. Defendem que o Brasil é "soberano" e não vai se dobrar à OMS.

Por mais que os depoentes neguem quando questionados, a somatória desses discursos reforça a estratégia adotada pelo governo de minimizar a pandemia. Afinal, se há remédios baratos e eficazes e se isolamento social é bobagem, por que a população não pode voltar à vida normal o quanto antes? Enquanto brasileiros morrem aos milhares, o naco racional do mundo vence a doença indo no sentido contrário.

Senadores governistas completam o cenário, aproveitando a sessão para defender o uso desses medicamentos como política pública contra a covid e propagar as mentiras de que quarentenas e lockdowns não tem embasamento científico.

A preocupação com a difusão de desinformação que atrapalha o combate à pandemia está presente desde o início da comissão. Tanto que um requerimento do seu vice-presidente, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) solicitou que a CPI das Fake News compartilhasse informações com a CPI da Covid.

A situação, contudo, ganha outra figura quando é a própria CPI que se torna o centro difusor de confusão.

Existe a dimensão legal de contar mentiras para uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que pode dar cadeia, e há uma dimensão sanitária. O ex-ministro Eduardo Pazuello e a secretária Mayra Pinheiro receberam do Supremo Tribunal Federal o direito de permanecerem em silêncio para não se incriminarem, mas usaram o habeas corpus para contar mentiras pelos cotovelos. Com isso, dificultaram os esforços de combate à doença.

De acordo com Randolfe, a comissão já produziu resultados positivos no combate à pandemia de covid-19. "Graças à CPI, o governo Bolsonaro anunciou que vai comprar mais 100 milhões de doses da vacina da Pfizer. Além disso, mais de 350 vídeos que defendiam cloroquina e tratamento precoce e atacavam o uso de máscaras foram retirados do YouTube e o novo ministro da Saúde está defendendo medidas sanitárias como uso de máscaras e o distanciamento social", afirmou Randolfe à coluna. E tem potencial para fazer bem mais.

Contudo, a CPI não pode ser usada como plataforma para disseminar a desinformação. Senadores governistas têm a liberdade da tribuna para defenderem o que quiserem. Mas é triste que alguns optem por usar esse direito para colocar em risco a vida da população.

Nesta terça, chegaram ao ponto de acusar de negacionismo quem nega a eficácia do uso de cloroquina, tal como Jair Bolsonaro, que diz que é o isolamento social contra a covid que vai contra a ciência.

São mentiras usadas para promover a chamada imunidade de rebanho, quando uma taxa representativa da população é contaminada e o vírus para de circular. O problema é que, para chegar até ela, centenas de milhares mais terão que morrer.

Isso não é opinião política, mas desinformação que mexe com a vida das pessoas. A mentira precisa ser desmentida em tempo real pelo comando da CPI, seja por serviço de checagens, seja pela forma que for, sob o risco dela ser usada como aquilo que deseja combater.