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"Voltei correndo", diz moradora da favela do Moinho ao saber que casa estava pegando fogo

Mariângela dos Santos Soares, 44, foi avisada pela filha do incêndio: "Não sei o que vai ser de mim agora" - Fábio Luis de Paula/UOL
Mariângela dos Santos Soares, 44, foi avisada pela filha do incêndio: "Não sei o que vai ser de mim agora" Imagem: Fábio Luis de Paula/UOL

Fábio Luís de Paula

Do UOL, em São Paulo

17/09/2012 10h08Atualizada em 17/09/2012 11h03

"Acordei cedo, às 6h15, para levar as crianças na creche. Voltei correndo quando avisaram que minha casa estava pegando fogo". O depoimento é da moradora da favela do Moinho, Rafaela Jesus Melo Vieira, 22, auxiliar de limpeza, ao comentar o incêndio desta manhã no local. 

O incêndio, num ponto embaixo do viaduto Engenheiro Orlando Murgel, no bairro de Campos Elíseos, região central de São Paulo, começou por volta das 7h e foi controlado às 8h30 pelo Corpo de Bombeiros. Vinte carros de bombeiros e 70 homens estiveram no local. Os bombeiros confirmaram a morte de uma pessoa.

A vizinha de Rafaela, Silvana Melo Vieira, 39, auxiliar de cabeleireiro, lamentava o prejuízo em mais um incêndio no Moinho. "Perdi geladeira, fogão, guarda-roupa... Perdi tudo", disse Silvana. 

"Tinha acabado de sair para trabalhar quando minha filha me avisou do fogo. Ela estava em casa, e como trabalho perto, voltei correndo", conta entre lágrimas a ajudante de cozinha, Mariângela dos Santos Soares, 44, que mora na favela com as duas filhas menores. Na hora do incêndio, apenas uma das filhas estava em casa.

"Graças a Deus minha filha não se machucou, se salvou. Mas agora não tenho mais nada, não sei o que vai ser de mim agora".

Mariângela estava no incêndio do ano passado, mas sua casa não foi atingida. No entanto, ela diz que a situação foi horrível.

Assim como a filha de Mariângela, Bárbara Ellen Salles, 21, que vive de bicos, estava em casa na hora do incêndio. "Estava dormindo e me assustei quando ouvi o pessoal gritar fogo. O rapaz que mora comigo me alertou também. Foi o tempo de pegar minha mochila e sair correndo", conta a moradora.

"Minha mochila já estava pronta com uma muda de roupa e documentos para o trabalho. Não sei o que sobrou da minha casa, que tinha guarda-roupa, geladeira, fogão, o básico".

Camila dos Santos, 24, foi até o local para ver se amigos e parentes estavam feridos. Ex-moradora da favela do Moinho, ela deixou o local no ano passado, após um incêndio em dezembro, e foi morar em um local próximo com o marido e o filho. A nova moradia cujo aluguel é de R$ 600, é paga com ajuda do auxílio-aluguel de R$ 450, pago pela prefeitura.

"Eu perdi tudo e a ajuda da prefeitura não é suficiente", disse.

“Agora os moradores devem obedecer às recomendações dos bombeiros. Não retornem neste momento para as suas casas”, disse o capitão do Corpo de Bombeiros, Renato de Natale Júnior, em entrevista à Globo News. Segundo o capitão, o trabalho de rescaldo deve durar de três a quatro horas.

De acordo com Ricardo Perrone, jornalista do UOL que mora em um edifício na região, o local está um "caos". "Tem muita gente na rua, muito trânsito. Tive de sair do apartamento porque estava muito quente. Há muita fumaça e é difícil de enxergar. O fogo parecia coisa pequena, mas em cinco minutos se alastrou numa proporção gigantesca. Alguns moradores da favela ajudam os bombeiros com mangueiras. A avenida Rio Branco aqui está interditada. Estamos com medo de que o fogo chegue aqui no prédio", disse.

VEJA O LOCAL DO INCÊNDIO

Incêndio em 2011

No dia 22 de dezembro do ano passado, um incêndio de grandes proporções destruiu parte da favela do Moinho. O fogo começou em um prédio abandonado de quatro andares. Segundo o Corpo de Bombeiros, em menos de meia hora, o incêndio devastou um terço da comunidade, onde moravam cerca de 600 pessoas. O local afetado tinha 6.000 m². Duas pessoas morreram e dezenas de famílias ficaram desabrigadas.

A área onde está a favela do Moinho vem sendo alvo de disputas judiciais entre a prefeitura e os moradores nos últimos anos. Enquanto a administração municipal tenta desapropriar a área e utilizá-la para outros fins, os moradores buscam conquistar o direito de permanecer no local.

Outros casos

Na última segunda-feira (3), um incêndio de grandes proporções atingiu a favela morro do Piolho, na zona sul da capital paulista, deixando 285 famílias desabrigadas --o equivalente a cerca de 1.140 pessoas, segundo informações da Defesa Civil.

Quatro dias depois, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, declarou que o fogo pode ter sido intencional. "Lá existe até a suspeita de que o incêndio possa ter sido provocado, como, aliás, foi identificado em outros casos", disse.

Por sua vez, o Ministério Público de São Paulo investiga se a série de incêndios ocorridos desde janeiro deste ano em favelas da capital paulista tem relação com o interesse do setor privado ou do setor público em construir nas áreas de entorno dessas comunidades.  

Galpão de escola de samba abriga vítimas do incêndio de 2011