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Contra "rolezão" e a favor de "rolezinho" em shoppings de SP, MP vai se reunir com jovens

Débora Melo

Do UOL, em São Paulo

17/01/2014 18h21Atualizada em 17/01/2014 21h14

Em entrevista coletiva concedida na tarde desta sexta-feira (17), promotores do MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo) informaram que o órgão vai intermediar a relação entre os jovens frequentadores de “rolezinhos”, os shoppings da cidade e o poder público. A ideia é que esses encontros com os adolescentes aconteçam a partir da semana que vem.

Na entrevista, os promotores defenderam diferenças entre o “rolezinho” dos jovens e o ato que foi chamado de “rolezão”: ontem (16), integrantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) convocaram um “rolezão popular contra o preconceito” nos shoppings Campo Limpo e Jardim Sul, encontro que, para o MP, configura “ato político”. Temendo as consequências do “rolezão”, ambos os shoppings fecharam as portas mais cedo --um deles inclusive conseguiu uma liminar (decisão provisória).

Para Maurício Antônio Ribeiro Lopes, promotor de Habitação e Urbanismo da capital, os “rolezinhos” não devem ser encarados como reunião e, portanto, não podem ser barrados.

"O direito de reunião é garantido na Constituição em espaços públicos. O shopping center não é [espaço público]", disse. "Mas o 'rolezinho' não é reunião. Não tem pauta. Segundo conceitos que vimos na própria mídia, esses 'rolezinhos' significam o que? Ir ao shopping, 'pegar umas minas'", completou.

Já o “rolezão” é considerado protesto e, portanto, para o MP, não pode acontecer nesses espaços privados.

“Não gostei da manifestação de ontem”, disse Lopes. “Eles [manifestantes do MTST] pegaram carona no movimento de outros e o desvirtuaram. Estavam com bandeiras. Esse tipo de solidariedade não é bem-vinda”, afirmou o promotor.

Para os promotores, a atitude dos shoppings no caso do "rolezão" não teve caráter discriminatório. Além disso, o MP entende que é legítimo que os centros comerciais acionem a Justiça. “No estado democrático de direito, as violações ou as ameaças às violações encontram amparo judicial”, afirmou Luciana Bergamo, promotora de Direitos Humanos da Infância e Juventude.

“A mediação é necessária para que os shoppings possam mostrar que estão buscando seu legítimo direito porque precisam zelar pela segurança das instalações, dos consumidores e dos funcionários. Os shoppings querem que os jovens entrem, mas não eles não podem entrar para praticar atos antissociais. O direito de ir e vir é assegurado, mas é preciso haver ordem”, continuou a promotora.

Sobre a forma como essas liminares são cumpridas, contudo, os promotores defendem que não pode haver discriminação. “[Os shoppings] não podem impedir a entrada de grupos específicos. Se fecham as portas, têm que fechar para todos. É o conceito da indistinção. Pode fechar, se o fizer indistintamente”, disse o promotor criminal Alfonso Presti, que também falou com jornalistas.

Para Luciana, a medida do Shopping JK Iguatemi, que na semana passada exigiu RG de jovens que tentavam entrar no estabelecimento sem a companhia dos pais– foi "inadequada". "Estamos estudando [que medidas tomar]", afirmou a promotora.

Sobre a atitude da polícia na repressão ao movimento --no último dia 11, "rolezinho" no Shopping Itaquera terminou com bombas de gás e balas de borracha--, o promotor Presti admitiu que a corporação tem uma “imagem ruim”, mas disse que a situação é “difícil”.

“O cumprimento do que manda a lei, de alguma decisão judicial, de medida proposta por algum shopping center, deverá ocorrer de maneira absolutamente estrita. Não há nenhuma saída que não seja buscar a mediação para chegar à normalização”, afirmou.

Órgão vai intermediar “rolezinhos”

Em uma decisão inédita, o MP, que já teve reuniões com representantes da prefeitura e da Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers), agora vai convocar os organizadores dos chamados “rolezinhos” para uma conversa.

As bases em que esses encontros se darão --os critérios de seleção dos jovens e como eles serão convocados para as reuniões--, no entanto, ainda não foram definidas pelos promotores.

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  • Bruno Poletti/Folhapress

Para a promotora Luciana Bergamo, essa mediação é necessária porque a via judicial não tem se mostrado suficiente para o entendimento das partes envolvidas.

“A questão que envolve o “rolezinho” é muito ampla e não se resolve apenas com a busca de direitos. Soluções jurídicas não estão dando conta. Por isso, pensamos em um processo de mediação", afirmou. "Não temos a pretensão, incialmente, de verificar quais são as causas que levam a esse tipo de conduta. O que sabemos é que os jovens estão realizando algum tipo de protesto", completou Luciana.

"Fenômeno novo"

Para o promotor Mauricio Antônio Ribeiro Lopes, o fenômeno é novo . "Estamos diante de algo desconhecido, novo, um fenômeno a ser compreendido. Antes não havia rede social para convocar grupos de ate 3.000 jovens”, afirma.

Ele e o promotor Alfonso Presti defendem que os "rolezinhos" são movimentos que nada têm a ver com os protestos de junho.

"Há um componente de protesto, mas esse não é um protesto vinculado aos episódios de junho. Talvez o êxito dos protestos de junho tenha motivado esse grupo, mas não há nenhuma ligação. Os protestos se dão por outros motivos. Os shoppings são mecas de consumo; parcelas cada vez mais significativas da população estão tendo acesso ao consumo; a população mais jovem das periferias entende, corretamente, que a cidade é espaço seu também e que deve usufruir desse espaço como qualquer outra pessoa", afirmou Presti.