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Wálter Maierovitch

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Aras mata no peito, e STF impede CPI de jogar para a torcida

Jair Bolsonaro e Augusto Aras, procurador-geral da República - Isac Nobrega/PR
Jair Bolsonaro e Augusto Aras, procurador-geral da República Imagem: Isac Nobrega/PR

Colunista do UOL

29/10/2021 17h12Atualizada em 29/10/2021 17h12

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Quando o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) anunciou possuir um caminho alternativo para contornar a muralha protetiva ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), ninguém lhe perguntou se havia combinado com os russos. Isso a recordar o episódio do ingênuo Garrincha com o eficiente técnico Feola na Copa do Mundo de 1958.

Apoiado pelos colegas da então bancada majoritária da CPI da Covid, Randolfe mostrou o mapa da rota alternativa: ação privada subsidiária à pública. Todos dessa bancada majoritária apelidada de G7 confiavam no GPS, mas, empolgados pela praga do populismo, não consultaram a sólida e remansosa jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal).

Aparentemente, Raldolfe e os colegas de CPI pensaram haver descoberto a pólvora, ops, ops, imaginaram o encontro de uma brecha —constitucional e processual— na muralha Augusto Aras, procurador-geral da República.

Abro parêntese.

O procurador-geral Aras é o único legitimado —constitucional e processual— para denunciar criminalmente (propor ação penal pública) o presidente Bolsonaro e alguns indiciados da CPI.

Como ensinam os livros de Direito, o PGR é o "dominus litis", o "dono da bola", para apresentar junto ao STF denúncia criminal contra os detentores de foro por prerrogativa de função, que o cidadão brasileiro apelidou —até para não passar por tolo— de foro privilegiado.

Fecho o parêntese.

Na verdade, o G7, pela voz do senador Randolfe, estava a jogar para a torcida.

Se fosse tudo fácil como dito, os senadores do G7 não precisariam ter incluído no relatório final da CPI, a título de sugestão, uma proposta legislativa a dar maior abrangência à ação privada subsidiária.

Fazendo uma comparação histórica, a muralha Aras está em pé —ao contrário do acontecido em 20 de setembro de 1870, na cidade de Roma.

O exército italiano rompeu a Muralha Aureliana de proteção ao papa Pio IX. E foi derrubada a vaticana Porta Pia da referida muralha, fato propiciador da tomada de Roma e, no popular, dado "un calcio nel sedere" (pontapé no traseiro) do papa que dominava, com o seu exército, a cidade.

A Constituição de 1988 diz, e a repetir o Código de Processo Penal de 1941, que "será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal". No entanto, o STF, em jurisprudência que vem repetindo há mais de 40 anos, entende só caber a ação privada subsidiária em caso de inércia do Ministério Público.

Aras, no dia seguinte ao recebimento do relatório (28 de outubro), transformou o inquérito parlamentar produzido pela CPI em outro inquérito apuratório. Inquérito eufemisticamente chamado de complementar.

Com isso, Aras não vai promover ação penal. E o fato de instaurar inquérito complementar pela PGR mostra que não se quedou inerte. Também não prevaricou e nem deu ensejo a ações privadas subsidiárias, propostas pelas vítimas ou representantes dos mortos pela covid-19.

Sem ter esfera de cristal, este colunista, em edição do UOL News ancorado pela jornalista Fabíola Cidral, "cantou essa bola". Até porque o procurador-geral Aras não seria ingênuo em dar de bandeja motivo para uma ação privada subsidiária à pública.

Aras, como todos os membros do Ministério Público, quer federal quer estaduais, conhece, de cor e salteado, a jurisprudência do STF. O PGR determinou investigações complementares em dezenas de anteriores notícias de crime por parte de Bolsonaro.

Fora isso, ontem e no STF, por ocasião da entrega do relatório da CPI, os senadores presentes foram avisados da jurisprudência a ser aplicada. E que não seria, fora deste balizamento jurisprudencial e pretoriano, admitida ação privada subsidiária.

Num pano rápido, Aras matou no peito a tese da ação privada subsidiária. O STF cortou o "papo-populista" dos senadores com sutil recomendação para que parassem de jogar para a torcida, de modo a passar fake news, ou melhor, difundir falsa promessa de derrubada da muralha Aras por ação privada subsidiária à pública.