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Unicef cobra penas alternativas e prioridade ao julgar presas grávidas

Unidade Materno Infantil, do Complexo Penitenciário de Bangu, que recebe mulheres privadas da liberdade acompanhadas de seus bebês, desde o nascimento até 1 ano - Tânia Rêgo/Agência Brasil
Unidade Materno Infantil, do Complexo Penitenciário de Bangu, que recebe mulheres privadas da liberdade acompanhadas de seus bebês, desde o nascimento até 1 ano Imagem: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Isabela Vieira

Da Agência Brasil, no Rio

24/10/2015 19h24

A demora no atendimento médico e o risco de parir em uma cela em vez de um hospital preocupam as gestantes do Presídio Talavera Bruce, na zona oeste no Rio de Janeiro. Há um mês, presas fizeram um parto na cadeia. A situação, segundo elas, não é atípica. Com a dificuldade de conseguirem prisão domiciliar, como estabelece o Código de Processo Penal, as detentas grávidas reclamam do atendimento e querem ser transferidas para a Unidade Materno Infantil (UMI) do próprio presídio, que só recebe quem deu à luz.

Com nove meses de gestação, Lorraine Silva Tomás, 29 anos, participou do parto de uma colega de cadeia no mês passado. Segundo ela, há muita lentidão no serviço de escolta, que nem sempre está disponível para acompanhar as presas ao hospital, inclusive às gestantes. “Já vi várias grávidas tendo bebê aqui, passando por coisas desnecessárias. O neném corre o risco de pegar uma bactéria, de vir a falecer, não estamos preparadas para isso”, reclama.

Presa durante a gestação, Meirelaine dos Santos Gonçalves, 30 anos, foi uma das detentas que começaram a dar à luz na cela comum. Apesar de sofrer de pressão alta, o que eleva riscos de complicações, só foi transferida em trabalho de parto. Hoje na Unidade Materno Infantil, com o bobê, ela diz que é muito mais bem tratada.

“Aqui é muito melhor. Quando a gente passa mal, quando é alguma coisa com o bebê, a equipe chama a escolta e eles vêm. Quando eu ganhei neném, passei mal o dia todo. Só fui para o hospital às 15h, com pressão altíssima. Quase tive eclâmpsia”, conta.

Por conta dessas dificuldades, a gestação na cadeia põe em risco os bebês, que não foram condenados com as mães, critica a coordenadora do escritório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Rio de Janeiro, Luciana Phebo. “Desde a gestação, a saúde do bebê está em jogo. Tem a questão nutricional, do afeto, da segurança, da atenção, isso tudo”, lembrou.

Mãe segura bebê em Unidade Materno Infatil, no Complexo Penitenciário de Bangu - Tânia Rêgo/Agência Brasil - Tânia Rêgo/Agência Brasil
Imagem: Tânia Rêgo/Agência Brasil

A coordenadora do Unicef defende a transferência das grávidas para a UMI, tema discutido com a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), durante a 1º Semana Estadual do Bebê no Talavera Bruce, que termina neste domingo (25).

Por causa da Lei de Execução Penal, o Talavera permite que os bebês permaneçam com as mães presas por no mínimo seis meses, durante o período de amamentação, na Unidade Materno Infantil. Lá não há celas. As grávidas e os bebês ficam juntos, recebem cuidados médicos e alimentação reforçada. São seis porções por dia, uma a mais que para as demais presas.

Na cadeia, a Seap reconhece que o atendimento médico é mais difícil. O secretário da pasta, Erir Ribeiro, busca apoio na iniciativa privada para ampliar a unidade infantil e transferir as grávidas.“Com a reforma, poderemos trazê-las para cá”, afirma. Ele também pede apoio do Judiciário para a substituição de penas, recorrendo à sensibilidade dos juízes.“Existe a necessidade de rever a prisão. É um custo alto para o Estado”, diz.

Maioria das presas aguarda julgamento

Durante a Semana do Bebê, a Unicef também alertou para necessidade de agilizar os processos das detentas grávidas. Na UMI do Talavera, são 18 mães, das quais 11 não foram levadas a julgamento. Entre as 28 gestantes do sistema, 25 são presas provisórias. A maioria, segundo as informações da Seap, tem cerca de 30 anos e responde por tráfico de drogas.

Ex-diretora geral do complexo penitenciário do Rio, a socióloga Julita Lemgruber lembrou que 65% das mulheres presas no país são acusadas por tráfico de drogas em pequenas quantidades. “Estamos prendendo os varejistas, o que é caso da maioria dessas mulheres, não os grandes traficantes. Isso deveria ser um escândalo porque é um contingente enorme”, destaca.

Quando a mulher é presa, acrescenta a coordenadora da Unicef, a família paga uma pena. Irmãos acabam separados, e crianças, algumas vezes, são mandadas a abrigos. A filha mais velha da detenta Priscila Garcia da Silva, de 22 anos, está em um abrigo. Com 4 anos, a garota aguarda a transferência da guarda para a avó paterna, que também ficará com o bebê de Priscila, de 10 meses, nascido no sistema prisional.

A UMI oferece todos produtos para os cuidados dos bebês, como fraldas e pomadas para assaduras. A unidade aceita doação de roupinhas para crianças com mais de 1 ano.