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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Delegado "juiz dos juízes" atuou na guerra de versões de outro massacre

Delegado Rodrigo Oliveira: sobre massacre de 2017, versão contraditória; no massacre de 2021, a ousadia de debater ativismo judicial sobre 25 cadáveres - Alexandre Durão/EXTRA
Delegado Rodrigo Oliveira: sobre massacre de 2017, versão contraditória; no massacre de 2021, a ousadia de debater ativismo judicial sobre 25 cadáveres Imagem: Alexandre Durão/EXTRA

Colunista do UOL

07/05/2021 06h47

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O delegado Rodrigo Oliveira, o juiz dos juízes, é um velho conhecido no que poderia ser chamado de "guerra de versões". No dia 27 de fevereiro de 2018, o jorna EXTRA publicou uma reportagem sobre o inquérito que investigou um massacre ocorrido em novembro de 2017 no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, durante a intervenção federal na Segurança Pública do Rio.

Vale a pena ler o texto, que reproduzo abaixo. Nada menos de 19 agentes depuseram no inquérito aberto. Apenas Oliveira afirmou que pessoas feridas na operação haviam atirado contra forças de segurança, o que foi desmentido por vítimas do ataque, muitas delas trabalhadores sem nenhuma ligação com o crime.

Leiam a reportagem do EXTRA, de autoria de Rafael Soares:
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O inquérito que investiga a operação do Exército e da Polícia Civil, que terminou com oito mortos no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, em novembro do ano passado, começa com uma contradição. No registro de ocorrência, feito na manhã do dia 11, horas após as mortes, os policiais civis da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) que participaram da ação afirmaram que se tratava de uma "Missão de Reconhecimento em apoio ao Exército". Portanto, a operação seria de militares do Exército com auxílio da Polícia Civil. Cerca de 12 horas depois, o delegado titular da Core, Rodrigo Oliveira -- primeiro dos agentes a prestar depoimento -- deu uma versão diferente: assumiu a autoria da operação e disse que "buscou apoio logístico junto às Forças Armadas".

Por sua proximidade com os militares, Rodrigo Oliveira é um dos nomes cotados para assumir a chefia da Polícia Civil nos bastidores do Comando Militar do Leste, onde atuam os generais que comandam a intervenção federal na segurança do Rio. O delegado, inclusive, já foi militar: trabalhou no 1º Batalhão de Polícia do Exército, na Tijuca.

O EXTRA teve acesso ao inquérito sobre as mortes no Salgueiro. Oliveira, em seu depoimento, afirmou que "procurou o Exército porque os veículos blindados da Core estão em manutenção, restando para uso somente um, o qual seria insuficiente considerando a demanda operacional". O delegado também alegou que a operação, realizada durante a madrugada, foi necessária para "aprofundar o mapeamento do local", após outra ação conjunta na favela não ter registrado apreensão de armas quatro dias antes. Procurado para explicar a contradição, Oliveira não retornou os contatos do EXTRA.

OUTRA CONTRADIÇÃO
O depoimento de Rodrigo Oliveira também apresenta outra contradição, quando comparado aos relatos dos outros 18 agentes ouvidos na Divisão de Homicídios, que investiga o caso. O delegado é o único policial que afirma que os feridos no local eram "homens armados disparando contra forças de segurança". Os demais agentes só disseram que avistaram homens baleados, sem informar em quais circunstâncias.

Em seu depoimento, Oliveira disse que, quando os blindados entraram na favela, houve "resistência armada por parte dos criminosos". Em seguida, afirmou que viu feridos, mas "não tem como precisar quem efetuou os disparos que atingiram os homens que estavam armados disparando contra as forças de segurança". Ele garantiu que nenhum militar ou agente que estava com ele atirou. O inquérito ainda não concluiu quem atirou nas vítimas.

DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA
Localizado pelo EXTRA, um padeiro, de 19 anos, que foi atingido por três tiros naquela madrugada e sobreviveu, afirmou que os disparos que atingiram as vítimas foram feitos da mata, por homens vestidos de preto, com capacetes e fuzis com mira a laser. O relato foi confirmado por Luiz Octávio Rosa dos Santos, de 27 anos, a oitava vítima fatal da ação, que morreu no último dia 11, depois de um mês internado. Antes de morrer, ele afirmou à polícia que os tiros que atingiram as vítimas "vinham da mata em direção das casas que ficam do outro lado da Estrada das Palmeiras".

Leia ainda: Delegado censura STF. E milícias impunes. Federalização da investigação já!

Veja também comentário do Reinaldo Azevedo sobre o tema no Youtube.