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Reunião entre Zara e MP para discutir trabalho escravo termina sem acordo

Débora Melo

Do UOL Notícias, em São Paulo

30/11/2011 17h26Atualizada em 06/03/2015 18h24

A reunião entre Ministério Público do Trabalho e a marca Zara na tarde desta quarta-feira (30), em São Paulo, terminou sem acordo. A Zara é acusada de contratar empresas que fazem uso de trabalho escravo na confecção de suas roupas.

A empresa não aceitou o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) proposto pelo MPT, que pedia a responsabilização por todos os fornecedores da cadeia produtiva, o fim da subcontratação de funcionários e multa de R$ 20 milhões por danos morais coletivos, na forma de doações. Ainda assim a Zara apresentou uma contraproposta que será analisada pelo MPT em cerca de dez dias.

Novas negociações podem ocorrer depois disso e, segundo o MPT, o ideal é que o caso seja resolvido amigavelmente, de forma "rápida e eficiente". Em último caso, se não houver acordo, os procuradores moverão uma ação civil pública contra a Zara.

Segundo o procurador Luiz Fabre, alguns pontos da contraproposta da empresa são "inconciliáveis" com o objetivo do MPT de acabar com o trabalho escravo. "A Zara sugeriu cláusulas que a isentam da responsabilidade do que ocorre com os fornecedores e estabeleceu um prazo de dois anos para o acordo, que deveria ter prazo indeterminado. Vamos analisar a contraproposta, mas desses pontos o Ministério Público não vai abri mão."

Na proposta apresentada, a Zara afirma que, constatadas irregularidades nos fornecedores e terceiros (com base nas auditorias realizadas), vai negociar as providências a serem tomadas com o próprio fornecedor, que terá um prazo para implementar o que for definido.
No texto, porém, a grife diz que sua responsabilidade fica “adstrita às obrigações assumidas no presente instrumento, não devendo a empresa ser diretamente responsabilizada pelas irregularidades cometidas por seus fornecedores”.
 
De acordo com a Zara, no Brasil há 46 fornecedores diretos e 313 oficinas subcontratadas, totalizando mais de 11 mil funcionários.

Para o procurador Fabre, “a responsabilidade social desprovida de responsabilidade jurídica não quer dizer nada”. “Uma empresa que se diz socialmente responsável tende a firmar um compromisso com o MP. Se a empresa não firma esse compromisso, são palavras soltas ao vento”, disse.

Outro lado

Em entrevista coletiva, Felix Poza, diretor de responsabilidade social da Inditex, grupo dono da Zara, disse que a proposta apresentada pela empresa tem o objetivo de melhorar as condições de trabalho em toda a cadeia produtiva.

Ao ser questionado se a Zara aceitará ser responsabilizada judicialmente pelas eventuais irregularidades verificadas em fornecedores, Poza disse que a questão será negociada. “Esse é um tema que temos que discutir com o Ministério Público do Trabalho. Estamos em uma fase de negociação.”

Contraproposta

A proposta apresentada pela grife foi dividida em três tópicos: controle da cadeia de suprimentos no Brasil, melhoria das condições de trabalho na cadeia de fornecimento e promoção dos direitos humanos dos trabalhadores. No acordo, a Zara determina que os fornecedores e seus subcontratados “deverão assegurar que todas as fórmulas de contratação adotadas estejam de acordo com as práticas de trabalho e a legislação em vigor”. Além disso, os fornecedores deverão assegurar que o salário pago ao funcionário seja “igual ou superior ao salário mínimo nacional ou ao definido em contrato coletivo de trabalho”.

A Zara afirma que o Código de Conduta para Fornecedores e Fabricantes Externos é de implementação obrigatória a todos os fornecedores da Inditex. Para análise do cumprimento desse código, a empresa afirma que realizará auditorias de fiscalização periodicamente, que deverão comprovar, por exemplo, a “existência de contratos de trabalho dos trabalhadores que prestam serviço” e o “registro correto de permanência no país de estrangeiros inseridos nos fornecedores e terceiros da Zara Brasil”, bem como “garantia de respeito à jornada de trabalho legal ou sindical”.

O caso

Em junho, equipes de fiscalização do governo federal flagraram, por três vezes, trabalhadores estrangeiros submetidos a condições análogas à escravidão produzindo peças de roupa da Zara em São Paulo.

Em uma das operações, 15 pessoas, incluindo uma adolescente de 14 anos, foram libertadas de duas oficinas (uma localizada na região central da capital paulista e outra na zona norte). Para sair da oficina, que também era moradia, era preciso pedir autorização.

A investigação da SRTE/SP (Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo), que culminou em uma inspeção realizada no final de junho, se deu a partir de outra fiscalização, em Americana (SP), em maio. Na ocasião, 52 trabalhadores foram encontrados em condições degradantes, e parte do grupo costurava calças da Zara.