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Prefeitura do Rio adia fechamento do lixão de Gramacho para o próximo domingo

Maior lixão a céu aberto da América Latina, Gramacho (Baixada Fluminense) encerra suas atividades - Guillermo Giansanti/UOL
Maior lixão a céu aberto da América Latina, Gramacho (Baixada Fluminense) encerra suas atividades Imagem: Guillermo Giansanti/UOL

Do UOL, no Rio

31/05/2012 15h44

A Prefeitura do Rio de Janeiro adiou para o próximo domingo (3) o encerramento do aterro sanitário de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.

O fechamento do maior lixão a céu aberto da América Latina estava previsto para esta sexta-feira (1º), mas a alteração foi confirmada após reunião entre o governo municipal e os catadores.

A prefeitura não divulgou mais detalhes sobre a razão pela qual o adiamento foi definido, e informou apenas que algumas "pendências operacionais" impossibilitaram o cumprimento da data prevista.

O prazo de três dias deve servir para que sejam realizados todos os pagamentos das indenizações fixadas pela Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos (Seconserva).

A prefeitura argumenta que o valor das multadas somadas, que gira em torno de R$ 23 milhões, já foi depositado em uma conta da Caixa Econômica Federal. Porém, há catadores que ainda não foram retirar o dinheiro.

O acordo inicial firmado entre a Seconserva e as associações de catadores prevê que o aterro sanitário só será encerrado depois que cada uma das mais de 1.700 pessoas que dependem do lixão seja indenizada.

Inaugurado em 1978 e localizado no município de Duque de Caxias, Gramacho recebeu por mais de três décadas o despejo de lixo urbano, químico hospitalar e industrial das cerca de 200 fábricas que compõem o polo industrial da Baixada Fluminense. Foram quase 60 milhões de toneladas de resíduos acumulados ao longo de 34 anos.

Segundo Sebastião Carlos dos Santos, representante da Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho (ACAMJG), os catadores de lixo que trabalham no local até hoje vão buscar "trabalhar a coleta seletiva, a logística reversa e a cadeia produtiva da reciclagem no Rio de Janeiro de forma mais humana” .

Segundo Vera Chevalier, diretora da ONG Ecomarapendi, Gramacho representa um dos maiores desastres ambientais provocados por um lixão no país.

“Gramacho é o exemplo de um grave desastre ambiental no Brasil e na América Latina e tem um passivo ambiental impagável. Não se consegue apagar tudo o que ele causou. Não é mais possível recuperar muitos dos danos causados”, afirma Chevalier, que acompanha o lixão desde 1990.

Símbolo de crime ambiental

Em 1995, Gramacho passou a ser um aterro controlado, mas mesmo assim não deixou de virar símbolo de degradação ambiental, pobreza e trabalho indigno.

Antes da mudança, foram duas décadas de despejo de resíduos sem controle num terreno que não tinha preparo para receber material tóxico. Após virar aterro controlado, Gramacho passou a receber apenas resíduos domiciliares e da construção civil.

“Já houve infiltração contaminando o mangue em volta, a Baía de Guanabara. Quantos milhões se gasta para tentar recuperar a Baía, mas não se consegue mais conter aquela fonte que está ali há anos drenando chorume [líquido gerado no processo de decomposição do lixo]”, diz Vera Chevalier.

Segundo a diretora da ONG Ecomarapendi, em um aterro controlado, o chorume deve ser não apenas contido, mas tratado e não despejado na natureza. “Ele exige muito tratamento.” Em Gramacho, porém, o que há é uma lagoa de chorume que represa todo o líquido tóxico drenado pelo lixo numa tentativa de evitar ainda mais a contaminação da área e do lençol freático.

Atraso de 14 anos

Inicialmente, a desativação de Gramacho estava prevista para 1998, mas a data foi adiada três vezes (para 2000, 2004 e, finalmente, 2012). Com uma área de 1,3 milhão de metros quadrados, Gramacho começou a ser gradualmente encerrado em abril de 2011.

A iniciativa foi motivada após a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que prevê o fechamento de todos os lixões no país até 2014. A meta nacional, porém, não deverá ser cumprida.

"Há vida após o lixão"

Gramacho ganhou projeção internacional com o documentário "Lixo Extraordinário", do artista plástico Vik Muniz. Indicado ao Oscar em 2011, a produção retratou a realidade de catadores de lixo que trabalham no local.

Sebastião Carlos dos Santos, o Tião, protagonista do filme e representante da Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho (ACAMJG), afirma que haverá vida para os catadores após o fechamento do aterro e incentiva a reciclagem como alternativa de renda para os catadores.

“Espero que no dia 1º de junho a gente possa encerrar Gramacho da melhor forma e mostrar que existe vida após o fechamento. Há outras formas de trabalho com a reciclagem. A gente vai buscar trabalhar a coleta seletiva, a logística reversa e a cadeia produtiva da reciclagem no Rio de Janeiro de forma mais humana”, disse.

Ele é um dos porta-vozes do movimento de catadores que reivindica melhores condições para a categoria e luta para dar voz aos que receiam ficar desamparados e sem emprego.

“Não defendo que o catador tenha que estar dentro do lixão trabalhando de forma desumana sofrendo risco de vida e de saúde. Quantas pessoas morreram e perderam a sua saúde dentro de Gramacho? Queremos fechar com chave de ouro. Onde as pessoas não viam nada além de porco, urubu e lixo misturado, hoje elas conseguem ver os seus direitos. A gente defende os direitos do catador como cidadão”, disse.

Novo destino

Assim como a cidade do Rio, outros oito municípios da Baixada Fluminense também depositam lixo em Gramacho: Nilópolis, Mesquita, São João de Meriti, Guapimirim, Queimados, Belford Roxo, Nova Iguaçu e Duque de Caxias.

Até abril do ano passado, só a cidade do Rio enviava cerca de 6.500 toneladas de lixo por dia à Gramacho. No total, o lixão recebia 8.500 toneladas diariamente.

Gradualmente os resíduos estão sendo direcionados para o aterro sanitário de Seropédica, inaugurado em 2011, e a central de Nova Iguaçu. Outra central deve ser inaugurada em Paracambi.

Maior lixão da América Latina é desativado após 34 anos