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Polícia matou 1 em cada 5 assassinados no Rio em 2015; nº é maior que 2014

Igor Silva foi morto com um tiro no peito perto de sua casa, no Complexo da Maré - Reprodução/Facebook
Igor Silva foi morto com um tiro no peito perto de sua casa, no Complexo da Maré Imagem: Reprodução/Facebook

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

03/03/2016 06h00

No dia 22 de fevereiro, o jovem Igor Firmino da Silva, 19, foi morto com um tiro no peito perto de sua casa, na comunidade Parque União, no Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, durante uma operação da Core (Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil) no conjunto de favelas.

O jovem é o retrato mais recente de uma estatística que coloca a polícia como uma das principais responsáveis pelos homicídios na cidade do Rio de Janeiro – uma a cada cinco pessoas assassinadas na capital fluminense em 2015 foram mortas por agentes do Estado.

O número leva em conta a soma dos homicídios dolosos, lesão corporal seguida de morte, roubo seguido de morte e homicídios em decorrência de intervenção policial. Ao todo, foram cometidos 1.564 homicídios intencionais na cidade do Rio de Janeiro no ano passado, segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública), sendo 307 (19,63%) por policiais.

Procurada pela reportagem para comentar os dados, a Secretaria de Segurança Pública informou que está reduzindo o uso de fuzis e de munição, criou um centro de formação do uso progressivo da força e a Divisão de Homicídios "para contribuir na redução dos índices criminais".

A pasta também citou dados piores de 2006, ano anterior ao começo da gestão de Sérgio Cabral (PMDB), de quem o atual governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) foi vice.

Número de homicídios intencionais

  • 2015
  • Total: 1.564
  • Em decorrência de intervenção policial: 307 (19,63%)
  • 2014
  • Total: 1.552
  • Em decorrência de intervenção policial: 247 (15,91%)

Força letal

Para o sociólogo e pesquisador do Laboratório de Análise da Violência da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) Ignácio Cano, o valor é muito elevado e mostra um “uso excessivo da força letal”. “O que a gente espera em comparações internacionais é que esse valor não ultrapasse 5%”, afirma. Em 2014, a polícia foi responsável por 247 (15,91%) das mortes na capital fluminense -- nacionalmente, no mesmo ano, esse número ficou em 5%, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Mas o número pode ser muito maior. A assessora de Direitos Humanos da Anistia Internacional, Renata Neder, lembra que, segundo pesquisas da organização, algumas mortes cometidas por policiais são registradas como homicídios comuns em vez de decorrentes de intervenção policial. 

Abaixo-assinado

Em dezembro, a Anistia encaminhou um documento com 61.000 assinaturas ao governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) em que pede o fim do que chama de "execuções" de cidadãos pela polícia. A recomendação também aparece no relatório anual "O Estado dos Direitos Humanos no Mundo", que compila um panorama da situação dos direitos humanos em 160 países, incluindo o Brasil.

carro jovens - Fabiano Rocha/Agência O Globo - Fabiano Rocha/Agência O Globo
Carro em que estavam os cinco jovens mortos pela polícia em Costa Barros, em novembro
Imagem: Fabiano Rocha/Agência O Globo

O texto, que fala em "graves violações de direitos humanos" no país, ressalta os casos dos cinco jovens mortos a tiros pela polícia em Costa Barros, na zona norte do Rio, em novembro, e do menino Eduardo de Jesus Ferreira, 10, morto em frente à sua casa durante uma operação policial no Complexo do Alemão, em abril. “Apenas se a polícia do Rio parar de matar, você vai ver uma queda enorme nos homicídios na cidade”, diz Renata.

O governo cita com frequência a “guerra às drogas” como justificativa para a alta letalidade da polícia fluminense.

Igor, diz a polícia, foi encontrado com uma pistola com a numeração raspada e com um rádio transmissor, informação questionada pela família, que lembra que o jovem não tinha antecedentes criminais e trabalhava em uma farmácia. 

Para Renata, no entanto, esta não deveria ser a questão. “O foco da política de segurança pública deveria ser a preservação da vida e o combate ao crime organizado não é incompatível com a preservação da vida”, afirma. “Independentemente da legislação, a política de segurança pública tem que agir de acordo com protocolos internacionais de uso da força e de armas de fogo e eles não estão fazendo isso.”

Número de policiais mortos

No mesmo período, em 2015, de acordo com dados do Instituto de Segurança Pública, 18 policiais civis e militares foram mortos em serviço, o equivalente a 1,14% do total de assassinatos na cidade. Em 2014, as mortes de policiais corresponderam a 0,83% do total.

Um levantamento feito pelo UOL em outubro mostra que dois PMs morreram por mês, em serviço, no período entre janeiro e setembro de 2015. O número seria maior se o Instituto de Segurança Pública incluísse, no dado, policiais mortos enquanto estavam de folga.

Entre janeiro e novembro de 2014, 44 militares morreram durante a folga, o triplo em relação aos PMs mortos em confronto, no mesmo período. Procurada pela reportagem, a Polícia Militar informou que não divulgaria o número referente a 2015.

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