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Parentes de extrativistas mortos no Pará sofrem ameaças e cobram proteção

Claudenice Silva dos Santos, irmã do extrativista morto José Claudio, chora durante entrevista coletiva na UFPA, em Marabá - Carlos Madeiro/UOL
Claudenice Silva dos Santos, irmã do extrativista morto José Claudio, chora durante entrevista coletiva na UFPA, em Marabá Imagem: Carlos Madeiro/UOL

Carlos Madeiro

Do UOL, em Marabá (PA)

02/04/2013 15h06

A vida dos familiares do casal de extrativistas José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, mortos em maio de 2011, teve uma mudança radical após o crime. Cansados do clima de insegurança e das constantes ameaças, a maioria dos parentes que vivia no assentamento agroextrativista Praia Alta Piranheira, em Nova Ipixuna (a 582 km de Belém), deixou o local. Quase dois anos após o crime, apenas uma pessoa ainda mora ali e convive com as ameças.

Na véspera do julgamento dos três acusados do crime, que acontece no Fórum de Marabá (a 685 km de Belém) a partir dessa quarta-feira (3), o clima é de expectativa na região, conhecida internacionalmente pelos conflitos no campo.

Ao UOL, a irmã de José Claudio, Claudenice Silva dos Santos, conta que grande parte dos familiares das vítimas deixou o assentamento após o duplo assassinato com medo de morrer. Segundo ela, apenas uma irmã de Maria do Espírito Santo --Laísa Santos Sampaio-- vive nas terras, mas sofre com ameças e a deficiência na ajuda do Estado em sua proteção.

Casal de extrativistas é assassinado; relembre o caso

  • O crime, ocorrido em 2011, ressalta a violência contra militantes de defesa da natureza na região Norte, que já viu o seringueiro e sindicalista Chico Mendes e a missionária americana Dorothy Stang serem mortos por questões agrárias. O casal recebeu ameaças antes de morrer (vídeo acima)

“Ela só tem mesmo a ajuda de Deus e da CPT (Comissão Pastoral da Terra). Quando quer sair e entrar novamente no acampamento, precisa informar à polícia, que fica monitorando a situação. Mas o Estado não dá qualquer apoio nem a segurança que deveria dar constantemente”, disse.

Segundo Claudenice, são comuns as ameças a Laísa, que por ser testemunha do caso não participa da entrevista coletiva nem da audiência pública que vai discutir o problema agrário, nesta terça-feira (2), em Marabá.

“Ela sofre ameaça de todo tipo. Eles colocam bilhetinhos embaixo da porta, mandam recadinhos. Coisa comum na vida dela, infelizmente. Tem gente que continua tocando terror lá”, explicou.

Depois do crime, ela conta que alguns familiares receberam ajuda do governo federal e deixaram o Estado. “Fui a Brasília e denunciei o caso, conseguindo que eles saíssem do Pará. Eu também saí do assentamento, mas dei só um tempo, fiquei aqui mesmo no Pará. Mas teve gente que foi expulsa do assentamento”, afirmou.

Outro caso

A situação na região sudeste do Pará é de violência rural intensa, segundo os movimentos da luta pela reforma agrária.

Em entrevista coletiva nesta terça-feira, na UFPA (Universidade Federal do Pará), integrantes de todas as organizações de luta pela reforma agrária aproveitaram a presença da imprensa e de instituições internacionais para denunciar os problemas e cobrar soluções.

Um dos casos que chama a atenção pelas ameças é de José Ribamar de Oliveira, que vivia no acampamento Monte Muriá, em Bom Jesus do Tocantins.

“Nós tínhamos 200 famílias no local, que foram expulsas há nove meses. Eu mesmo vivo em outro Estado com medo de morrer. Minha mulher está em depressão, e meus filhos não estudam. Estou na lista de ameaçados, mas olho para o lado e vejo apenas a presença de Deus, nada das autoridades”, afirmou ele.

O julgamento

O júri popular que vai decidir se José Rodrigues Moreira, Lindonjonson Silva Rocha e Alberto Lopes do Nascimento são os assassinos do casal de extrativistas começará nesta quarta-feira.

O caso será julgado na Vara da Violência Doméstica e do Tribunal do Júri, um ano após aceitação da denúncia pelo juiz Murilo Lemos Simão. A previsão é que o julgamento seja encerrado na noite da quinta-feira (4).

Os três acusados estão presos preventivamente desde setembro de 2011, acusados do crime. Segundo as investigações, o casal foi morto na zona rural do município de Nova Ipixuna (a 582 km de Belém), quando passava de moto por uma ponte. Eles foram vítimas de uma emboscada, alvejados a tiros e mortos. Antes de ser assassinado José Cláudio teve parte da orelha direita arrancada "como prêmio pela execução do delito", segundo a denúncia do MP-PA (Ministério Público do Pará), autor da denúncia.

Os homicídios ainda têm três qualificadoras apontadas pela promotoria: motivo torpe –que foi a disputa pela posse de terra--, meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa das vítimas.

Os acusados negam a autoria do crime e afirmam que são vítimas de armação.

"No YouTube você encontra o José Cláudio e a mulher, nos EUA, falando que estavam sendo ameaçados por fazendeiros, carvoeiros e madeireiros. Eles defendiam a natureza, e isso atinge diretamente os interesses econômicos dessas pessoas. Não havia conflito nenhum entre os acusados e a vítima. Eles mal se conheciam. Foi uma montagem, uma farsa para pegar pessoas como bode expiatório devido às pressões internacionais. Esse é um caso com interesse governamental", disse o advogado dos dois acusados, Wandergleisson Fernandes Silva.