Topo

Maria Carolina Trevisan

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Rejeição a Bolsonaro mostra que população quer vacina, e não golpismo

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), durante cerimônia em Brasília - Ueslei Marcelino/Reuters
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), durante cerimônia em Brasília Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Colunista do UOL

19/08/2021 17h58

As pesquisas de opinião divulgadas nesta semana mostram que a rejeição ao governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) segue aumentando e batendo recordes. Na XP/Ipespe, 63% dos entrevistados disseram desaprovar o governo. Na PoderData, esse índice chegou a 64%, seis pontos percentuais a mais do que há duas semanas. A rejeição mostra um quadro consistente, menos sujeito a mudanças. O crescimento na rejeição do presidente é constante nas duas pesquisas desde outubro de 2020.

No início da pandemia de covid-19, o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fez uma opção: entre a proteção da economia e da saúde, ficaria com a primeira. Era um falso dilema. Lidou com a inevitável crise econômica como se fosse dissociada à crise sanitária e social.

Entre as justificativas estaria a suposição de que medidas restritivas de mobilidade provocariam mais danos à economia e à saúde do que a própria pandemia. Foi a primeira aposta na "imunidade de rebanho" e nos medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19, como a cloroquina e a ivermectina.

As pesquisas vêm mostrando que a população não tem expectativa de que o governo Bolsonaro consiga reverter a crise econômica, mesmo com a suposta prioridade que o presidente e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmaram dar ao setor. As pessoas sentem no bolso a dificuldade de comprar alimentos, pagar as contas, adquirir gás e gasolina.

A sorte do Brasil é que outros países estão se recuperando da pandemia e movimentam a economia mundial. O azar é que o país teve à frente das Relações Exteriores o ex-ministro Ernesto Araújo um chanceler negacionista e trumpista, que isolou o país e corrompeu a diplomacia.

Ao mesmo tempo, quando há expectativa positiva sobre as chances de manutenção do emprego, a tendência é de alta desde maio deste ano, na pesquisa XP/Ipesp: o grupo que vê possibilidade grande ou muito grande de continuar empregado chega a 56%.

Significa que os eleitores não enxergam a melhora do país como fruto de medidas do governo. Ao contrário: cada vez mais a imagem do presidente Bolsonaro se descola dos aspectos positivos tanto na economia, quanto na saúde ou na área social.

Essa premissa escolhida pelo governo entre priorizar a economia ou a saúde prova-se hoje o grande erro estratégico da gestão Bolsonaro. Primeiro pelas milhares de vidas perdidas que poderiam ter sido salvas se o presidente apoiasse medidas de proteção simples, como o uso de máscaras, e a vacinação em massa. As mortes dão concretude às escolhas equivocadas e insistentes do líder da nação. O vírus se impôs.

Segundo porque em um ambiente de alta proliferação do novo coronavírus, como tem sido o Brasil, as pessoas preferem viver e temem contaminar alguém querido. A essa altura, todo mundo conhece alguém que morreu ou que perdeu um parente para a covid-19.

O brasileiro quer a vacina: a soma de pessoas que dizem que vão se vacinar ou já se vacinaram atingiu seu maior patamar, chegando a 96%, segundo a pesquisa XP/Ipesp. Somos um dos países com maior adesão à vacinação no mundo, temos cultura e tecnologia de imunização em massa. Ir contra isso é apostar na dolorosa seleção natural em que quem manda é um vírus altamente letal.

O tiro saiu pela culatra

A escolha por boicotar protocolos de proteção para colar a responsabilidade pela a crise econômica aos governos e às prefeituras em vez de assumir a dianteira no combate à pandemia pode ter custado a Bolsonaro a reeleição — se não custar o mandato.

Enquanto a avaliação negativa (ruim/péssimo) de Bolsonaro chegou a 52%, a de governadores caiu para 26% e a de prefeitos a 14%, indicando que os entrevistados consideram mais positiva a atuação dos atores que impuseram medidas de proteção na pandemia, de acordo com a pesquisa XP/Ipesp.

No período avaliado, Bolsonaro tentou de tudo: defendeu o voto impresso, anunciou um Bolsa Família turbinado, ameaçou golpe, pediu impeachment de ministros do Supremo e promoveu um desfile de tanques na Esplanada dos Ministérios.

Um levantamento da empresa Opinião Pesquisa desta segunda (17) mostrou que 46,6% sentiram mais vergonha do que orgulho acerca dessa demonstração militar. O evento serviu para somar mais um constrangimento às Forças Armadas.

O índice de rejeição é importante porque se torna cada vez mais difícil reverter esse quadro. Mas a parcela de apoiadores, na linha dos 25-30%, ainda é grande. Esse grupo tem mostrado resiliência e é necessário entender seu perfil: uma pequena parte é formada por homens "anti-tudo", que são apoiadores originais e defendem Bolsonaro desde 2017.

Outra parte corresponde aos apoiadores do Centro-Oeste ligados ao agronegócio, armamentistas e que não perderam dinheiro na vigência do governo.

E a parte, mais numerosa e mais fiel, é composta por evangélicos neopentecostais, que defendem valores morais e se informam mais pelas redes sociais do que pela imprensa. Chama a atenção como esse grupo defende o presidente a qualquer custo.

Por isso, Bolsonaro governa com foco nessa parcela da população. Mesmo assim, não o suficiente para vencer a eleição.