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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Voto espontâneo e dos pobres: adversários de Lula vão ficando sem tempo

Ipec/Reprodução
Imagem: Ipec/Reprodução

Colunista do UOL

15/12/2021 04h47

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Faltam 10 meses para a eleição, e isso parece muito tempo, ou falta menos de um ano, e isso sugere que ela já bate à porta. Vocês já viram alguns números da pesquisa Ipec. Nos dois cenários testados — e estimulados —, o petista Luiz Inácio Lula da Silva venceria no primeiro turno, com, respectivamente, 48% e 49% dos votos. Jair Bolsonaro (PL) ficaria em segundo, com 21% e 22%. Mas esses não são os números que mais impressionam.

VOTO ESPONTÂNEO
No levantamento espontâneo, quando não se apresentam os nomes de candidatos, indagando-se apenas em quem o eleitor pretende votar, o ex-presidente aparece com espetaculares 40%. Os outros 8 ou 9 pontos percentuais vêm depois, quando o nome do petista é citado.

O voto espontâneo é considerado pelos especialistas o mais consolidado porque traduz uma preferência já internalizada. Isso não significa que não mude de jeito nenhum, mas é bem menos provável que aconteça. É evidente que os petistas têm motivos para comemorar.

E o voto espontâneo também evidencia a resiliência de Jair Bolsonaro e de seu eleitorado. E se vai ver que aí reside a razão das dificuldades da tal "terceira via". Quando não se apresentam os respectivos nomes de candidatos, 20% afirmam que escolhem o atual presidente. É a metade do que obtém Lula, mas é claro que estamos falando de muita gente.

Observem que, no voto estimulado, Bolsonaro ganha um ou dois pontos apenas. Isso indica que o bolsonarismo é um fenômeno consolidado que dura, quando menos, até a eleição. Salvo algum evento espetacular no terreno administrativo ou moral que indisponha os hoje bolsonaristas com o líder, não será fácil fazer a adesão ao nome do presidente cair abaixo do patamar em que está. Na sequência, os mais citados são Sergio Moro (Podemos) e Ciro Gomes (PDT), com 2%, e João Doria (PSDB), com 1%.

REJEIÇÃO
Bolsonaro se encalacra na rejeição também na pesquisa Ipec. Dizem que não votariam nele 55%. A taxa está muito distante dos que não aceitariam votar em Lula: 28%. Doria vem como o terceiro mais rejeitado, com apenas 23%, seguido por Moro, com 18%, e Ciro, com 15%. Cumpre notar: Bolsonaro e Lula, obviamente, são os candidatos mais conhecidos. Existirão brasileiros que, estando em seu juízo, não saibam quem são um e outro? Dada a exposição de Lula, sua rejeição, segundo os números do Ipec, é baixíssima.

CORTES DA PESQUISA
Informa o Ipec:
As intenções de voto no ex-presidente Lula são mais expressivas entre:
- os que avaliam a administração de Jair Bolsonaro como ruim ou péssima (68%);
- aqueles que residem no Nordeste (63%);
- os que residem em cidades que fazem parte das periferias das capitais (55%);
- os católicos (54%).

O voto em Lula cresce quando menores são a renda familiar mensal e a escolaridade dos entrevistados. Vale dizer: a maioria pobre do país tende a ficar com o petista. Entre os que ganham acima de cinco salários, 32% dizem votar no ex-presidente, número que salta para 57% no grupo que recebe até um salário mínimo. Escolhem o nome do petista 40% das pessoas com nível superior, chegando a 55% entre aqueles com o ensino fundamental.

O petista vence em todas as regiões do país, mas há aquela em que é mais forte: conta com 63% dos votos do Nordeste. As fracas fortalezas de Bolsonaro são o Norte/Centro-Oeste e o Sul, com, respectivamente, 29% e 27%. É pouco, mas é o que consegue. A melhor marca de Moro se dá entre os sulistas, com 11%.

GOVERNO BOLSONARO
A pesquisa Ipec também avaliou a percepção que têm os brasileiros sobre o governo Bolsonaro e o desempenho do seu titular. O quadro não é nada bom para aquele a que chamam "Mito". Apenas 19% acham o governo ótimo ou bom. Eram 28% em fevereiro. No período, os que o consideram ruim ou péssimo saltaram de 39% para 55%. Só 27% dizem aprovar o governo. Há dez meses, eram 38%. A desaprovação, nesse tempo, passou de 58% para 68%. Dizem confiar no presidente 27%, contra 36% no começo do ano. Já os que não confiam foram de 61% para 70%.

A esmagadora maioria dos brasileiros quer ver Bolsonaro pelas costas. Ele terá 10 meses para tentar reverter essa opinião. Ainda que vá tentar contar com o Auxílio Brasil em seu próprio auxílio, não será fácil reverter opiniões decorrentes de uma situação de carência crônica com uma ajuda cujo valor é inferior ao Auxílio Emergencial, atingindo um número muito menos de famílias.

Moro aposta que vai conseguir vencer resistências brandindo a chave da cadeia. Bolsonaro investe na guerra de valores e na militância antivacina. Quando se veem os votos no detalhe, não parece que vá funcionar. Não, ao menos, com o jogo sendo disputado dentro da normalidade.

O SENTIDO DAS COISAS
Quando se olham os números da economia, não se vislumbra nenhum refresco para os mais pobres além do rebatizado Bolsa Família. As perspectivas para a inflação não são nada boas, o que implica que os juros permanecerão elevados, o que afeta o crescimento e o emprego, contribuindo para comprimir a renda de quem está empregado.

O cenário, é claro, é favorável ao discurso de Lula. Não só tem uma identificação genuína com os deserdados dos milagres cotidianos de Paulo Guedes como pode evocar uma memória virtuosa do seu governo. O jogo não está jogado. Mas há, obviamente, um franco favorito. De resto, política não é futebol, em que o mais fraco pode vencer num gol acidental, e a trave pode insistir em aparecer num ponto da trajetória da bola chutada pelo mais apto. Em política, não há a tal "zebra".

Ainda sobre esta pesquisa Ipec, leia também Ipec: Lula leva no 1o turno; Moro dá vexame; suicídio coletivo no PIM