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Palmito ilegal e cozido na mata abastecia indústria e restaurantes no RS

Policiais fazem apreensão de palmito extraído ilegalmente em Maquiné, no RS - Felix Zucco/Agência RBS
Policiais fazem apreensão de palmito extraído ilegalmente em Maquiné, no RS Imagem: Felix Zucco/Agência RBS

Flávio Ilha

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

10/11/2015 11h41Atualizada em 10/11/2015 17h38

Uma operação conjunta envolvendo o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP), Receita Federal e Vigilância Sanitária atacou nesta terça-feira (10) um grupo criminoso que extraía palmito da espécie Juçara, ameaçada de extinção, de forma clandestina em unidades de conservação protegidas por lei.

A ofensiva, batizada de Ju$ara, revelou que os palmitos são cortados dentro da mata nativa, cozidos na hora em acampamentos improvisados, clandestinos e com péssimas condições de higiene e, depois, envasados e transportados para fábricas sem documentação fiscal. Rótulos falsificados também eram usados nos vidros para que o palmito passasse por de palmeira real, cuja comercialização é autorizada.

A quadrilha extraía de áreas de proteção ambiental (APA) com predominância em biomas da Mata Atlântica da região litorânea do Rio Grande do Sul. Segundo Bastos, a extração, que é proibida ali, avançava até áreas de conservação de Santa Catarina. O grupo também invadia propriedades privadas na região para coletar a matéria-prima.

O produto era vendido no comércio atacadista de Porto Alegre, Vale do Sinos e Serra. Segundo o MP, o palmito clandestino era revendido também para bares, restaurantes e pizzarias. Uma pessoa foi presa.

Ao todo, 15 mandados de busca e apreensão em estão sendo cumpridos em Maquiné, Três Forquilhas, Porto Alegre, Caraá, Terra de Areia, Dois Irmãos, Canoas, Caxias do Sul, Gravataí e São Leopoldo, além de mandados de apreensão de quatro veículos usados para o transporte do produto.

Foram apreendidas cerca de sete toneladas de palmito em conserva produzido de forma clandestina, além de palmito-juçara in natura, produtos químicos para a produção da solução em que o alimento é mantido, quatro veículos utilizados no transporte, documentos e anotações.

O promotor Alcindo Bastos Filho destacou que existem quatro empresas atuando na produção de palmito no Rio Grande do Sul – três delas tiveram as atividades suspensas pela Operação Ju$$ara. “Boa parte do produto que tem rotulagem de palmeira real na verdade é palmito-juçara. O consumidor deve atentar ao preço, porque a exploração de mão de obra irregular, a extração de palmito da Mata Atlântica e sua produção sem condições mínimas de higiene fazem com que a cobrança seja praticada abaixo do mercado”, alertou. 

Bastos Filho disse que, além de ser um produto de extração ilegal, ele pode causar doenças graves, como o botulismo, devido às "condições precárias" de preparo. "O botulismo causa comprometimento progressivo do sistema nervoso e chega a provocar a paralisia dos músculos respiratórios, o que pode ser fatal", advertiu.

A Promotoria investiga também os principais compradores e distribuidores das conservas da espécie Juçara no Estado. As marcas Três Forquilhas, JN, Serra Azul e Conservas Manzan, segundo o MP, fomentam a atividade ilegal com o fornecimento de utensílios e materiais para a produção e envasamento das conservas clandestinas, como vidros, caixas, ácido cítrico e sal.

O Centro Estadual de Vigilância Sanitária determinou a retirada das marcas do mercado.

Outro lado

O dono da Conservas Manzan, Celso Alvino Manzan, negou as acusações. “Quem é inocente vai saber de alguma coisa? Duvido que achem. Está tudo legalzinho, legalzinho”, disse. O empresário foi convocado a depor na quinta-feira.

Segundo Manzan, o produto de sua agroindústria é plantado especialmente para colheita e tem todas as autorizações para funcionar. O empresário se disse “humilhado” pela intimação. “Trabalho de forma honesta há mais de dez anos. Não é justo”, reclamou.

A direção da empresa Conservas Serra Azul também negou irregularidades. "Está tudo sob controle, tudo legalizado. Todo palmito que nós compramos tem procedência", afirmou uma funcionária que não quis se identificar.

Os representantes das marcas Três Forquilhas e JN não foram localizados pela reportagem.

Os suspeitos, segundo o promotor responsável pela investigação, infringem dispositivos da lei 8.137/90, que prevê crime nas relações de consumo, vender ou expor mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial.

Além dos mandados de busca, foram oito pessoas foram proibidas de comercializar produtos e derivados de palmito. As indústrias investigadas também tiveram a atividade suspensa. 

A Operação Ju$$ara conta com o apoio da Brigada Militar, Delegacia do Meio Ambiente da Polícia Civil, Receita Estadual, Secretaria Estadual da Saúde (Centro Estadual de Vigilância em Saúde) e agentes da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).