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Brechas legais garantem direito de imigrantes a saúde e educação no Brasil

Região do Brás (centro de São Paulo) abriga grande quantidade de peruanos e bolivianos - Junior Lago/UOL
Região do Brás (centro de São Paulo) abriga grande quantidade de peruanos e bolivianos Imagem: Junior Lago/UOL

Do UOL, em São Paulo*

08/07/2015 21h40

O Brasil abriga hoje 1,8 milhão de imigrantes regulares, segundo estatísticas da Polícia Federal de março. O número tem aumentado de forma consistente e tende a crescer ainda mais nos próximos anos, segundo Patricia Tavares de Freitas, pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole da USP (Universidade de São Paulo).

Diante de uma legislação nacional restritiva, as organizações civis buscaram brechas para ampliar, de fato, os direitos dos imigrantes. Com acesso dos imigrantes a educação e saúde pública, o Brasil se tornou um país mais receptivo e inclusivo.

Ainda assim, os imigrantes compõem, no Brasil, somente 0,9% da população. Em destinos tradicionais da imigração, como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Espanha e França, o percentual é da ordem de dois dígitos.

“Apesar da oposição de um segmento da sociedade e da mídia, os imigrantes estão chegando, sendo contratados e trazendo ao país um conhecimento que o brasileiro muitas vezes ainda não possui”, afirma a socióloga.

Legislação restritiva e prática mais receptiva

“Até o presente, a situação dos imigrantes foi regulada pelo Estatuto do Estrangeiro, promulgado durante a ditadura. Nos termos dessa legislação, baseada na ‘doutrina da segurança nacional’ e na proteção do trabalhador nacional, foram limitados os direitos civis, sociais e políticos dos imigrantes, principalmente dos indocumentados, por meio de uma gestão baseada na Polícia Federal e no Conselho Nacional de Imigração, vinculado ao Ministério do Trabalho”, explica a pesquisadora.

Diante de uma legislação nacional restritiva, as organizações civis buscaram brechas para ampliar, de fato, os direitos dos imigrantes. E isso mudou, em certa medida, o perfil do Brasil, considerado muito mais receptivo e inclusivo.

No período compreendido entre a redemocratização do país, em meados dos anos 1980, e o fim da década de 2010, Freitas aponta quatro movimentos principais em prol dos novos imigrantes: por direito à educação, à saúde, ao trabalho digno e à representação e participação política.

“No começo dos anos 1990, houve uma resolução da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo impedindo que as escolas acolhessem matrículas de filhos de imigrantes indocumentados. Nesse momento, por iniciativa de Dom Paulo Evaristo Arns, então cardeal-arcebispo de São Paulo, ocorreu uma mobilização da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese, para que a resolução fosse revogada. Isso ocorreu cinco anos mais tarde, durante a gestão de Belisário dos Santos Jr. na Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, durante o governo de Mário Covas”, disse.

Já o movimento pelo direito à saúde se deu em outro contexto, no início dos anos 2000. “Quando Marta Suplicy assumiu a Prefeitura de São Paulo, houve o estabelecimento das subprefeituras e a descentralização da área de Saúde, com a implementação do Programa Saúde da Família (PSF), que prevê a realização de visitas domiciliares para a inclusão das populações vulneráveis no sistema de saúde”, disse Freitas.

“Nesse processo, ocorreu o contato dos técnicos do PSF com os novos imigrantes latino-americanos, trabalhadores nas oficinas de costura. E, posteriormente, a partir de uma articulação entre os técnicos do PSF da subprefeitura da Mooca e os representantes da Pastoral do Migrante, foi criada uma lei abrindo a possibilidade de contratação de imigrantes para fazerem parte das equipes do PSF”, disse.

Cidadania local

Nos anos 2000, outros acordos melhoraram a situação do imigrante no país. “O Acordo de Residência, o Visto Humanitário e o Estatuto do Refugiado criaram uma nova situação de fato. É uma situação contraditória. Por um lado, não existem estatísticas nacionais confiáveis nem uma arquitetura institucional de acolhimento. Por outro, existe uma abertura real”, ponderou Freitas.

* Com informações da Agência Fapesp