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Reinaldo Azevedo

Eles ignoram a ineficiência de Bolsonaro e adoram a sua deficiência moral

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Imagem: reprodução

Colunista do UOL

25/01/2021 12h12

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A popularidade de Jair Bolsonaro está em deterioração e tende a piorar se não conseguir a tempo emplacar o seu Bolsa Família Vitaminado ou coisa parecida com um auxílio emergencial. Apesar de tudo. Dados os descalabros na Saúde, a gente às vezes se pergunta: "O que ele teria de fazer para perder o apoio daquele terço ou quase que está sempre com ele?"

Recusar oferta para comprar vacina? Já fez.

Dar de ombros para a imunização, tratando como coisa irrelevante? Já fez.

Sabotar as formas cientificamente comprovadas de minorar os riscos de contaminação? Já fez e faz.

Responder que "não é coveiro" quando alguém lhe pergunta sobre os mortos, tratando milhares de cadáveres como coisa corriqueira, dizendo que "todo mundo morre um dia"? Já fez.

Deixar, por intermédio do governo, que testes para detectar a doença apodreçam no armário? Já fez.

Permitir, também por intermédio do Ministério da Saúde, que doentes morram sufocados por falta de oxigênio? Já fez.

Oferecer a milhões de miseráveis um coquetel de drogas inócuo para combater a doença, chamando o troço de tratamento precoce? Já fez.

Criar um aplicativo criminoso que recomenda o tal coquetel para adultos, idosos ou recém-nascidos, pouco importando os sintomas? Já fez.

Se Bolsonaro aparecesse num vídeo dando peteleco em velhinhos e crianças porque desenvolveram essa mania de querer oxigênio, a ação seria considerada, por certos grupos, justa, necessária e corajosa.

Por que é assim? Será que aquele terço ou quase — um quarto que seja — que acha o governo ótimo ou bom ou que diz que Bolsonaro foi a liderança que mais combateu a Covid-19 realmente acredita nisso? Querem saber? Essas coisas todas que elenquei não têm, de fato, a menor importância para essa gente.

É que, não importa a classe social ou renda, existe uma parcela de brasileiros que pensa todas as coisas horríveis que Bolsonaro pensa sobre mulheres, racismo, gays, armas, atuação da polícia, democracia (ou a falta dela), intervenção militar, religião, ciência... E esses jamais vão abandoná-lo.

Assim, por mais tresloucadas que sejam as coisas que diz e faz — como a insistência criminosa nas drogas inúteis —, o que importa a seus fanáticos é que ele continue a acenar com as distopias (segundo o ponto de vista da civilização democrática) que formam as suas utopias. Ele é o canal para o ódio que essa gente sente.

Tais barbaridades, a depender da fragmentação do cenário eleitoral, lhe conferem boa chance de assegurar um lugar no segundo turno em 2022. É possível que entre um quarto e um terço de vozes se juntem no polo oposto, com uma linguagem mais à esquerda — a ver se essa vertente, por seu turno, estará unida ou fragmentada, o que é mais provável.

E então se tem a disputa por aquele terço que acaba definindo a eleição: não se sente, em princípio, representado pelo trogloditismo de extrema direita, mas não tem intimidade nenhuma com a metafísica da reparação, que caracteriza as esquerdas.

Em 2018, a Lava Jato jogou esse eleitorado no colo de Bolsonaro. Ao demonizar a política e os políticos, Sergio Moro e seus boys de terninho preto lhe deram esse terço de bandeja. Não por acaso, o juiz vedete foi servir de ministro da Justiça do ogro dos valores democráticos. Alegou que teria mais condições de combater a corrupção. Esse fator, em princípio, tende a ser marginal na disputa de 2022.

É preciso olhar com muita prudência para o cenário eleitoral. Pode ser horripilante — e é —, mas milhões pensam o que Bolsonaro pensa. São, sim, uma minoria, mas bastante expressiva. Cumpre fazer o possível para que ela não atraia aqueles "neutros", formando, então, a maioria que nos daria o abismo de presente.