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Paraíba do Sul chega a menor nível da história e ameaça abastecimento no RJ

A água que vem do Paraíba do Sul abastece, no total, cerca de 9,5 milhões de pessoas no Estado do Rio de Janeiro - Daniel Castelo Branco/Agência O Dia/Estadão Conteúdo
A água que vem do Paraíba do Sul abastece, no total, cerca de 9,5 milhões de pessoas no Estado do Rio de Janeiro Imagem: Daniel Castelo Branco/Agência O Dia/Estadão Conteúdo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

01/11/2014 06h00

A ameaça de racionamento de água que ronda São Paulo está mais perto do Rio de Janeiro do que imaginam os fluminenses. O nível do reservatório equivalente (que representa a média dos níveis das diferentes represas) do rio Paraíba do Sul chegou em setembro a seu pior nível histórico – 12,9%, segundo a ANA (Agência Nacional de Águas). Principal fonte de abastecimento da cidade do Rio de Janeiro e da região metropolitana, a água do Paraíba do Sul abastece, no total, cerca de 9,5 milhões de pessoas no Estado.

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Procurado pela reportagem, o governo do Estado afirmou que o Inea (Instituto Estadual do Ambiente) vem monitorando o comportamento dos reservatórios no Estado e que simulações elaboradas pelo próprio órgão indicam a “inexistência de risco de desabastecimento para os próximos meses”. Durante uma sabatina antes do segundo turno das eleições, no entanto, o próprio governador reeleito, Luiz Fernando Pezão, admitiu a possibilidade de crise caso não voltasse a chover com regularidade até o fim de novembro. O UOL solicitou entrevista com o governador, mas não houve resposta até o fechamento da reportagem.

A baixa no nível dos reservatórios, segundo especialistas ouvidos pelo UOL, levanta a necessidade de se tomar medidas urgentes para evitar que a situação se agrave. No mesmo período do ano passado, o nível dos reservatórios era de 51,2% e, em 2003, ano mais crítico já registrado até então, 15,7%. “Só se fala em São Paulo, mas esquecemos que a água que se bebe no Rio de Janeiro também vem do Paraíba do Sul”, lembra Vera Lúcia Teixeira, vice-presidente do Ceivap (Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul).

A bacia do Paraíba do Sul é composta pelas represas de Paraibuna, Santa Branca, Jaguari, Funil e Santa Cecília e é usada para abastecer a capital e municípios da Baixada Fluminense, por meio de transposição para o rio Guandu. “Os reservatórios estão muito abaixo [do nível normal]. Não podemos esperar chegar à situação de São Paulo para debater o que fazer, essa discussão precisa ser feita já”, afirma Vera, que vem se reunindo semanalmente com os órgãos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos. Antes da crise, os encontros eram mensais.

No dia 23 de outubro, o Ministério Público Federal entrou com uma ação civil pública junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) pedindo que seja decretado “estado de calamidade hídrica no Estado”, a fim de que o Rio reconheça a situação de escassez de água e tome providências para sanar a crise. “A escassez é um fato”, afirma o procurador Eduardo Santos de Oliveira, responsável pela ação. “Um possível racionamento é uma alternativa desconfortável para o poder público, mas que precisa ser debatida.”

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No quinta-feira (30), a ANA manteve a redução temporária da vazão mínima afluente da barragem de Santa Cecília, que abastece o Guandu, a fim de preservar os estoques de água na baía do Paraíba do Sul. A medida foi tomada pela primeira vez em agosto e prorrogada mensalmente desde então. A redução, de 190 m³/s para 160 m³/s, vale até o dia 30 de novembro, quando será reavaliada.

Pesquisador do laboratório de recursos hídricos da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), Paulo Carneiro cita a necessidade de um planejamento a longo prazo e conjunto com Minas Gerais e São Paulo, Estados que também são abastecidos pelo Paraíba do Sul. “A situação hoje é crítica. As demandas de 2003 eram menores que as de 2014. A indústria e a população cresceram. É necessário é um planejamento de longo prazo e um planejamento conjunto”, afirma.

Em março, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, levantou a ideia de desviar para o sistema Cantareira águas da bacia do rio Paraíba do Sul a fim de atenuar a crise hídrica no Estado. O então governador do Rio, Sérgio Cabral, ameaçou recorrer à Justiça. A situação acabou sendo mediada pelo governo federal, e Alckmin recuou. Recentemente, no entanto, o governador paulista voltou a defender a ideia, rechaçada por Pezão, e ameaçou levar a disputa a Brasília. 

As chuvas no Rio estão abaixo do normal. Em setembro choveu na estação do Rio de Janeiro 29,2 mm, quando a média histórica, para o período, é de 68,3 mm. O prognóstico do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) é de que volte a chover nos próximos três meses na região do Rio de Janeiro, em quantidade menor, no entanto, que o esperado para a época o, que, segundo Carneiro, não será suficiente para a regularização dos reservatórios. 

Para Vera, é preciso conscientizar a população para que se evite desperdício, além de fazer investimentos em recuperação das nascentes e projetos que armazenem água durante as cheias para uso no período de seca. “O alerta precisa ser feito, em especial à população do Rio”, afirma a especialista. “A água não nasce da torneira, nasce do rio.”