Topo

"Não houve tiroteio", diz mãe de menino morto por PM no Complexo do Alemão

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

07/11/2015 06h00

Após sete meses de investigação, a Polícia Civil do Rio de Janeiro concluiu que o policial que atirou na cabeça do menino Eduardo de Jesus Ferreira, 10, atingido por um tiro de fuzil quando estava na porta de casa, no Complexo do Alemão, na zona norte da capital fluminense, em 2 de abril deste ano, agiu em legítima defesa. Para a mãe de Eduardo, Terezinha de Jesus, no entanto, a resposta não é suficiente.

Prestes a viajar à Europa com a Anistia Internacional para falar sobre a violência policial no Estado, Terezinha pretende entrar na Justiça para pedir uma nova investigação e uma nova reconstituição dos fatos. “Disseram que atiraram no meu filho em legitima defesa durante um tiroteio e isso não é verdade. Não houve tiroteio”, afirma. “Meu filho não estava na linha de tiro, estava na porta da minha casa. O único tiro que teve foi o que o matou.”

Segundo o delegado Rivaldo Barbosa, diretor da Delegacia de Homicídios, a investigação mostrou que cinco PMs -- dois do Batalhão de Choque e três da UPP -- estavam na região conhecida como Areal quando foram atacados por criminosos. Dois dos policiais que estavam à frente, ambos da UPP, revidaram, atirando com fuzis calibre 762 na direção dos bandidos. Uma bala atingiu Eduardo, que estava a apenas cinco metros dos policiais. Ele morreu na hora. A perícia não conseguiu definir qual dos dois PMs foi o autor do tiro.

Terezinha conta que foi a “última a saber” do resultado das investigações e se ressente com o resultado. “Fiquei sabendo pelos jornalistas. Fiquei com muito ódio, em especial do delegado, que tinha pegado na minha mão e me dito: “dona Terezinha, eu solucionei o caso Amarildo. Coloquei 12 policias na cadeia, foi um caso muito difícil, e o seu caso não será diferente. Eu vou punir esses policiais’”, lembra.

Em junho, o governo do Estado indenizou Terezinha e a família por danos morais e materiais ao reconhecer a responsabilidade dos policiais na morte. "Foi um erro que ninguém admite", disse o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) à época. Em julho, três meses após o crime, a mãe voltou para o Piauí, seu Estado natal, com duas filhas, um neto e o genro com medo de represálias e da violência na cidade. Em abril, também no Alemão, na mesma semana em que Eduardo morreu, Elizabeth Alves de Moura Francisco, 41, foi baleada dentro de casa com dois tiros nas costas.

No Piauí, Terezinha diz que recebeu ameaças de pessoas que rondaram o túmulo do filho. Ao procurar a delegacia local para prestar queixa, diz que foi orientada a “se trancar em casa”. “Eu não posso ficar a vida inteira dentro de casa trancada com medo”, afirma.

Para a Anistia Internacional, o resultado das investigações é uma aberração. “Este fato reitera a percepção de que as favelas são vistas e tratadas como territórios de exceção e que qualquer morte provocada pela polícia pode ser legitimada pelo sistema jurídico", afirmou o diretor-executivo da organização, Atila Roque. “Não há legítima defesa de policiais quando um menino de 10 anos, desarmado, morre com um tiro de fuzil na cabeça disparado por um policial militar."