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"Em 37 anos, nunca tinha acontecido nada nesse nível", diz médico agredido

Médico é agredido por paciente no RN - Reprodução
Médico é agredido por paciente no RN Imagem: Reprodução

Aliny Gama

Colaboração para o UOL, em Maceió

07/12/2015 22h14

O médico Antônio Joaquim Ferreira de Andrade, 65, que foi espancado por um paciente na Unidade Mista de Saúde de Tibau do Sul, no litoral sul do Rio Grande do Norte, disse que nos 37 anos de profissão nunca tinha passado por situação de violência semelhante à ocorrida no plantão da última sexta-feira (4).

O médico foi agredido com socos e chutes pelo administrador de empresas Guilherme Mendes de Faria, 32, porque o rapaz não queria aguardar que a sala de sutura fosse desocupada para ser atendido pelo médico particular dele, que solicitou o espaço para realizar o procedimento.

Andrade é aposentado e há dois anos saiu de Santa Catarina para morar na Praia da Pipa, distrito de Tibau do Sul, onde é médico no posto de saúde e plantonista do hospital às sextas-feiras. Em entrevista ao UOL, na noite desta segunda-feira (7), o médico disse que ficou surpreso com a agressão e não teve como se defender.

“Nos meus 37 anos de medicina, nunca tinha acontecido nada nesse nível. Não vou ter medo de voltar a atender lá porque pessoas assim existem, mas não são a regra. O pessoal da comunidade de Tibau do Sul tem uma relação boa, tranquila. Já tem mais de um ano que atendo no hospital e no posto de saúde e nunca tive problemas”, contou o médico.

Segundo a equipe médica, Faria deu entrada na unidade hospitalar com um ferimento na cabeça, sem gravidade, após cair no banheiro embriagado. Ele foi informado que a sala de sutura estava ocupada por um homem que caiu de uma moto e o médico estava realizando várias suturas no paciente. Da entrada até a agressão, foram cerca de 40 minutos.

“Além de muito embriagado, ele presumivelmente tinha de estar com outra coisa porque o comportamento foi sem sentido. Ele estava numa agressividade sem sentido mesmo antes de me atacar porque ele esmurrava as paredes do hospital e chamava palavrão o tempo todo”, relatou o médico.

As cenas de violência foram registradas por outros pacientes que estavam na unidade mista. Na gravação, é possível ouvir os gritos de Faria na porta da sala de atendimento médico e depois dando uma sequência de socos e chutes.

Sem defesa, o médico caiu no chão e continuou sendo chutado. Funcionários e pacientes se desesperam para conter Faria, pois o hospital não dispunha de seguranças. O médico se levantou ensanguentado, com ferimentos no supercílio.

“Ele bateu, derrubou e continuou socando no meu rosto. A agressão só parou porque ele foi imobilizado pelo cirurgião dele e o motorista da ambulância do hospital que chegou na hora.

Eu não esperava que ele fosse me bater, apesar de já estar alterado desde que entrou no hospital. Ele tem 32 anos e 1,80m, não tinha como me defender de um rapaz daquele porte”, contou Andrade.

Nesta segunda, Andrade fez exame de corpo de delito no Itep (Instituto Técnico Científico de Polícia do Rio Grande do Norte). O resultado do exame deverá ser entregue à delegacia de

Canguaretama, responsável por investigar o caso, ainda nesta terça-feira. A polícia tem 30 dias para concluir o inquérito.

"Ele agrediu não só a mim como os profissionais de saúde, não é só ali que ficou o caso. Não atingiu a só um indivíduo, mas toda uma classe de trabalhadores da saúde. Os hospitais e postos precisam de reforço na segurança, apesar de não ser uma regra de atendermos pessoas descontroladas como aquele rapaz. O caso está com tanta repercussão pelo sentimento de impunidade e a covardia com que ele me atacou”, destacou Andrade.

Arrependido

O agressor disse estar arrependido do que fez porque "foi uma atitude impensada", por estar "nervoso". Faria afirmou que se pudesse voltar no tempo não teria se descontrolado e agredido o médico. Ele negou que tenha treinado alguma arte marcial.

Nesta segunda-feira (7), a comarca de Monte Alegre, responsável pelo município de Tibau do Sul, acatou o pedido do MPE (Ministério Público Estadual) e proibiu que Faria viaje para o exterior, além de expedir outras medidas cautelares.

Segundo relatos de familiares, Faria embarcaria na próxima quarta-feira (9) para fixar residência e estudar no Canadá. Agora, até o julgamento, o agressor terá de comparecer mensalmente ao Juízo competente, entre os dias 15 e 20, para justificar suas atividades; também está proibido de se ausentar da comarca de residência por mais de sete dias, bem como se ausentar do país, sem prévia autorização da Justiça para evitar que algum ato do processo seja retardado ou obstado em razão de sua ausência.

A Justiça informou que já enviou ofício à superintendência da Polícia Federal para fiscalização do cumprimento da decisão no ponto em que proíbe o acusado de se ausentar do país, sem prévia autorização do Juízo competente.

Reforço

A Procuradoria do Município de Tibau do Sul informou que vai encaminhar uma representação ao MPE (Ministério Público Estadual), nesta terça-feira (8), solicitando que seja ingressada ação penal contra Guilherme Faria pelo crime de desacato e agressão ao servidor público. A prefeitura informou que está prestando assistência ao médico para ele também ingressar com ação de danos morais contra o agressor.


O município disse ainda que a partir desta terça-feira (8) a Unidade Mista de Saúde de Tibau do Sul vai receber reforço na segurança com um vigilante na porta de entrada. A prefeitura justificou que a unidade hospitalar não possuía vigilante porque não tem movimento intenso, como o ocorrido na sexta-feira (4), e nunca registrou casos de violência dentro do hospital.