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Zoos de Brasília e Rio brigam na Justiça por devolução de girafa emprestada

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

23/01/2015 11h50

Para quem mora no Rio e nunca esteve frente a frente com uma girafa, há pouco tempo para fazer uma visita ao zoológico da capital fluminense e observar a presença do solitário Zagallo, animal que se tornou alvo de uma disputa judicial entre os zoológicos do Rio de Janeiro e de Brasília. A girafa pertence ao zoológico brasiliense, mas está emprestada ao do Rio desde 2006.

Desde o ano passado, com a morte de sua companheira, Beija-céu, Zagallo passou a ser a única girafa do zoológico carioca. Agora, os brasilienses cobram na Justiça a reintegração de posse. Na última segunda-feira (19), a 1ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal determinou a devolução do animal, mas ainda cabe recurso.

O objetivo do zoológico de Brasília é enviar Zagallo, considerado uma girafa idosa, para um safári localizado em Mangaratiba (RJ). Em troca, o safári vai encaminhar para a capital federal um dromedário mais jovem. A novidade, inclusive, já foi noticiada na página oficial da Fundação Jardim Zoológico de Brasília: "Enquanto os profissionais encontram uma girafa macho para compor o grupo do nosso plantel, um exemplar de dromedário será a mais nova atração do Zoo".

Ainda de acordo com o zoológico brasiliense, o retorno de Zagallo a Brasília foi descartado em razão das dificuldades de locomoção. O traslado do animal custaria mais de R$ 100 mil, segundo a assessoria do zoológico. Além disso, assim como Mário Jorge Lobo Zagallo, ex-técnico da seleção brasileira que inspirou o batismo do animal, ele já se encontra com uma idade avançada, o que traria riscos para a saúde da girafa. São 14 anos de idade. Segundo o diretor técnico da Fundação RioZoo, Marcus Delgado, as girafas vivem duas décadas, em média.

"O Zagallo já está na terceira idade e nós não estamos falando de um saco de batatas. Ele é uma girafa com seis metros de altura. Qualquer viagem, nessas condições, seria muito sacrificante para o bicho. Girafas são transportadas com, no máximo, dois ou três metros de altura. Você tem que ter uma caixa adaptada para o tamanho do animal, caixa essa que é encomendada sob medida. Depois disso, a girafa tem que se acostumar com a caixa, reconhecê-la como parte do seu habitat. Isso pode levar até seis meses", explicou Delgado.

"O roteiro da viagem também tem que ser muito bem estudado, pois a caixa vai ser fixada em cima de uma carreta. No percurso, não podem existir viadutos, árvores, fios, enfim, nada que vá atrapalhar a passagem da carreta, que pode andar, no máximo, a 40 km por hora. Se for subida ou descida de serra, a velocidade máxima cai para 14 km por hora", explicou Delgado.

O diretor da RioZoo afirmou que a fundação pleiteará na Justiça a permanência de Zagallo no zoológico carioca, principalmente para que seja garantida, segundo ele, a saúde do animal. Já a Fundação Jardim Zoológico de Brasília informou, em nota, que aguarda o envio de uma carta precatória do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro) em resposta à decisão da 1ª Vara de Fazenda Pública do DF.

Na mesma moeda

O zoológico de Brasília tenta recuperar Zagallo desde setembro de 2012, quando enviou o primeiro ofício à Fundação RioZoo com o objetivo de informar sobre a rescisão amigável do contrato de empréstimo. Os brasilienses, no entanto, informaram ao Juízo da 1ª Vara de Fazenda Pública que, na ocasião, os cariocas nada responderam sobre o assunto.

Já o diretor-técnico da Fundação RioZoo declarou ter oferecido ao zoológico de Brasília a troca por um outro animal "excedente", mas a proposta foi recusada. Delgado argumentou ainda que, em 1981, o Rio emprestou a Brasília uma girafa macho chamada Raio de Sol. Por esse motivo, as partes estariam quites, na visão dele. Mas nem o zoológico de Brasília nem a Justiça aceitaram esse argumento, pois, de acordo com o juiz Lizandro Garcia Gomes Filho, não há registro oficial a respeito da transferência de Raio de Sol. "O que se tem é uma mera matéria jornalística", datada de 7/5/1981, afirmou o magistrado.

"Eles querem levar o bicho a qualquer custo. Lembramos que, na década de 80, emprestamos uma girafa para eles e há, inclusive, uma crônica do Carlos Drummond de Andrade sobre isso", disse ele, em referência à crônica "A solidão do Girafo", publicada no "Jornal do Brasil" em maio de 1981.

Na ocasião, Drummond escreveu: “Vai, Raio de Luz, vai até Brasília e procura lá a tua namorada, que te dará prazer e filhos, e, com eles, voltarás ao Rio de Janeiro, onde não tens chance de casamento e multiplicação da espécie. (...) Não podias mais continuar no Rio, sem companheira prestante, e sujeito a equívocos escabrosos com os machos da tua espécie".

Girafa viajante

Zagallo, filho do casal Léo e Bia, nasceu no zoológico de Brasília, em 2001. Alguns anos mais tarde, o animal foi emprestado para o zoológico de São Paulo com o objetivo de ser preparado para reprodução.

Em 2006, Rio e Brasília assinaram contrato de empréstimo e Zagallo viajou para a capital fluminense na intenção de gerar filhotes. Mas isso nunca aconteceu, pois não houve sucesso nas tentativas de reprodução, de acordo com Marcus Delgado.

O diretor-técnico da Fundação RioZoo afirmou que os empréstimos de animais entre zoológicos de diferentes cidades brasileiras são uma prática comum. "A permuta é algo que os zoológicos do Brasil inteiro fazem há muito tempo. Temos tigres e animais exóticos, por exemplos, emprestados para outros zoológicos. É muito comum", afirmou.