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Reinaldo Azevedo

Guedes; pau na imprensa, no Congresso e nos governadores. Mas um democrata!

Paulo Guedes: embora evoque a toda hora a democracia, os alvos de seu discurso são pilares do regime democrático: imprensa e Congresso - Reprodução/TV Câmara
Paulo Guedes: embora evoque a toda hora a democracia, os alvos de seu discurso são pilares do regime democrático: imprensa e Congresso Imagem: Reprodução/TV Câmara

Colunista do UOL

16/05/2020 10h44Atualizada em 18/05/2020 16h24

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O ministro Paulo Guedes, a exemplo de seus colegas militares, também está bravo com a imprensa. Ele fez um pronunciamento nesta sexta, marcando os 500 dias de governo Bolsonaro. Uma fala de 40 minutos rende, a quem dispõe de tempo para tanto, um livro sobre o que eu chamaria "autoritarismo profundo" — mais arraigado ainda do que o dos militares, que levam para o governo o indevido princípio da obediência devida. Como não somos seus soldados, a coisa complica. Só estão fora do lugar. Com o ministro da Economia, é diferente. Embora ele pontue seu discurso com elogios à democracia, tem por ela um desprezo nada solene. E detesta a imprensa, embora seja tratado pela esmagadora maioria do jornalismo da área econômica a pão de ló com cafezinho quente.

Reclamou do jornalismo várias vezes. Aos 30min37s, afirmou: "Eu estou dizendo uma coisa. Vamos ver o que eu vou ler amanhã" — na certeza, claro,! de que a imprensa vai distorcer o seu pensamento. Guedes se esquece de que sua fala está em vídeo, este que vai na página. Internautas, ouvintes e leitores têm acesso ao material. Vale dizer: o ministro quer mesmo é controlar também a interpretação, a análise e a opinião. Nem ele se dá conta disso. Nele, o autoritarismo é tão natural como acordar e constatar: "Hoje é sábado". Não é assim por uma escolha malévola. É assim porque é essa a sua natureza. Assim ele se fez, se construiu e ficou rico. No governo, não funciona.

Nota: exceção feita a este texto, não há na grande imprensa nenhuma crítica a Guedes. Pão de ló e cafezinho, lembram-se?

Sim, é bem falante, embora tenha de lutar parar controlar o espírito iracundo. Assim, mesmo quando diz coisas sem sentido, passa tal impressão de segurança que não me espanta que os empresários e o mercado financeiro o vejam — menos hoje, mas ainda — como um oráculo. Guedes é do tipo que conseguiria ler o futuro até nas entranhas de um corvo. E prometer amanhãs sorridentes, como fez, entre caixões e covas coletivas.

Eu não peço que vocês acreditem em mim. Leiam este texto, claro!, mas depois assistam ao vídeo. Até para que vocês possam preservar o ministro das injustiças que eu cometer. Também ele, a exemplo de outros tantos do governo, levaria pau numa redação do Enem. Falta saber o que é uma dissertação. É preciso ter uma tese. E os argumentos elencados precisam justificar a assertiva. Como Guedes tem um certo espírito de missionário intolerante com a "indiaiada", ele acaba perdendo a paciência, falando de muitos assuntos, ilustrando suas invectivas com lateralidades. E a tese, coitadinha, acaba restando lá no alto do texto, solitária, sem amparo.

A TESE
Se é possível achar uma ideia central na sua fala, ela vem na forma de uma metáfora. O Brasil é um pássaro de duas asas. A da saúde e a da economia. A primeira está quebrada. Sem ela, não voa. Mas a crise no sistema fez quebrar a outra: a da economia. Se não voa com uma ruim, com duas, então, nem se diga.

Muito bem! Qualquer pessoa razoável apostaria que o doutor, então, apontaria um caminho para arrumar essa asa. Mas não. Ela permanece fraturada ao longo dos 40 minutos de monólogo. O doutor se dedica a dizer por que precisamos consertar a outra, canta as próprias glórias, detalha os esforços que o governo fez até agora — que ele vende como generosidade do governo e do presidente —, anuncia amanhãs sorridentes caso façamos a coisa certa (é a "recuperação em V"), mas não aponta rigorosamente resposta nenhuma para um país que vê cidades e estados sendo empurrados para o lockdown.

Ao contrário: mais de uma vez, ele trata o presidente Jair Bolsonaro como um visionário que nos alertou para os riscos de se quebrar, então, a segunda asa, como se o seu chefe fosse um líder político que tenha procurado, em algum momento, abrir o diálogo, buscando, então, formas de conciliação entre a proteção à saúde e o relaxamento do distanciamento social.

Ocorre que isso é uma mentira deslavada. Se não mudar de ideia, Bolsonaro vai falar hoje em rede de rádio e televisão, convocando a volta à normalidade, contra a política implementada pelos governadores, que está longe de ser uma escolha. Nem parecia que Guedes discursava no dia da demissão do segundo ministro da Saúde, que ficou apenas 28 dias no cargo porque se negou a endossar escolhas feitas pelo presidente que agridem a ciência e, por consequência, ameaçam a vida dos brasileiros.

Reitero: assistiam ao vídeo e tentem encontrar a proposta de Guedes para a saúde que não seja — mas ele não tem coragem de dizê-lo de modo claro — a volta ao trabalho. Ou, diz ele, vem o fim dos tempos.

Como, nas circunstâncias atuais, o fim do isolamento implicará o caos na saúde, Guedes acha que se pode voar com uma das asas. Contra o que ele mesmo afirmou.

TESTE E TRATAMENTO
Aos 22 minutos, Guedes até chega a fazer a defesa da volta ao trabalho, mas sob condições:
"[com] Um protocolo eficiente, esse trabalhador, às vezes com pouca informação, às vezes vivendo cinco, seis, sete pessoas num pequeno espaço, confinado, a probabilidade da infecção ali é maior do que se ele estiver no trabalho, bem cuidado, bem informado e sendo testado. Porque é teste e tratamento, teste e tratamento. Testou, está bom, segue trabalhando. Testou, tá ruim, tratamento".

Na equação do doutor, não existe um sistema de saúde que já entrou em colapso em várias partes do país, inclusive no Rio, o seu Estado. Entre os 10 países com mais casos de Covid-19, o Brasil é o que menos testa. No dia 4 de abril, há um mês e 12 dias, este ministro falou o seguinte a empresários:
"Hoje de manhã conversávamos com um amigo na Inglaterra que criou o passaporte de imunidade. Ele faz 40 milhões de teste. Ele coloca disponíveis para nós, brasileiros, 40 milhões de testes por mês".

Estamos aguardando os exames.

ELOGIOS EM BOCA PRÓPRIA E VITUPÉRIO CONTRA A IMPRENSA
Guedes dedica uns bons minutos a demonstrar como o Brasil tem um desempenho ímpar no socorro à economia. Assim como inexistem hospitais colapsados em seu discurso, os milhões que ainda não viram a cor do dinheiro também não comparecem. Não deve gostar de ler essas notícias nos meios de comunicação. Depois de evidenciar como o governo é operoso, reclamou, aos 18min29, reproduzindo supostas críticas que lê na imprensa:
"Numa hora dessa, não estamos fazendo o suficiente, o governo é descoordenado, o governo não consegue entregar. Isso é injusto. Isso é uma covardia num momento em que estamos todos envolvidos nessa luta. Quarenta milhões de brasileiros digitalizados em duas ou três semanas, o dinheiro chegando, enquanto, nos EUA, os cheques ainda não chegaram, o país mais rico do mundo. E nós, aqui, sendo apedrejados enquanto lutamos em defesa do país. Então, o apelo que eu faço é que haja moderação de parte a parte. Se nós estamos um pouco excitados pela luta também e pelo combate e estamos cansados, nos perdoem se errarmos. Agora pensem também no que está acontecendo do lado de cá. Onde (sic) um país onde não há corrupção, onde o presidente luta desesperadamente para mudar a forma como a política era feita. Para reafirmar valores que 60 milhões de brasileiros apoiaram, como família, como religião. Todo mundo é livre para ter a crença que quiser. Agora, respeito de parte a parte. Não faz sentido nós estarmos num barco, ameaçado de ser afundado por duas ondas enormes, e nós estamos lutando a bordo? O que nós vamos conseguir com uma luta a bordo desse barco? Vamos salvar o barco. Quando a gente chegar em terra firme, a gente começa a brigar de novo."

COMENTO
Parece que o chefe de Guedes não é o presidente da "gripezinha". Parece que o chefe de Guedes, no dia anterior, não tinha exortado empresários a marchar contra o governador de São Paulo -- e porque está fazendo a coisa cientificamente certa. Parece que o chefe de Guedes não tem um ministro das Relações Exteriores que chama o coronavírus de "comunavírus". Parece que o chefe de Guedes não demitiu dois ministros da Saúde justamente porque sabota os esforços honestos que fazem os governadores e parte considerável dos brasileiros para conter a pandemia.

Por que digo que nem Guedes se dá conta do próprio autoritarismo? Porque vocês acabam de ler uma proposta de união em que um lado — os que discordam do presidente — cedem às suas exigências, que contrariam a ciência e os fatos. Justificativa? Ora, ele foi eleito por 60 milhões. Não por acaso, e não é por acaso mesmo!, o ministro evoca a família e a religião. O que elas fazem aí nesse discurso?

De resto, se o dinheiro demora a chegar aos pobres e às empresas, o dever da imprensa é apontar a falha, e o dever de Guedes é corrigir o problema em vez de ficar reclamando e fazendo a defesa de um presidente conciliador que só existe no seu discurso.

Insisto para que vejam o vídeo. Guedes acha que a volta ao trabalho conserta a asa da economia. Ele só não diz o que fazer com a da saúde, que será triturada. E, como ele diz, passarinho não voa assim.

É um governo incapaz de fazer uma autocrítica até intramuros. A gente lê um artigo de Mourão e conclui: o inferno são os outros. A gente ouve o discurso de Bolsonaro e conclui: o inferno são os outros. A gente presta atenção às palavras de Guedes e conclui: o inferno são os outros. MAS ONDE ESTÃO ESSES OUTROS? A esquerda, que diverge em essência do presidente e do ministro soma pouco mais de 100 deputados.

SERVIDORES
Guedes também veio a público para defender o veto do presidente à proposta do Congresso que excluiu algumas categorias do congelamento de salários dos servidores por 18 meses, proposta que o Planalto atrelou à reposição de parte das perdas do ICMS. Uma nota lateral?

Ele acha isso central para a sobrevivência do país. Até onde alcanço e alcança gente que conhece economia muito mais do eu — e mais do que Guedes —, trata-se, dado o conjunto, de uma exigência mais ideológica do que técnica. Há nisso uma certa alienação de quem não se deu conta do tamanho do problema. Não por acaso, há menos de dois meses, o ministro e sua equipe anteviam um crescimento de 0,02% para este ano. Agora, uma recessão de 4,7%... Percebam o abismo entre uma coisa e outra.

Vá lá que o ministro pense isso. Mas prestem atenção a este discurso, que junta vários momentos de sua fala:
"Na hora em que nós estamos fazendo esse sacrifício, que o Brasil está no chão, é inaceitável que tentem saquear o gigante que está no chão, que usem a desculpa da saúde para saquear o Brasil na hora em que ele cai. (...) E as medalhas são dadas após a guerra, não antes da guerra. Nossos heróis não são mercenários. Que história é essa de pedir aumento de salário porque um policial vai à rua exercer sua função? Ou porque um médico vai à rua exercer sua função? Se ele trabalhar mais por causa do coronavírus, ótimo!, ele recebe hora-extra. Mas dar medalhas antes da batalha? As medalhas vêm depois da guerra, depois da luta. O Brasil forte, erguido. Nós vamos nos lembrar disso, vamos botar o quinquênio, o anuênio, o milênio, o eugênio, tudo que for preciso. Mas não antes da batalha. (...). Vamos nos aproveitar de um momento desse, da maior gravidade, de uma crise de saúde, e vamos subir em cadáveres para fazer palanque? Vamos subir em cadáveres para arrancar recursos do governo? Isso é inaceitável! A população não vai aceitar. A população vai punir quem usar cadáveres como palanque. (...) Por favor, enquanto o Brasil está de joelhos, nocauteado, tentando se reerguer, por favor, não assaltem o Brasil. Não transformem, num ano eleitoral, onde é importante tirar o máximo possível do gigante que foi abatido. Deixa ele levantar. (...) Não permitam que esse dinheiro que está sendo dado de boa fé (...) vire aumento do funcionalismo."

NÃO É ASSIM
Não é preciso se entregar a voos interpretativos muito ousados para verificar que vai acima uma formidável peça de demonização dos servidores -- e em hora absolutamente imprópria.

O curioso é que inexiste essa grande pressão por reajuste. No Dia do Enfermeiro, 12 de maio, ficamos sabendo que 108 já morreram de coronavírus no Brasil, e há 4,1 mil contaminados. O número indica as condições em que se trabalha em Banânia. Na Espanha e na Itália, morreram, respectivamente, entre enfermeiros e médicos 42 e 79 pessoas. Nos EUA, apenas 27. Entenderam?

O congelamento dos salários dos servidores é vital para Guedes nos entregar o Paraíso (sim, assistam ao vídeo todo que o paraíso está ali)? Que assim fosse. Mas essa linguagem e essa abordagem são absolutamente impróprias. Vamos convir: se há alguém que discursa hoje sobre cadáveres, não são os adversários de Bolsonaro. Essa é a linguagem de quem quer confronto, não entendimento.

Mais: quando ele diz que estão discursando sobre cadáveres, a quem se refere? Aos parlamentares, de cujos votos ele precisa? Fico com a impressão que está atacando os governadores — em particular, os que mais incomodam o chefe. Ou, para ser mais preciso ainda, João Doria, de São Paulo.

Goste o ministro ou não, goste o presidente ou não, aquele que Bolsonaro elegeu como o seu Belzebu está tendo um ótimo desempenho na administração da crise. Se o padrão de São Paulo se repetisse do resto do país, haveria menos mortos. De resto, se alguém torce pelo desastre não parece ser aquele que arca com o peso de impor medidas restritivas, enquanto o presidente da República se reserva o direito de agir como um arruaceiro.

Essas metáforas de barco, avião, trem são sempre impróprias porque esses veículos têm um condutor, não é mesmo? Reduz-se, assim, a política à vontade de um só. E se aquele que comanda evidencia imperícia e eventuais sinais de sandice? Devemos ir para o inferno com ele?

VETO
Guedes chama o loteamento do governo para o Centrão de "acordo com o centro democrático" e fez uma defesa enfática do veto de Bolsonaro, deixando claro que o Congresso só tem uma atitude realmente decente a tomar: não derrubá-lo. Afirmou:
"O presidente assumiu o compromisso publicamente de que ia vetar esse aumento. Agora do que adianta ele vetar, e ele me pergunta isso, se, quando ele veta, o Congresso derruba esse veto? É pra que isso? É para impor uma derrota política ao governo? É para voltar ao caos dos juros altos? É para desorganizar a economia brasileira? É para transformar numa farra eleitoral um gesto de grandeza nosso de mandar recursos contra a guerra da saúde? Essa é a pergunta que tá no ar. Essa pergunta, agora, envolve as próximas duas semanas. Elas são decisivas. O presidente, de um lado, exercendo o veto, e o Congresso, de outro, não derrubando o veto, deixando que o dinheiro da Saúde fique na Saúde, em vez de virar aumento de funcionalismo, farra eleitoral. Vão me criticar amanhã: "Está criticando as organizações e as instituições. Está criticando o Congresso". Não é isso o que eu estou fazendo. Aí volta o apelo do ministro Ramos. Eu estou dizendo uma coisa. Vamos ver o que vou ler amanhã. Eu estou pedindo uma contribuição ao funcionalismo brasileiro. Eu estou pedindo ao Congresso que não vete. Eu estou pedindo ao Congresso que faça aquilo que eu acredito que nós somos: uma grande sociedade aberta, uma democracia dinâmica".

COMENTO
Ajustemos os termos. "Gesto de grandeza"? O governo federal tem obrigação de socorrer Estados e municípios porque estes não têm condições de fazer dívida, não podem nem emitir título nem imprimir dinheiro. Guedes faz parecer que, se ele não quisesse, a ajuda não chegaria. Tanto é um despropósito que a palavra final é do Congresso, não do Executivo. Fosse pelo ministro, ele repassaria apenas R4 40 bilhões aos outros entes da federação.

De que farra eleitoral Guedes está falando? Destas eleições, de 2020, ou já pensa nas de 2022, quando Bolsonaro pretende disputar a reeleição, caso consiga encerrar este mandato? Respondo: nas eleições presidenciais. No fim das contas, essa é a grande sombra que sempre esteve presente na reposição da arrecadação dos Estados.

O governo federal escolheu claramente uma proposta que retira recursos de São Paulo e Rio, Estados administrados por adversários políticos de Bolsonaro, o Magnânimo. E vem com essa conversa frouxa de que dinheiro da Saúde não pode ser transferido para o funcionalismo. A depender do tombo do ICMS, os governadores farão o quê? Deixarão de pagar salários de médicos e de policiais? O chefe de Paulo Guedes endossou um reajuste de 25% para a PM do Distrito Federal, que é pago pela União. O ministro não chiou.

Então ficamos assim: derrubar o veto é má fé, é não ter grandeza, é querer fazer farra eleitoral, é usar cadáver como palanque. Mas, claro!, o ministro respeita as instituições e a independência do Congresso, tá, gente? Se não respeitasse, proporia fechá-lo com um cabo e um soldado. Sem jipe. Deixa claro o que espera: que o Congresso faça aquilo que ELE ACREDITA "que nós somos". Quem não faz o que ele acredita é sabotador.

Aí: "Vão me criticar amanhã"... Sim, estou criticando. Essa não é a linguagem da negociação, mas a da imposição. Até porque esse Congresso, doutor, generosamente, deu uma PEC do Orçamento Paralelo ao governo federal, que estava absolutamente aparvalhado, sem saber como responder à crise.

O Congresso os tirou de uma enrascada. É o Congresso que legitimou o que o ministro considera uma generosa doação do governo federal... Ou por outra: é o Congresso, senhor Guedes, que endossa o governo federal, não é o governo federal que endossa o Congresso. Isso é desconhecer, ou desprezar, um dos fundamentos da democracia.

ENCERRANDO
No fim do seu pronunciamento, Guedes afirmou esta maravilha:
"Nós estamos aperfeiçoando nossas instituições. A política já mudou. Ela hoje é temática. Ela hoje é quem é a favor da defesa da vida e do patrimônio podendo estar armado; quem é a favor da família. A política hoje já é temática. Não tem mais "toma lá, dá cá', não tem nada disso. Tem um centro democrático se formando para apoiar politicamente o governo. É um centro democrático. Ele é programático, não é fisiológico. Então nós estamos nos observando, todos nós. E nós estamos construindo uma sociedade melhor. Eu quero acreditar nisso. Peço aos senhores que nos ajustem nisso".

COMENTO
Nem errado consegue estar. Segundo o ministro, quem é contra o porte de armas, então, se opõe à defesa da vida e do patrimônio. Defendem a família, claro!, os que têm a mesma concepção que Bolsonaro e o governo têm de família, incluindo Damares Alves, que enfeitava, a seu modo, a mesa. E o acordo que Bolsonaro faz com o Centrão, que começou pelo Denocs, nada tem de fisiologia. É a expressão do avanço da democracia.

É... Guedes abriu o seu pronunciamento com uma pegada histórica, vejam lá. Antes de Bolsonaro, tivemos 30 anos de governos de centro-esquerda, que, como é mesmo?, criou um "estado dirigista que corrompeu a política brasileira e estagnou a economia brasileira". Nem o Plano Real e as privatizações escaparam. É verdade! Bolsonaro até defendeu o fuzilamento de FHC.

O "Mito" veio para acabar com "isso daí". Os resultados também estão aí. E já estavam antes da crise do coronavírus, é bom que se diga. Acreditem em Guedes! Ele sabe como consertar uma das asas do pássaro (a da economia) e não tem plano nenhum para a outra que não seja, pelas consequências, levar o sistema de saúde ao caos.

Só não recomendou a cloroquina. Mas ele ainda o fará.

Os que temem seu pedido de demissão podem sossegar. Ele fica. É ainda mais reacionário do que Bolsonaro. Tem mais lustro. E sabe vender o futuro com a mesma convicção e entusiasmo com que um vendedor de carro usado tenta convence o comprador de que está fazendo a aquisição de sua vida.

A velha política acabou. Agora, é papo família, de arma na mão, com Deus acima de todos e cloroquina na cachola.

O que eu recomendo a Guedes? Que vá despachar no hospital Salgado Filho, no Rio. Eis o primeiro parágrafo de uma reportagem do UOL.
"Uma ação civil pública movida pelo MPT-RJ (Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro) afirma que o Hospital Municipal Salgado Filho, na zona norte carioca, tem acúmulo de corpos em contêineres sem refrigeração adequada. Os profissionais de saúde da unidade ainda lidam com a superlotação, ar condicionado sem filtro e taxa de letalidade de 30% entre os 224 pacientes levados para a ala destinada ao tratamento de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus."

O risco é o cheiro da cadaverina incomodar um pouco. Por lá, servidores não discursam sobre cadáveres.