Topo

"Invisível", carnaval de bate-bolas mobiliza centenas de pessoas no Rio

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

07/02/2016 06h00

Enquanto parte do Rio de Janeiro e do país se concentram para acompanhar os desfiles na Marquês de Sapucaí e outros milhares de foliões chegam à capital fluminense para aproveitar o sem fim de blocos que tomam a cidade, um grupo vara noites nos últimos preparativos de um Carnaval que não costuma aparecer na televisão, mas mobiliza centenas de pessoas todos os anos no subúrbio carioca: os bate-bolas.

Adriano Esteves, 41, líder da “Turma da Praça”, que reúne cerca de 50 bate-bolas, como são chamados os foliões que saem as ruas com o rosto coberto e roupas elaboradas que tomam conta da zona oeste do Rio e da Baixada Fluminense todos os anos no Carnaval, ainda lembra com carinho do medo e admiração ao ver os mascarados caminhando pelas ruas e fazendo algazarra.

“Eu ficava encantado, querendo ir com eles”, diz. Adolescente, saiu fantasiado pela primeira vez em 1988 e desde então dedica parte dos seus dias ao grupo, que vê como parte da família. “Isso aqui é o ano todo, mal termina o Carnaval, já começamos de novo”, explica. 

Muitas vezes associados à violência devido as rixas e brigas entre as diferentes turmas, os bate-bolas ou clóvis, como também são conhecidos, ganharam força no subúrbio carioca, em especial na zona oeste, a partir dos anos 1950, e remontam aos tradicionais carnavais de máscaras europeus, costume trazido ao Rio pelos imigrantes que aportaram na cidade.

O nome se deve as bolas que os grupos costumam bater contra o chão, fazendo barulho, a fim de assustar quem passa. Com o tempo, alguns grupos as substituíram por sombrinhas e leques, afastando-se da imagem de briga.

“Esse carnaval da zona oeste, da Baixada, sempre foi muito ignorado pela narrativa oficial do Rio de Janeiro”, explica o historiador Luiz Simas, que estuda os bate-bolas. “A gente tem um discurso sobre o carnaval de rua do rio, de que ele teria murchado e sido retomado a partir da década de 1980 com blocos como o Suvaco do Cristo, o Simpatia é quase amor, mas esse discurso ignora o bate-bola.”

Assim como as escolas de samba, os bate-bolas também trabalham com um enredo, que muda todos os anos e é revelado apenas no sábado de Carnaval – no caso da Turma da Praça, o tema escolhido foram as Katrinas mexicanas, mas já houve anos em que o grupo saiu homenageando o circo, falando sobre os sete pecados capitais, o Haloween, entre outros. Enquanto conversa com a reportagem, Esteves orienta os amigos, que costuram as fantasias, repletas de desenhos e plumas. “É uma guerra de luxo”, diverte-se.

Esse ano cada traje do grupo, que inclui roupa de baixo, macacão, sobrecasaca, máscara e sapato, custou cerca de R$ 2.100, pagos em parcelas por cada integrante ao longo do ano. Além de preparar as roupas, eles também se cotizam para alugar um ônibus para levar a turma para aproveitar o carnaval em outros bairros e comprar os fogos, que marcam o início oficial da festa -- para este ano estão planejados entre 12 e 15 minutos de queima. “Quando começam os fogos você arranca o cansaço do corpo”, diz Esteves, que lidera o grupo há 15 anos.

Mauro Júnior é outro apaixonado pelo tema. Dono de um trailer de lanches, todos os anos ele compra as fantasias dos carnavais anteriores e as revende. Ele se ressente apenas da violência. “Tem turma que é tranquila, tem turma que se aproveita da fantasia para brigar, o que é uma pena. É tão bonito”, diz.

Para Simas, os grupos violentos são minoria. Ele considera que os bate-bolas realizam um dos carnavais mais “intensos” da cidade, mas ficam à margem, por se concentrarem longe do centro e da zona sul. “É um Carnaval deixado de lado, quase apócrifo, proibido”, diz.