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Cabrália Paulista, capital nacional dos caixões tem até urna do Corinthians

Victor Moriyama

Colaboração para o UOL

02/11/2015 06h00

Desde a década de 1980, a cidade de Cabrália Paulista, a 363 quilômetros de São Paulo, se especializa na fabricação de urnas funerárias. Caixões saem dali para todos os Estados brasileiros e, inclusive, para a África, mais especificamente, Angola. Por conta disso, a alcunha de "capital brasileira dos caixões" é levada com orgulho pela maioria dos moradores que dependem da indústria.

As duas fábricas de caixão em operação na cidade são os maiores empregadores locais, ao lado de uma granja da JBS-Friboi. Estima-se que, dos cerca de 4 mil habitantes da cidade, pelo menos 10% trabalhe ou tenha trabalhado em alguma etapa da produção de urnas. "A cidade já chegou a ter seis fábricas no começo dos anos 2000, mas elas fecharam ou foram trabalhar como terceirizadas para as maiores em atuação", conta Nicolas Cioni, de 36 anos, um dos proprietários da D'Leoni Urnas Funerárias, empresa que abriu nesse período.

A expertise local foi o que convenceu o empresário a investir no mercado funerário. "A mão de obra já tem experiência e a estrutura não é diferente de uma fábrica de móveis. A demanda sempre vai existir, 1,2% do total da população brasileira morre todos os anos", conta Nicolas, que emprega 27 pessoas atualmente na sua empresa.

Da fábrica de José Roberto Amor, de 53 anos, conhecido como "rei do caixão" e maior empresário do segmento na região, saem, em média, 15 mil caixões por mês. Em um galpão de 6.600 metros quadrados, 130 funcionários da JR se revezam em todas as etapas de produção. As peças moldadas ali a partir de placas de MDF ou pinus, como tampões e fundos, chegam aos operários conforme o processo avança.

Cada funcionário é especializado em uma parte da produção, como grampear o estofamento e os babados internos, fixar as alças e embalar para o transporte nos estágios finais. Ele estima já ter produzido 750 modelos diferentes nas últimas três décadas e meia que trabalha com urnas.

Time e super-herói no caixão

"Há do mais barato, custando R$ 250, até o mais caro, que sai por R$ 10 mil. Há caixões para católicos, israelitas, umbandistas e maçons. Inclusive, fazemos de times de futebol. "O do Corinthians é o que mais sai, mas só faço por encomenda quando o sujeito é muito fanático pelo clube para não ter problemas jurídicos com o licenciamento da marca", revela Amor.

Segundo ele, uma agência funerária do Ceará, que é sua cliente, especializou-se em caixões de times. O empresário revela que no Nordeste, em geral, caixões com imagens temáticas vendem bem. Há caixões estampados com figuras de santos, mas também com desenhos do Homem-Aranha, do Ben 10 e das Meninas Super Poderosas.

Desde 2013, José Roberto fabrica o "caixão da diversidade", uma urna com a bandeira LGBT para atender especificamente esse público. "Nosso mercado é bem conservador, mas também precisa de suas doses de inovação. Às vezes, a pessoa quer ser lembrada por aquilo em que acredita e, com a homossexualidade cada vez mais aceita pela sociedade, é interessante oferecer a opção de uma última homenagem personalizada", explica enquanto distribui suvenires da fábrica, um porta-canetas e um abridor de latas, em formato de caixão.

"Caixões que aparecem na televisão também saem daqui. Foram usados na cenografia de Vamp, Rei do Gado, Caminho das Índias, entre outras. Não faz muito tempo a Globo ligou aqui pedindo três", conta o empresário, que se orgulha de saber que um caixão seu, um modelo de luxo de dez lados, hoje serve de repouso para o escritor Jorge Amado, falecido em 2001.

De acordo com Claudio Fernandes, de 57 anos, proprietário da única agência funerária em operação em Cabrália Paulista, a proximidade com as fábricas torna o produto até 10% mais barato na compra, e velórios saem em ritmo acelerado, até duas horas depois do óbito. Embora a cidade exporte caixões para todo o país, a demanda é de apenas 30 por ano. "Uma das peculiaridades é que nos enterros, o caixão invariavelmente vira um assunto. As pessoas comentam porque trabalham ou trabalharam com eles. Sempre ouço coisas do tipo 'esse foi feito lá na fábrica de fulano'. Vira assunto na cidade por dias depois do enterro", conta.