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Quadrilha de aborto no Rio lucrava R$ 300 mil por mês, diz delegado

O médico Aloísio Soares Guimarães, um dos supostos chefes do esquema, que foi detido no prédio onde mora, em Copacabana -  Pedro Teixeira / Agência O Globo
O médico Aloísio Soares Guimarães, um dos supostos chefes do esquema, que foi detido no prédio onde mora, em Copacabana Imagem: Pedro Teixeira / Agência O Globo

Vitor Abdala

Da Agência Brasil, no Rio

14/10/2014 13h57

A Polícia Civil do Rio de Janeiro desarticulou nesta terça-feira (14) sete organizações criminosas envolvidas com a prática ilegal de abortos na cidade. Uma delas chegava a lucrar até R$ 300 mil por mês, segundo o delegado Felipe Bittencourt, da Corregedoria. Ele afirmou que os grupos eram independentes, mas a colaboração entre eles evitava a competição.

Até as 11h30 de hoje, 56 mandados de prisão tinham sido cumpridos. Destes, cinco eram contra pessoas que já estavam presas. Entre os presos, estão médicos, policiais civis e militares, advogados e um sargento do Exército.

Apesar de não terem comando unificado, os grupos respeitavam os territórios de atuação definidos para cada um. Alguns dividiam os bairros de Bonsucesso, Rocha e Tijuca, na zona norte. Outros dois atuavam em Campo Grande e Guadalupe, na zona oeste. Os demais comandavam a prática em Copacabana e Botafogo, na zona sul. Conforme o delegado, 75 pessoas acusadas de integrar as associações criminosas tiveram prisão preventiva decretada pela Justiça.

“O histórico dessas pessoas demonstra que ela atuavam há muitos anos. Alguns haviam sido indiciados na década de 60. É uma história de crimes e de impunidade. Deflagramos hoje uma ação que desmantela vários crimes. A legislação é muito benevolente. Podemos quase afirmar que, pelo retorno financeiro, vale a pena cometer esse crime", salientou o chefe da Polícia fluminense, Fernando Veloso.


As clínicas ilegais mantidas pelas organizações criminosas faziam abortos em mulheres com até sete meses de gestação. Os preços variavam de R$ 1 mil (para maiores de 18 anos e em estágio inicial de gravidez) até R$ 7.500 (para adolescentes com 23 a 26 semanas de gestação).

O processo conta com depoimentos de 37 mulheres submetidas a procedimentos abortivos. Elas não foram indiciadas pelo crime de aborto, mas poderão responder criminalmente, caso esse seja o entendimento do Judiciário.

Cada grupo tinha um chefe e contava com responsáveis pelas mais variadas tarefas, como procedimento cirúrgico, auxílio de enfermagem, agenciamento das gestantes, segurança do local, medicamentos e transporte das usuárias do serviço clandestino.

Os servidores públicos investigados, entre eles oito policiais civis e quatro militares, seriam responsáveis por tarefas de segurança,  proteção da associação criminosa, administração das clínicas e transporte das gestantes. Além disso, recebiam dinheiro para evitar a repressão ou investigação dos casos.

Entre os crimes apurados, estão aborto (pena de um a quatro anos de prisão), corrupção passiva (dois a 12 anos), exercício ilegal da medicina (seis meses a dois anos), associação para o tráfico (três a dez anos) e associação criminosa armada (um a três anos).

Entre os dez médicos denunciados à Justiça, alguns têm anotações muito antigas por aborto. Um dos acusados, por exemplo, havia sido autuado pela prática em 1962. Uma médica, com processos desde 2001, é suspeita de mais de mil procedimentos.

Secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame informou que a operação de hoje deve servir para a rediscussão da legislação relativa ao aborto. “Acho o momento muito oportuno para as coisas sereem discutidas. Não vamos dizer o que a lei precisa fazer. Entretanto, a sociedade tem de conhecer o efeito que uma pessoa sofre ao praticar um aborto. É um problema nacional. Temos de acabar com o tabu e recolocar a discussão à mesa”, acrescentou Beltrame.