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Thaís Oyama

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Ao nomear Paulo Sérgio, Bolsonaro hasteou bandeira branca ao Exército

Jair Bolsonaro: um passinho pra frente e agora dois para trás - Isac Nóbrega/PR
Jair Bolsonaro: um passinho pra frente e agora dois para trás Imagem: Isac Nóbrega/PR

Colunista do UOL

01/04/2021 10h25

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A escolha do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira para o Comando do Exército foi uma forma de o presidente Jair Bolsonaro mostrar que está disposto a encerrar a crise que ele mesmo criou com os militares.

O presidente queria outro general para o posto, Marco Antônio Freire Gomes, atual comandante militar do Nordeste, mas foi obrigado a desistir da opção porque "o Exército fez jogo duro", como afirmou uma fonte palaciana.

Como a nomeação de Freire Gomes "derrubaria" quatro generais que estavam à frente dele pelo critério da antiguidade, sem contar os dois que passaram ontem automaticamente para a reserva (Décio Schons e César Augusto Nardi de Souza), a instituição deixou claro que não aceitaria a escolha.

O nome do preferido do Planalto nem sequer foi incluído na lista enviada pela instituição ao novo ministro da Defesa, Braga Netto. Foi a forma de o Exército dizer ao presidente que, caso ele insistisse em despachar para casa seis generais quatro estrelas de uma vez, abriria uma nova frente na crise -que, de resto, já atingira um patamar inédito com a tripla renúncia (oficialmente chamada de demissão) dos comandantes das Forças causada pela exoneração sumária do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva.
Para evitar aprofundar o seu isolamento dos militares, o presidente aceitou nomear Nogueira de Oliveira e engolir em seco o fato de ele ter recentemente criticado o governo em público.

Em entrevista publicada na segunda-feira pelo jornal Correio Braziliense, o general explicitou sua discordância quanto à condução do combate à pandemia pelo governo —a entrevista chegou a ser interpretada como a gota d'água para a demissão de Azevedo e Silva, no que foi um equívoco, dado que ela foi publicada na segunda-feira e Bolsonaro havia decidido cortar a cabeça do ministro no final da semana anterior.

Nogueira de Oliveira e os escolhidos para comandar a Marinha e a Aeronáutica — o almirante de esquadra Almir Garnier e o brigadeiro Carlos Almeida Baptista Junior—constavam da lista tríplice, definida a partir do critério de antiguidade, de onde as Forças esperam que saiam seus comandantes.

O fato de Bolsonaro ter-se dobrado ao "jogo duro" do Exército não é a única sinalização de que afrouxou no braço-de-ferro com os militares. A ordem do dia expedida ontem pelo ministro Braga Netto, se está longe de ser um atestado de apreço às instituições, diante das circunstâncias e dado que poderia ser muito pior, foi recebida como mais um aceno de paz, assim como a ausência do presidente em qualquer manifestação em homenagem ao golpe militar de dia 31 de março -assessores palacianos chegaram a temer que isso ocorresse.

Pelo andar da carruagem, portanto, a presente crise tende a se encerrar até que venha a próxima, mas é certo que ela não se vai sem deixar sequelas.

Azevedo e Silva, por exemplo, detestou ter sido demitido e sai do governo cheio de mágoas. Mas, diante do quadro geral, a situação pessoal do ex-ministro da Defesa e as eventuais consequências que ela possa trazer para o governo são o menor dos problemas.

A tripla e inédita renúncia dos comandantes das Forças significou que, em um determinado momento do governo Bolsonaro, os mais influentes militares do país viraram as costas para o presidente da República e deixaram de reconhecê-lo como Supremo Comandante das Forças Armadas.

Bolsonaro entendeu isso e agora acena para os militares com uma bandeira branca. É um recuo do presidente — e não é exatamente uma escolha.