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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Livro-fraude de Moro 3: Lula também é alvo. É a Lava Jato na "black friday"

Deltan Dallagnol, cujas conversas com Moro constituem uma das evidências da suspeição de Moro, também é candidato. E, claro, no mesmo partido do ex-juiz. O rapaz oferece a própria obra numa espécie de liquidação - Reprodução
Deltan Dallagnol, cujas conversas com Moro constituem uma das evidências da suspeição de Moro, também é candidato. E, claro, no mesmo partido do ex-juiz. O rapaz oferece a própria obra numa espécie de liquidação Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

30/11/2021 06h59

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O livro "Contra o Sistema de Corrupção" é uma peça de propaganda eleitoral. Assim, promete uma bomba contra Jair Bolsonaro e, como é evidente, não entrega. E, nem poderia ser diferente, também tem Lula como um dos alvos. E a melhor maneira de atingir um possível adversário eleitoral é fazendo a defesa da Lava Jato — e, lateralmente, mais uma vez, adulando os militares.

Lembram-se dos tuítes do general Eduardo Villas-Bôas, então comandante no Exército, publicados no dia 3 de abril de 2018, enquanto se dava o julgamento do habeas corpus preventivo que acabou mantendo Lula na cadeia por um placar de 6 a 5? Transcrevo:
"Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?"

"Asseguro à nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais".

No dia 4, foi concluída a votação no Supremo, e o ex-presidente — hoje candidato que lidera as pesquisas para a disputa de 2022 — teve negado o habeas corpus. Moro decretou a sua prisão no dia seguinte. A 7 de abril, Lula se entregou à PF e permaneceu 580 dias na cadeia. Sete meses depois, o então juiz, que agora publica um livro como candidato, aceitou ser ministro da Justiça de Bolsonaro.

O que Moro pensa sobre os tuítes?
"Se o general quisesse pressionar o STF, agiria pelos bastidores e não publicamente, sendo plausível a sua alegação de que o tuíte tinha por objetivo conter os exaltados. [...] Não cabe, evidentemente, às Forças Armadas intervir na política ou mesmo influenciar julgamentos. Não me parece que foi isso que ocorreu no episódio. O general Villas Bôas, um homem honrado, ocupou o comando do Exército num período de grande turbulência no país e manteve os militares nos quartéis

Convenham: não há por que ele não se mostrar grato, certo? Também aprendemos com este gênio que a pressão truculenta e explícita é coisa de boa-fé.

Mantenho, como sempre, o desafio para que Moro aponte em quais páginas de sua sentença estão as provas contra Lula. Ele não vai dizer porque as ditas-cujas não estão lá. Tampouco a informação está no livro.

Sobre a sua suspeição e anulação dos processos contra Lula, afirma o agora pré-candidato:
"A anulação tem por base fatos e afirmações que não são reais (...). Nunca houve qualquer fraude cometida contra o ex-presidente no processo que resultou em sua condenação e jamais se atuou com parcialidade com ele."

Ninguém esperava que o doutor fizesse outra avaliação sobre o próprio trabalho. Os diálogos da Vaza Jato, revelados por The Intercept Brasil e parceiros e informações da Operação Spoofing evidenciam as relações impróprias entre o juiz e o órgão acusador: o Ministério Público Federal.

O MPF, no caso, era encarnado pelo então coordenador da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol. Parece até passagem de ópera-bufa, mas Dallagnol também é pré-candidato — no caso, a deputado federal. E justamente pelo Podemos, o partido de Moro. A propósito: o buliçoso ex-procurador fez uma promoção de si mesmo na "black friday": o consumidor pode economizar R$ 100 tendo acesso a livro, aulas e eventos...

Moro não teve um ato suspeito, mas uma penca. E o maior de todos eles, convenham, foi aceitar o cargo de ministro de Bolsonaro. Seis dias antes da eleição de 2018, liberou trechos selecionados da delação premiada de Antonio Palocci, celebrada pela PF, que fora recusada até pelo Ministério Público.

REPREENSÃO
O então juiz foi repreendido pelo STF por divulgar, sem autorização do Supremo, grampo da conversa entre Lula e a então presidente Dilma -- o tal episódio do termo de posse. Escreve:
"Havia nítida pressão política para que eu fosse de alguma maneira responsabilizado -- para piorar as coisas, a decisão aparentava não ter sido bem compreendida no STF. Se eu sofresse alguma punição naquele caso, penso, seria uma afronta à independência da magistratura. Além disso, punir um juiz por fazer o que era certo no contexto dos fatos era algo ainda mais surreal".

É impressionante!

Ele divulgou uma gravação feita ilegalmente, que trazia uma conversa da presidente da República, que não era investigada — mas estava, já, com um processo de impeachment em tramitação na Câmara. Insista-se: dupla ilegalidade. A conversa foi gravada fora do período autorizado por ele mesmo, e a divulgação se deu ao arrepio do então relator do caso no STF, Teori Zavascki.

A conversa sugeria que Dilma estava enviando o termo de posse a Lula para impedir eventual ação da Polícia Federal. Era uma mentira. Descobriu-se depois, e isso o valente omite em seu livro, que aquele era um grampo selecionado entre muitos que evidenciavam que a suposta armação, que enganou até o Supremo, não aconteceu. Armação, de verdade, era o grampo.

O livro-bomba de Moro é mero pó de traque eleitoral.

Mas não quer dizer que não seja também profundamente imoral.