Topo

UOL Confere

Uma iniciativa do UOL para checagem e esclarecimento de fatos


Youtuber distorce enquete de TV para defender Bolsonaro e voto impresso

Youtuber usa parcial de enquete televisiva para defender o voto impresso - Reprodução/Youtube
Youtuber usa parcial de enquete televisiva para defender o voto impresso Imagem: Reprodução/Youtube

Do UOL, em São Paulo

02/07/2021 19h18Atualizada em 20/07/2022 21h26

É enganoso vídeo publicado na noite de ontem (1º) pelo youtuber conservador Gustavo Gayer e compartilhado pela deputada Bia Kicis (PSL-DF) no Facebook alegando que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) teve 87,5% da preferência do público em uma pesquisa feita por um programa de televisão.

O youtuber divulgou apenas o resultado parcial — mais favorável a Bolsonaro do que o resultado final — de uma enquete feita por uma edição local do programa "Balanço Geral", da TV Record, do interior de Goiás. O título do vídeo e o texto do post feito por Bia Kicis omitem que se trata de uma consulta de âmbito local.

O youtuber também usa o resultado parcial da enquete para levantar suspeitas infundadas de uma suposta fraude eleitoral que favoreceria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022 caso não haja a adoção do voto impresso — Bia Kicis é autora de PEC (Proposta de Emenda à Constituição) sobre o assunto em tramitação na Câmara. No entanto, Gayer não apresenta indícios das supostas irregularidades e desconsidera que nunca houve fraude comprovada nas eleições brasileiras com urna eletrônica.

No YouTube, Gayer publicou o vídeo com o título "INCRÍVEL! TV faz enquete ao vivo e Bolsonaro ganha de lavada com 87,5%", enquanto a deputada federal compartilhou o conteúdo dizendo: "Pesquisa do Balanço Geral mostra Presidente Jair Messias Bolsonaro com 87,5%." Até o começo da noite de hoje, o vídeo tinha 120 mil visualizações no canal de Gayer e 168 mil na página da parlamentar.

De acordo com dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o estado de Goiás corresponde a 3,17% do eleitorado nacional.

Vídeo omite resultado final de enquete

No vídeo, Gayer afirma se tratar de um programa exibido em Goiás, mas alega não saber em qual região ele é transmitido. O UOL Confere encontrou a íntegra do programa, que foi ao ar nesta terça-feira (29) na TV Sucesso, afiliada da Record no sudoeste de Goiás que transmite sinal para cerca de 30 cidades da região.

O programa foi dividido em dois momentos, com os primeiros blocos apresentados por Anderson Magrão na sede de Jataí, e outra parte apresentada por Rômulo César, na sede de Rio Verde.

O trecho exibido por Gayer mostra Magrão anunciando a parcial de 87,5% votos a favor de Bolsonaro. Na tela, consta o horário de 12h15. O apresentador anunciou outra parcial às 12h36, com 83,3% para Bolsonaro e 11,1% para Lula.

tvsucesso - Reprodução/TV Sucesso - Reprodução/TV Sucesso
Trecho do programa Balanço Geral, da TV Sucesso (afiliada da Record em Goiás), com enquete do público
Imagem: Reprodução/TV Sucesso

Já o resultado final da enquete, apresentado ao fim do programa por Rômulo César, mostrou Bolsonaro com 64,9% dos votos e Lula com 33,5%. O horário que aparece na tela é 14h24.

tvsucesso2 - Reprodução/TV Sucesso - Reprodução/TV Sucesso
Resultado final de enquete do programa Balanço Geral, da TV Sucesso (afiliada da Record em Goiás)
Imagem: Reprodução/TV Sucesso

Enquete não é pesquisa eleitoral

O post de Bia Kicis também engana ao tratar como pesquisa o que é uma enquete. As enquetes são consideradas levantamentos de opinião sem rigor científico. Elas contam com a participação espontânea dos interessados e permitem o acompanhamento de parciais antes do resultado final, o que pode influenciar na conclusão.

Já as pesquisas eleitorais, como explica o TSE em seu site, precisam cumprir uma série de requisitos, que incluem a divulgação de:

  • Metodologia
  • Período de realização
  • Nome do estatístico responsável
  • Onde foi realizado o levantamento
  • Gastos realizados
  • Questionário aplicado
  • Registro no site do TSE

As pesquisas eleitorais apresentam a quantidade de pessoas entrevistadas e recortes por gênero e classe social, escolhidas com base em dados oficiais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e do próprio TSE.

Mesmo pesquisas de intenção de voto feitas fora de períodos de campanha, como recentes levantamentos feitos pelo Ipec e pelo Datafolha, têm uma metodologia pública. As empresas divulgam o total de entrevistados, a data da pesquisa, em que cidades houve entrevistas e as margens de erro.

Voto impresso e acusações de fraude

O youtuber Gustavo Gayer usa ainda o resultado parcial da enquete para alegar que, sem o voto impresso, o resultado das eleições de 2022 será fraudado. A deputada Bia Kicis, que compartilhou o vídeo, é autora da proposta para a implementação do voto impresso que está em tramitação na Câmara.

"Se nós não conseguirmos o voto auditável com contagem pública, Lula vai ser colocado na presidência por mais que 87,5% da população rejeite Lula e aprove Bolsonaro", diz Gayer no vídeo.

Em pesquisa do Ipec de âmbito nacional divulgada na semana passada, Lula teve 49% das intenções de voto contra 23% de Bolsonaro. Já pesquisa Datafolha feita em maio, também em todo o país, mostrou Lula com 41%, contra 23% de Bolsonaro. Na ocasião, apoiadores de Bolsonaro como o pastor Silas Malafaia utilizaram vídeos antigos para desacreditar a pesquisa do Datafolha desfavorável ao presidente.

A defesa de uma auditoria das urnas eletrônicas — que o TSE afirma já serem auditáveis — por meio do voto impresso é uma das bandeiras do presidente Jair Bolsonaro e de seus apoiadores. Ontem (1º), de forma similar às alegações de Gayer, Bolsonaro também associou, sem mostrar qualquer prova ou indício, uma suposta fraude eleitoral a uma eventual vitória de Lula em 2022. Mesmo com seu governo admitindo não ter provas, o presidente alega há mais de um ano que as eleições de 2018 foram fraudadas. Nunca houve fraude comprovada nas eleições brasileiras desde que as urnas eletrônicas passaram a ser usadas.

O UOL Confere é uma iniciativa do UOL para combater e esclarecer as notícias falsas na internet. Se você desconfia de uma notícia ou mensagem que recebeu, envie para uolconfere@uol.com.br.