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Policiais militares do Rio relatam terror em UPPs: ''pior são as rajadas''

Maria Luisa de Melo

Do UOL, no Rio

12/04/2014 06h00

Os sucessivos e violentos ataques às UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) têm espalhado o medo entre os policiais militares do Rio de Janeiro. Entre março e abril, quatro unidades sofreram ataques de traficantes de drogas. Só na favela da Rocinha, na zona sul da capital fluminense, foram registrados dois atentados em menos de 24 horas, e um policial foi gravemente ferido. Criminosos também tentaram intimidar PMs com rajadas de tiros no morro do Cantagalo, no Complexo do Lins e no Complexo do Alemão.

Lotado na UPP Rocinha há dois anos e meio, o soldado R. relatou já ter tido dois amigos feridos e um morto. Além disso, ante a diversas ameaças de morte sofridas, ele disse ter medo de ser alvo de traficantes até nos dias de folga. “Os traficantes marcam a fisionomia da gente e corremos risco mesmo quando não estamos na favela trabalhando", declarou a PM.

Para se ter uma ideia, na semana do Carnaval, eu e alguns colegas fomos escalados para tirar plantão extra. Na hora que estávamos voltando para o batalhão, dois colegas foram atingidos na Estrada da Gávea, a principal da favela. Um mototaxista transportava um traficante armado que atingiu meus colegas no braço e no abdômen. Estamos muito vulneráveis”, declarou o PM.

"Antes da inauguração da UPP, um amigo meu, que se formou comigo, levou um tiro na cabeça e morreu. Não me sinto nem um pouco seguro principalmente porque os traficantes têm armamento pesado e estão em maior número que os PMs, e isso faz muita diferença. Só na Rocinha tem mais ou menos 600 policiais e mais que o dobro de traficantes”, completou.

Além dos traficantes em maior número, R. afirma que há espaços dentro da favela onde a polícia nunca conseguiu entrar: “Os bandidos vivem nos afrontando pelo rádio e a gente não tem como entrar em várias áreas da Rocinha. Os traficantes armados ficam não só nos becos, mas até nas ruas principais. E os moradores também são ameaçados pelos bandidos para tratarem a gente muito mal. Tenho muita vontade de deixar de trabalhar em UPP. Já pedi ao meu comando uma transferência, mas até agora não fui atendido”.

Há quase dois anos no policiamento da UPP Cantagalo, em Copacabana, na zona sul da cidade, o soldado L. diz lembrar das rajadas de tiros contra as bases da UPP quando questionado sobre o pior momento já vivido por ele nas filas da Polícia Militar.

“Só abordar os elementos em atividade suspeita na favela já é complicado. Muitos moradores acertam pedras e pontas de azulejos na gente. Nosso trabalho tá ficando cada dia pior. Todos os policiais têm muito medo, mas não há o que se possa fazer. É difícil sobreviver numa UPP. Os homens são poucos em comparação com o número de bandidos. Para mim, o pior até agora são as rajadas de tiros, mas também levamos pedradas direto”, relatou.

L. era um dos policiais de serviço na manhã do dia 2 de abril, quando houve tiroteio entre dois grupos de facções rivais no Cantagalo. Revoltados, moradores atearam fogo em lixeiras. Segundo ele, toda vez que há um ataque de criminosos, os PMs têm folgas suspensas.

“Só neste último ataque eu tive que trabalhar três dias seguidos, sem folgas, dormindo no alojamento da UPP. Além disso, os meus dias de folga e os dos meus colegas vem sendo reduzido. Antes a gente trabalhava 24 horas e folgava outras 48. Agora, não. Temos que trabalhar 24 horas seguidas e só podemos folgar por mais 24. E não vamos ganhar nenhum centavo a mais por isso, porque a PM não está classificando este trabalho a mais como horas extras. Eles dizem que é uma necessidade de serviço a mais”, afirmou.

“Como se não bastassem todos os problemas que a gente já enfrenta nas UPPs, ainda tem esse problema do pagamento. Confesso que já não vejo tantas vantagens em ser policial. Tenho pensado muito em trabalhar em outra área e largar a PM. Tá muito difícil sobreviver assim”, finalizou.