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Último rancho de pescadores de Jurerê, em Florianópolis, é demolido

29.out.2015 - Associação dos Pescadores de Jurerê ficava no terreno que foi reintegrado - Camila Rodrigues da Silva/UOL
29.out.2015 - Associação dos Pescadores de Jurerê ficava no terreno que foi reintegrado Imagem: Camila Rodrigues da Silva/UOL

Camila Rodrigues da Silva

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

31/10/2015 06h00

O último rancho de pescadores artesanais de Jurerê Tradicional, no norte de Florianópolis (SC), foi demolido nessa quinta-feira (29), após reintegração de posse realizada pela Polícia Militar a mando da Justiça. O terreno é do empresário Luiz Almir Salvi, conhecido na região como Luizinho.

O presidente da Associação dos Pescadores de Jurerê, Vilmar Francisco Jorge, 67, contou que a associação tinha 22 pescadores e que o processo tramitava desde 2005, um ano após a criação da associação. Os pescadores contam que, à época, foi feito um acordo informal entre Osvaldo Cassimiro Forte, falecido em 2009, e o empresário para que alguns pescadores continuassem com suas canoas no espaço, conforme contou a sobrinha de Luiz, Maria Helena Petry.

“O próprio Osvaldo, em uma das audiências, confirmou a venda. A partir dessa informação, a juíza concedeu a posse para meu tio. Além disso, não tinha mais nenhum pescador ali que vivia da pesca”, reclamou Maria Helena. A empresária, que concedeu entrevista em seu hotel Pousada do Chá, situado atrás do terreno em questão, tentou intimidar a repórter do UOL fotografando sua carteira de jornalista.

Segundo o advogado de Salvi, Gustavo Vieira, a principal prova era um contrato de compra e venda, já que, como é comum em toda a cidade, o imóvel não tinha escritura pública. “Eles já deveriam ter cumprido a decisão desde o ano passado. Então esperamos passar a época da tainha para solicitar a reintegração de posse, que foi cumprida nesta semana”, detalhou Vieira.

A associação recorreu do processo nas três instâncias e, em fevereiro de 2014, o STF (Supremo Tribunal Federal) manteve a reintegração de posse. Na tarde de quinta, os destroços do rancho já estavam sendo recolhidos. “Eu nasci aqui em Jurerê e, desde os 9 anos, eu sempre pesquei”, lamenta Vilmar.

Prefeitura vai pedir terreno da União

O secretário municipal de Pesca, Maricultura e Agricultura, Roberto Katumi Oda recebeu os membros da associação no mesmo dia da demolição do rancho e disse que a prefeitura vai buscar um novo local para o rancho na região.

“A posição do município é clara: estamos dando apoio aos nossos pescadores. Vamos solicitar à SPU [Superintendência do Patrimônio da União] uma área de cessão de uso para construir um novo rancho”, afirmou Katumi.

Segundo ele, a ideia é que, por meio de um TAU (Termo de Autorização de Uso), a União destine um trecho de terras da marinha para a pesca artesanal. “O ideal é que seja em Jurerê, próximo ao local onde houve o despejo, mas será o órgão federal o responsável por definir a área”, completou.

Luiz participou da criação de Jurerê

A jornalista Patrícia Krieger pesquisa desde 2012 a história da transformação da Vila Caldeirão em Jurerê Tradicional e Jurerê Internacional. Ela conta que até os anos 80, havia cinco ranchos de pesca à beira da praia do Caldeirão, e que Luizinho foi um dos principais responsáveis pela transformação da região.

Segundo seu trabalho de conclusão de curso “Os donos de Jurerê”, nos anos 1950 Anito Zeno Petry, de Porto Alegre, procurou parceria de Aderbal Ramos da Silva, ex-governador de Santa Catarina empresário da cidade, e do político gaúcho Júlio de Souza Teixeira. Juntos criaram a Imobiliária Jurerê, cujo nome indígena significa “boca da água pequena”. Luizinho, parente de Anito, é convidado a cuidar das terras adquiridas. “Rapidamente, ele virou o responsável por desocupar o terreno. Para isso, convencia os antigos moradores a fazerem permutas, venderem suas casas e se retirarem do local”, explicou Patrícia.

Maria Helena, a sobrinha de Luizinho, afirmou que seu tio está muito idoso e que não iria dar entrevista sobre o caso.