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Reinaldo Azevedo

Ambiente do 5G é tóxico; Bolsonaro quer brincar de guerra fria com a China

Fábio Faria, ministro das Comunicações. Indagado sobre exclusão dos chineses, ele deu a resposta errada - Sérgio Lima/Poder 360
Fábio Faria, ministro das Comunicações. Indagado sobre exclusão dos chineses, ele deu a resposta errada Imagem: Sérgio Lima/Poder 360

Colunista do UOL

25/11/2020 07h35

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Informa o Estadão:
Nesta terça-feira, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, confirmou o nome de Carlos Baigorri como o relator do leilão do 5G na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O novo relator foi apresentado para o presidente Jair Bolsonaro.

O leilão é alvo de pressões internacionais, envolvendo a disputa entre o governo americano e a empresa chinesa Huawei. A companhia é líder no desenvolvimento do 5G, mas é acusada de trabalhar com o governo chinês. Em coletiva no Planalto, Fábio Faria negou que questões geopolíticas tenham sido tratadas na reunião com o presidente.

A reunião também teve a participação do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. Em março deste ano, o GSI listou os requisitos mínimos de Segurança Cibernética que devem ser adotados no estabelecimento das redes 5G de telefonia móvel. A instrução normativa foi publicada no Diário Oficial da União (DOU).

"O GSI participa porque se trata também de questão de segurança nacional. O GSI participa e participará, tem um papel fundamental", disse Faria. Questionado sobre um possível decreto presidencial para barrar a Huawei no País, Faria respondeu: "Ai você quer entrar em uma área que não é a minha".
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Na coletiva, Baigorri destacou que o leilão é "uma prioridade máxima" do governo e confirmou que este deve ocorrer até a metade do ano que vem. "A previsão é de ter o edital aprovado na Anatel no começo do ano que vem, sendo que a sessão de lances deve acontecer ao final do primeiro semestre. Esse é cronograma com que trabalhamos e vamos persegui-lo apesar de todos os desafios que se colocam à nossa frente", disse.

COMENTO
O conjunto da obra cheira muito mal. Há mais coisas erradas acima do que se percebe numa leitura rápida. Vamos por ordem de importância.

Nós temos um ministro das Comunicações que, indagado se haverá ou não um decreto para barrar a Huawei, responde não ser essa a sua área? Então é qual? Ele próprio anunciou que vai se encontrar com europeus e asiáticos para tratar dessa tecnologia. A boa resposta? "Que eu saiba, não se barra ninguém". Se Bolsonaro decidir fazê-lo depois, aí é outra conversa.

Eis o problema. Crescem as evidências de que o fanfarrão que ocupa o Palácio do Planalto se atribui ares imperiais nessa escolha, como se lhe coubesse o papel de jogar um braço de ferro com a China. É patético.

Fica clara a hipertrofia no GSI. É evidente que o Brasil deve se preocupar com a segurança, mas, numa questão com essa importância, parece falar mais alto os delírios de potência de alguns lunáticos que se atribuíram o papel de conter os chineses. O GSI com centralidade nessa história? Por quê? Com a devida vênia, o gabinete se parece mais com uma reunião de "Idosos com Dificuldades com a Tecnologia" do que de especialistas em 5G.

Mais: a Anatel é uma agência reguladora. Sua função não é atuar como um mero braço do Poder Executivo. A ela também cabe zelar pelos interesses da sociedade. Os fatos mal escondem um verdadeiro processo de intimidação de um ente que deveria zelar pela questão técnica na defesa desses interesses.

O ataque de truculência e burrice de Eduardo Bolsonaro deixa claro como andam os bastidores dessa questão. Ou vocês acham que ele vocalizou algo muito distante do que se comenta na enfermaria da família?

Qualquer pessoa com um pouquinho de bom senso dirá que o mercado do Brasil é grande o suficiente para que o país busque extrair o melhor da disputa, sem hostilizar ninguém. Não há nenhuma razão para ser um procurador dos interesses da China ou dos EUA. Logo, para que seja procurador dos próprios interesses, é preciso conversar com todo mundo. A hostilidade aos chineses serve a que propósito?

Donald Trump já admitiu a derrota ao autorizar o início da transição para o governo de Joe Biden. Mas os Bolsonaros seguem resistindo. Estivesse a Rússia na disputa, Jair já estaria no colo de Vladimir Putin. E haveria, então, a admiração recíproca das tais "virtudes masculinas" no âmbito do 5G.

É o fim da picada!