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Falta de água atrai oportunistas e inspira solidariedade em Colatina

Gustavo Maia e Marcela Sevilla

Do UOL, em Colatina (ES)

23/11/2015 06h00

A população de Colatina, no Espírito Santo, tem motivos de sobra para reclamar. O rio Doce, única fonte de abastecimento da cidade, foi invadido e praticamente inutilizado pela onda de lama de rejeitos da mineradora Samarco liberada após a tragédia de Mariana (MG). Como consequência, as torneiras secaram na última quinta-feira (18), quando a enxurrada chegou ao município.

Desde então, os moradores têm que enfrentar longas filas em pontos de distribuição de água mineral, muitas vezes sob forte calor. Com pouco controle, a logística da entrega é confusa e tem provocado tumultos e insatisfação.

Para conseguir água para usar em suas casas, precisam se deslocar até caixas coletoras de 10 mil litros instaladas na cidade pela Samarco. Mas nem todos os bairros foram atendidos, e muitos moradores, sem carro, têm que caminhar longas distâncias carregando fardos de água.

Além destes transtornos, colatinenses reclamam ainda da ação de “aproveitadores” que, segundo relatam, buscam obter vantagem da situação de calamidade pública vivida na cidade.

“A água que a Samarco está dando é para toda a população. No meu modo de pensar, uma pessoa pode chegar nas caixas d’água e encher um ou dois galões, mas tenho visto pessoas pararem com caminhões-baú para encher dois, quatro, seis toneis de 200 litros cada”, afirmou neste domingo (22) o motorista Arthur da Silva, 48. “Aí uns levam demais e outros levam de menos”, resumiu.

A queixa ecoa no depoimento do produtor rural Eustério Bortolo, 52, que acompanhou a primeira distribuição de garrafas de água mineral no bairro São Braz, neste domingo. “O que eu vi foram pessoas muito gananciosas, que acumularam um volume muito grande”, disse. A reportagem do UOL observou que muitos moradores entraram mais de uma vez na fila.

As reclamações também se direcionaram a comerciantes que teriam quase duplicado o preço de galões de água. Os produtos estariam sendo vendidos por até R$ 35 após o desastre. “Estão aproveitando essa situação. O custo deles é o mesmo, mas querem tirar vantagem. E essa era uma hora que todo mundo deveria ajudar”.

Solidariedade

No entanto, em meio aos transtornos, também há espaço para a solidariedade. Já que nem todos os moradores podem ir aos pontos de distribuição, o empresário Daniel Mariano Gonçalves, 32, mobilizou um grupo de voluntários para entregar a água nas casas de acamados, idosos, cadeirantes e lactantes com recém-nascidos. “Estão entregando, mas sabemos que algumas pessoas precisam ser assistidas diretamente.”

Desde a chegada da lama à Colatina, o tráfego de caminhões-pipa pelas ruas da cidade é intenso. Motorista de um dos veículos, Diorlando Jordão saiu de São Gonçalo (RJ) e chegou à cidade capixaba na manhã da quinta-feira.

“Estamos dando sequência ao trabalho para ajudar a população, para amenizar o sofrimento”, contou o caminhoneiro, que foi contratado para trabalhar em turnos de 12 horas pegando água de uma lagoa da região e levando para estação de tratamento municipal.

Moradores de Aracruz (ES), os amigos Edvaldo da Silva Rodrigues, 60, e Hélio Antenor de Lima, caminhoneiro, 47, se revezam no trabalho com um caminhão-pipa. "Independente de remuneração, é o maior prazer estar dirigindo uma carreta com 30 ou 40 mil litros de água, sabendo que vai beneficiar várias pessoas", disse Edvaldo. "Se fosse até de graça eu viria com o maior prazer".

Com uma caixa d’água abastecida pela Samarco instalada no terreno de casa, no bairro Martinelli, o sargento do Corpo de Bombeiros Ozias Iglesias Dias, 50, se tornou, nas palavras deles, "guardião voluntário" da mesma. Ele avisa a empresa quando a caixa está ficando vazia e a vigia para impedir que alguém leve "um absurdo de água”, para não faltar para quem precisa".

"Eu e a minha família estamos monitorando, porque a gente mora do lado e para nós não é difícil. Faço questão de ajudar a população de Colatina", disse.