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Crise hídrica: vai faltar água em 2016?

Pedro França/Agência Senado
Imagem: Pedro França/Agência Senado

Fabiana Maranhão

Do UOL, em São Paulo

04/01/2016 06h00Atualizada em 04/01/2016 11h58

O fim de 2015 foi marcado por um volume maior de chuva em relação ao resto do ano na região Sudeste. E muitos comemoraram o aumento dos níveis dos reservatórios. Mas, em 2016, vamos continuar dependendo de São Pedro para não termos crise de falta de água? Segundo especialistas consultados pelo UOL, o momento é de cautela, já que a crise hídrica ainda não acabou e, pior, pode se repetir no futuro.

Ao longo do ano, as empresas da região responsáveis pelo abastecimento de água focaram suas ações em trazer água de rios distantes, por meio de construção de adutoras e reservatórios. Leo Heller, relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre o direito à água potável e ao saneamento, acredita que as obras poderão "atenuar um pouco a demanda de água dos reservatórios" que são usados para abastecimento de água.

Já para Pedro Luiz Côrtes, geólogo e especialista em gestão de recursos hídricos da USP (Universidade de São Paulo), essas medidas "não são suficientes porque persistem em um modelo que demonstra estar esgotado".

"Mesmo que voltássemos hoje a uma situação com todos os mananciais com níveis adequados [de água], isso não nos livraria de uma nova crise hídrica nos próximos anos porque a quantidade de usuários vem crescendo muito por conta do crescimento populacional", afirma. Côrtes sugere que os governos "privilegiem o reúso e incentivem e orientem o uso racional da água".

Mais chuvas no verão

Em novembro, choveu em São Paulo 250,2 milímetros, segundo medição do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). A quantidade é mais que o dobro da registrada no mesmo mês de 2014. Já a estação meteorológica do Rio de Janeiro registrou no último novembro 162,1 milímetros de chuva, cerca de 60% a mais que em novembro de 2014. O aumento no volume de chuva é resultado da incidência do El Niño, causado pelo aquecimento das águas do oceano Pacífico. 

A previsão é que a quantidade de chuva continue acima da média nos próximos meses na região. "A tendência é que chova um pouco acima da média até março, abril, quando começa a reduzir", afirma Neide Oliveira, meteorologista do Inmet. Segundo ela, a pluviometria deverá ser variável nesse período, com alternância entre um mês muito chuvoso e outro com menos chuva.

Momento de cautela

Apesar de o cenário ser favorável à ocorrência de chuva, a situação não pode ser considerada "segura", na opinião de Leo Heller, relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre o direito à água potável e ao saneamento.

"Não creio que possamos anunciar segurança em relação à situação de 2016, com o início da estação chuvosa de 2015. Ainda não está claro se teremos um volume significativamente maior de chuvas neste verão", alerta.

Heller lembra que "importantes reservatórios estavam com volume muito baixo no início do período chuvoso, e a quantidade de chuvas necessárias para recompor esses volumes a uma situação confortável será muito elevada".

A opinião é compartilhada por Côrtes, que cita o caso do Cantareira, um dos maiores sistemas de abastecimento do país, que já chegou a fornecer água para 8,8 milhões de pessoas na Grande São Paulo antes da crise hídrica e que hoje abastece 5,2 milhões de moradores da região.

"O prognóstico para este verão é que se acumule água no positivo, mas não o suficiente para livrar [o Cantareira] de voltar a entrar no volume morto", adverte Cortês.

Lições da crise

A crise hídrica, que já dura cerca de dois anos, tem deixado muita gente sem água, mas também ensinou lições, tanto para a população quanto para os governos. Hábitos como fechar a torneira durante a escovação dos dentes ou a lavagem da louça estão sendo aos poucos incorporados pelas pessoas. Já governos e concessionárias de água e esgoto afirmam estar investindo em obras. 

A Sabesp, responsável pelo abastecimento da Grande São Paulo, informa que, para tentar reduzir o consumo, passou a conceder bônus para quem economiza água e multar os 'gastões'. A empresa diz ter intensificado a redução da pressão da água para diminuir vazamentos. Além disso, a companhia tem buscado captar água em novos rios.

A Cedae, que abastece o Rio de Janeiro, comunica que tem investido em campanhas educativas sobre economia de água; na renovação de tubulações para conter vazamentos; e na construção de reservatórios, adutoras e estações de tratamento. A Copasa, companhia de água e esgoto de Minas Gerais, afirma que lançou campanha contra o desperdício de água e um programa contra vazamentos, além de ter realizado obras para aumentar a captação de água de rios.

E o Cesan, a empresa de saneamento do Espírito Santo, declara ter criado um comitê hídrico para discutir saídas para a crise. A empresa diz que transformou uma represa, antes usada para geração de energia, em reservatório para fornecimento de água e deu início às obras para construção de um novo sistema de abastecimento. Segundo a Cesan, foram lançadas campanhas de conscientização e feitas parceiras com indústrias para que usem água de poços artesianos e de reúso.