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Documentário quer retratar consequências da destruição pela lama em MG e ES

O diretor Hermano Beaumont entrevista líder da tribo krenak para documentário - Divulgação
O diretor Hermano Beaumont entrevista líder da tribo krenak para documentário Imagem: Divulgação

Rayder Bragon

Colaboração para o UOL, em Belo Horizonte

25/11/2015 06h00

O jornalista e diretor de fotografia Pedro Serra, 37, está percorrendo cidades e lugarejos de Minas Gerais e do Espírito Santo alcançados pela onda de lama e rejeito de minério de ferro após o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG), em 5 de novembro.

Ele diz que quer tentar compreender os efeitos dessa tragédia na vida de pessoas cujo cotidiano foi transformado de maneira abrupta pelo maior desastre ambiental do país. Para tanto, vai colher depoimentos de moradores das localidades atingidas.

Serra falou ao UOL por telefone de Linhares, no Espírito Santo, onde estão ele e o roteirista e diretor Hermano Beaumont, 33, sócio na produtora que mantêm no Rio de Janeiro.

Ele conta que ambos sentiram a necessidade de compreender o drama mineiro. “A motivação principal foi entender a tragédia. Buscar o entendimento através das pessoas e ver o que elas estão passando. A gente sentiu uma necessidade de parar, com calma, e conversar com os moradores. Acho que a gente foi encontrando as pessoas pelo caminho porque não tínhamos a ânsia de sair fazendo tudo com pressa”, descreveu.

Até o momento, eles disseram ter entrevistado 50 pessoas desde o dia 19 deste mês, quando começaram o trabalho. As despesas, ainda conforme o profissional, estão sendo bancadas por eles.

Serra disse ter encontrado colegas documentaristas nas regiões afetadas pela lama que tinham objetivo de mostrar a tragédia por outro viés. “Tem muita gente fazendo [documentários]. Eu encontrei com muitas produtoras no caminho. Eu vejo muita gente querendo fazer coisas investigativas, apontar o dedo e arrumar um culpado. Isso tem que ser feito, mas não é o que eu quero fazer. Eu quero contar histórias das pessoas que estão envolvidas nisso. A gente tem 50 relatos e 90% são muitos fortes”, contou.

Ele retrata, por exemplo, o encontro que teve com um morador de Bento Rodrigues, o lugarejo mais afetado pela lama, que se emocionou ao encontrar com o cão de estimação. Ele disse ter conseguido acessar a localidade após permissão da Polícia Militar.

“O Nilton [de Souza] estava como voluntário em Mariana, ajudando a separar as doações. Apesar de ter perdido tudo, disse que precisava ajudar de alguma forma. Ele se ofereceu para ir com a gente a Bento. Dizia que precisava encontrar a sua cachorra. Quando chegamos lá, ele começou a gritar o nome da cachorra. De repente, ela veio, toda suja de lama. Ele chorou, todos choraram, foi um momento emocionante”, relatou.

No entanto, o jornalista afirmou que a intenção não é fazer um documentário exclusivamente sentimentalista.

“A gente não quer ter um trabalho para as pessoas chorarem. Tem coisas muito legais que vão além disso, como a ajuda feita pelas pessoas e a superação das pessoas”, afirmou.

Os sócios criaram uma página no Facebook, intitulada “Humanos do Rio Doce’, na qual são postados trechos de depoimentos de personagens afetados pelo desastre ambiental e que foram entrevistados para o documentário.

“O documentário vai aprofundar isso, mas a gente queria um impacto imediato. Queria que essas histórias já começassem a ganhar vida mesmo antes da edição”, afirmou. Conforme Serra, o trabalho ainda não tem data para ser finalizado.

“A nossa ideia é passar esse documentário em festivais e tentar a exibição em TVs abertas ou fechadas. A gente não pensa em retorno financeiro. A ideia é causar um impacto que traga algum tipo de ação das pessoas para que se cobre da empresa e do poder público”, ponderou. No trabalho, há ainda a participação do fotógrafo Alexandre Salem e do produtor Diego Sales.

Anos de recuperação

Serra relembra a cobertura que fez para um jornal da tragédia na região serrana do Rio de Janeiro, em 2011, quando mais de 900 pessoas morreram.

“São duas tragédias bem diferentes. Na região serrana do Rio, morreram centenas de pessoas. [O desastre] Teve milhares de desabrigados, atingiu três cidades grandes. Aqui foi um número bem menor de mortes, e em uma zona rural, mas essa tragédia matou um rio. Isso, para mim, é uma tragédia do ponto de vista ambiental, muito maior porque isso vai demorar muitos anos para recuperar”, afirmou.

O profissional ainda alertou para a dificuldade que ainda vai ser enfrentada por quem dependia do rio. “As coisas [auxílio] para os desabrigados estão acontecendo. O rio é que não tem solução”, declarou.

Segundo o jornalista, nenhum representante da Samarco, dona da barragem que se rompeu, ainda quis falar com eles.