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Restrição na marginal Tietê "acabou com a nossa vida", diz caminhoneiro; categoria mantém greve

Guilherme Balza

Do UOL, em São Paulo

07/03/2012 06h00

Enquanto a greve dos caminhoneiros autônomos, revoltados com a restrição à circulação na marginal Tietê e em outras avenidas das zonas sul e leste da capital, ameaça desabastecer de combustível a maior cidade do país, os protagonistas da paralisação justificam o protesto dizendo que, daqui para frente, suas vidas não serão mais as mesmas.

A restrição entrou em vigor na última segunda-feira (4). Agora, os caminhões, que já enfrentam restrições de circulação nas principais avenidas da cidade, além do tradicional rodízio paulistano, só podem transitar pela marginal Tietê, via mais movimentada da capital, entre 22h e 5h ou das 9h às 17h. “Acabou com a nossa vida. Não teremos mais tempo para ficar com a família”, assim resume José Carlos Moraes, 32, caminhoneiro que presta serviço a uma transportadora contratada pela Petrobras.

Segundo o Sindicam-SP, são 255 mil caminhoneiros autônomos espalhados pelo Estado de São Paulo, 54 mil só na capital –a maioria trabalhando no transporte de combustíveis. Segundo o sindicato, a greve vai continuar até que a Prefeitura de São Paulo abra negociação. Ontem à noite, o juiz Emilio Migliano Neto, da 7ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), concedeu liminar que os sindicatos que lideram a paralisação encerrem o movimento grevista. A ação foi movida pela Procuradoria-Geral do Município.

Com escassez, usuário estoca combustível

Diferentemente dos caminhoneiros que trabalham por frete Brasil afora, o roteiro do autônomo repete-se todos os dias: ir até a base, encher o caminhão e entregar o combustível ao destino final. Os autônomos cumprem este ciclo várias vezes ao dia. Com a restrição, dizem eles, não será possível carregar e descarregar mais de uma vez por jornada.

“O motorista autônomo não se mantém fazendo uma viagem. Se fizer, passa fome. Não paga o custo operacional do trabalho”, afirma Moraes. Segundo ele, os autônomos, em geral, prestam serviço, como pessoa física ou jurídica, a empresas de transporte que atendem as grandes distribuidoras. Seus rendimentos dependem do número de entregas que fizer.

As principais distribuidoras de combustível da Grande São Paulo estão em Barueri, Guarulhos, São Caetano, Mauá e na Mooca (zona leste da capital), regiões cuja principal via de acesso é, justamente, a marginal Tietê.

Horário apertado

Segundo os trabalhadores, os intervalos em que a circulação na marginal é permitida não são suficientes para que os autônomos cumpram seu trabalho. A solução, afirmam, é trabalhar em plena madrugada ou ficar o dia inteiro na rua, já que a maioria dos postos fecha à noite.

“Vamos ter que acordar às 4h, para chegar às 5h na base e carregar o caminhão. Depois, esperar dar 9h, ir para a rua e distribuir. Se a gente for pegar a marginal e estiver perto do horário da restrição, temos que encostar em algum lugar e esperar dar 22h para voltar para casa”, reclama Moraes.

“É muita correria. Vai aumentar a cobrança da transportadora, da base. Não vai dar para descansar. Não vamos dormir nem 4h por dia. Vai ser uma mão no volante e outra segurando o olho”, diz Fernando Vaz Oliveira, 26.

A categoria promete só desistir da greve se a prefeitura flexibilizar a restrição ou apresentar alguma alternativa. “Vamos continuar parados. A gente quer uma solução. Do jeito que está não dá. São muitas vias restritas”, critica Oliveira.

Na porta da distribuidora

Oliveira e Moraes passaram o dia e a noite de campana, com mais dezenas de autônomos, em frente à distribuidora da Shell na avenida Presidente Wilson, na região da Mooca, perto da divisa com São Caetano. O objetivo, dizem, é assegurar o direito de greve dos autônomos, que estariam sendo coagidos pelas distribuidoras a trabalhar, segundo ambos.

Os grevistas afirmam que somente caminhões que abastecerão serviços de urgência --hospitais, bombeiros, polícia, transporte metropolitano, coleta de lixo, entre outros-- estão saindo das distribuidoras carregados.

Ao lado dos grevistas, na porta da distribuidora, PMs fazem a segurança e acompanham a chegada dos caminhões com motos, carros e até helicópteros. Segundo a polícia, eles estão lá a pedido das distribuidoras para garantir que os autônomos que desejem trabalhar possam fazê-lo sem serem impedidos pelos grevistas.

O Sindicom (sindicato das transportadores), a prefeitura e a própria polícia afirmam que os “fura-greves” foram ameaçados e até agredidos pelos grevistas. Tanto Moraes, quanto Oliveira, negam. “O pessoal está colaborando e respeitando a greve. Estão entendendo que nosso protesto é justo”, diz Oliveira. “Enquanto o Kassab não der uma posição, vamos ficar aqui, fazendo revezamento”, acrescenta o caminhoneiro.

O que diz o prefeito

O prefeito Gilberto Kassab (PSD), por sua vez, disse que não irá negociar com os grevistas –a quem chamou, em entrevista ao SPTV da noite de ontem (6), de “chantagistas”. “Não conversaremos enquanto não voltarem ao trabalho. Em chantagem nunca se cede. Quem cede uma vez diante de uma chantagem, cederá sempre”, disse. “A cidade de São Paulo não pode ficar à mercê de chantagistas, que devem ter outros interesses acima dos interesses públicos”, afirmou Kassab na entrevista.

Segundo o prefeito, os caminhoneiros sabiam que a restrição seria aplicada há um ano. A categoria, por sua vez, diz que, nesse período, tentou negociar, sem sucesso, a alteração da medida.