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Com rotina de assaltos, Aterro do Flamengo pode ter gestão à Central Park

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

05/12/2014 06h00

Caminhar, correr ou pedalar pelo Aterro do Flamengo, na zona sul do Rio de Janeiro, no trecho entre o monumento a Estácio de Sá e o MAM (Museu de Arte Moderna), são atividades que fazem parte do cotidiano de muitos moradores da capital fluminense, principalmente para quem reside na zona sul. Porém, segundo relatos de frequentadores, além de esportistas amadores e atletas profissionais, o local passou a atrair criminosos interessados em pequenos delitos, como roubo de bicicletas.

Os assaltos dentro do parque tornaram-se comuns nos últimos anos, contrastando o clima de insegurança com as belas paisagens projetadas por Roberto Burle Max. A rotina de roubos e furtos levou a Polícia Militar e a Guarda Municipal a reforçarem o patrulhamento no interior do parque, e afugentou antigos frequentadores, como o carioca Ricardo Monte, assaltado e esfaqueado no rosto por três criminosos quando retornava do trabalho para casa, em janeiro desse ano.

"Não continuo a pedalar pelo aterro e cercanias. (...) Uma pena, pois o parque é lindo e agradável, mas já não há hora ou local seguro por ali", relatou ele. "Quando venho ao centro, de bike, vou pela rua da praia do Flamengo e nunca pelo Aterro. Eu e muitas outras pessoas. Infelizmente, os que se aventuram pedalar pelo Aterro, mais cedo ou mais tarde, são assaltados", completou Monte, que levou pontos no rosto e teve escoriações.

Monte relatou ao UOL ter sido derrubado por três jovens quando pedalava pela pista compartilhada: "Em vez de sair correndo deles, levantei em sua direção. Vieram pra cima e me juntaram. Socos, chutes e empurrões de parte a parte. E algumas facadas no rosto. Depois, fugiram. Levaram a bike, meu celular, carteira com uma boa grana e cartões. Toda uma mochila com esquema para mudar de roupa. E o pior: uma camisa do Flamengo!".

A violência é um dos fatores que fizeram a Prefeitura do Rio começar a planejar um novo modelo de gestão para o Aterro do Flamengo. Até o fim de 2015, ano em que a área de lazer completará 50 anos, a ideia do governo municipal é lançar uma PPP (parceria público-privada) para definir o administrador do maior parque urbano da cidade. O sistema seria semelhante ao que foi implementado pela Prefeitura de Nova York para revitalizar o Central Park, nos anos 1970, antes degradado e famoso pela criminalidade.

"O Central Park tinha problemas até piores do que o Aterro do Flamengo, como assassinatos e estupros. Hoje, 75% da receita para manutenção do Central Park vêm da fundação responsável por administrar o parque", explicou o presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, Washington Fajardo. "O que nós queremos é estabelecer uma gestão profissional do Aterro do Flamengo. Não se trata de uma privatização", afirmou.

Na última segunda-feira (3), a reportagem do UOL percorreu mais de 3 km pela pista compartilhada do Aterro do Flamengo e observou que a maioria dos relatos sobre violência na região diz respeito a ações criminosas contra ciclistas. "Teve uma vez que eu vi um garoto deitar no chão e se colocar na frente da bicicleta para derrubar o ciclista. Eles saem de trás das árvores e atacam mesmo. Não pode facilitar", comentou Ronaldo Leão, 55, morador do bairro.

"Pessoalmente, ainda não fui abordado nem passei por essa situação. Venho aqui todo dia para fazer exercícios, entre 7h e 10h, e sempre vejo policiamento na parte da manhã. O problema é mais à noite com o pessoal que anda de bicicleta. Eu não arrisco vir aqui à noite", afirmou Antônio Viana de Araújo, 78. "O que eu tenho na bolsa nem vale muito a pena, mas é claro que evito vir aqui à noite. Mas, no geral, o Aterro é um lugar tranquilo. Acho que há um exagero", contestou o skatista Maurício Lima da Costa, 33.

Já na opinião do servidor público federal Rui Croesy, 55, que costuma pedalar pelo parque, a onda de assaltos é uma realidade a ser combatida com ações sociais. "Eu ando aqui há mais de 20 anos. Dá para sentir, realmente, que os assaltos vêm acontecendo principalmente nos lugares mais ermos. Mas isso acontece porque não há um trabalho de ação social. Não basta só colocar a polícia aqui", declarou ele, em referência à população de rua que dorme e transita pelo Aterro.

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social informou que equipes de assistentes sociais circulam diariamente pelo Aterro do Flamengo com o intuito de acolher a população de rua. Essas pessoas são cadastradas e levadas para abrigos. Na última segunda, a reportagem do UOL observou a movimentação dos representantes da secretaria. Na ocasião, dois moradores de rua foram acolhidos.

Segurança reforçada

De acordo com a Polícia Militar, desde o começo deste ano, um grupamento de 24 policiais, divididos em dois turnos, é responsável por fazer o ciclo-patrulhamento de todo o Aterro do Flamengo, que abrange os bairros do Flamengo, de Botafogo, da Glória e parte do centro da cidade. O Aterro ocupa área total de 1,2 milhão de metros quadrados.

Os policiais circulam em triciclos elétricos identificados com as cores e o símbolo da corporação, das 14h às 22h. Esse modelo de patrulhamento começou a ser executado depois de a PM observar várias reclamações de ciclistas (profissionais e amadores) sobre roubos e furtos ocorridos dentro do parque.

A PM também informou que há o patrulhamento estático, com carros da Polícia Militar estacionados e bases montadas ao longo da via paralela à praia do Flamengo, e o patrulhamento à pé, que conta com o apoio de guardas municipais. No total, policiais de cinco batalhões são mobilizados para garantir a segurança no Aterro, de acordo com a corporação. A PM não informou o efetivo total.

Números mostram queda

Dados do ISP (Instituto de Segurança Pública) mostram que, na delegacia do Catete (9ª DP) --responsável pelas ocorrências dos bairros do Flamengo, Catete, Glória, Laranjeiras e Cosme Velho--, os indicadores de roubos e furtos caíram na comparação entre 2013 e 2014. As estatísticas incluem os acumulados dos meses de agosto, setembro e outubro.

Em 2013, no trimestre, o distrito policial registrou 469 roubos e 794 furtos. Já nesse ano, respectivamente, ocorreram 193 roubos (redução de 41%) e 203 furtos a menos (redução de 25,5%). Atualmente, na região, ocorrem quase dois roubos por dia.

O indicador de roubo a transeunte teve uma queda de 40,8% no período --foram 112 ocorrências menos. O roubo de aparelho celular também caiu: 74,5%. Por outro lado, nos meses de agosto, setembro e outubro deste ano, a 9ª DP registrou a apreensão de apenas um menor --dois a menos em comparação com o mesmo período no ano passado.

Os relatos de vítimas e de frequentadores do Aterro do Flamengo indicam que os assaltos que ocorrem dentro do parque são cometidos, na maioria dos casos, por crianças e adolescentes.

Na 10ª DP, baseada em Botafogo, bairro vizinho ao Aterro, os números são parecidos. Foram registrados 372 roubos e 764 furtos no período entre agosto e outubro deste ano. Também houve queda na comparação com 2013. Já o indicador de apreensão de menor, a 10ª DP ficou muito à frente da 9ª DP. A delegacia registrou 44 ocorrências dessa natureza no acumulado do trimestre, seis vezes mais do que fora registrado no mesmo período em 2013.