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Verba da União cedida ao RJ pagaria mais da metade da dívida com fornecedores em 2015

Estudantes da Uerj bloqueiam os dois sentidos da rua São Francisco Xavier em protesto pelo atraso no pagamento dos servidores terceirizados - José Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo
Estudantes da Uerj bloqueiam os dois sentidos da rua São Francisco Xavier em protesto pelo atraso no pagamento dos servidores terceirizados Imagem: José Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

23/06/2016 06h00

Na Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), estudantes têm aulas à noite com as portas trancadas porque não há seguranças na unidade - há duas semanas uma professora foi assaltada em sua sala, enquanto corrigia provas. No IML (Instituto Médico Legal), os peritos chegaram a fazer uma “vaquinha” para limpar as salas em que trabalham e garantir a realização das necrópsias; sem limpeza, a sede do instituto, no centro da capital fluminense, deixou de receber corpos alegando “condições insalubres”.

Nos 16 restaurantes populares espalhados pelo Estado, toda a refeição – servida a R$ 1 – pode ser a última: sem receber repasses do governo desde 2015, as empresas responsáveis pelas unidades ameaçam fechar as portas.

Os três casos são exemplos das consequências da falta de pagamento às empresas fornecedoras responsáveis pelos terceirizados que trabalham para o governo do Estado. Considerando apenas 2015, o Rio deve R$ 5,5 bilhões aos fornecedores, segundo dados da Secretaria da Fazenda - quase duas vezes o valor da ajuda de R$ 2,9 bilhões aprovada pela União ao Estado após o governo decretar Estado de Calamidade Pública no âmbito da administração financeira.

A Secretaria da Fazenda não soube precisar o valor da dívida referente a 2016 e afirma que os valores “serão quitados de acordo com a disponibilidade de recursos em caixa”.

Em junho o governo do Rio voltou a atrasar o pagamento de salários dos servidores ativos, inativos e pensionistas do Poder Executivo. Sem dinheiro em caixa para pagar integralmente os vencimentos de maio, o Estado anunciou que quitaria apenas 70% da folha de pagamento, paga no 10ª dia útil desde março, com desembolso de R$ 1,1 bilhão no dia 14. Ainda não foi anunciado quando o restante do valor será depositado.

O empréstimo, no entanto, deve ser direcionado prioritariamente às Olimpíadas. No texto do decreto, a União informa que os recursos servem como apoio financeiro "para auxiliar nas despesas com segurança pública" em decorrência da realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos na cidade.

Gestão temerária

Para o professor da Uerj e especialista em gestão pública, Rafael dos Santos, chama atenção para a falta de planejamento a longo prazo do governo do Estado. “Há despesas obrigatórias, como serviços de segurança para universidade, limpeza para hospitais, etc... Só no momento de crise você percebe que é preciso redimensionar?"

Ele lembra que é preciso levar em conta também o papel do Poder Legislativo, que aprovou as medidas tomadas pelo Estado, na atual situação e diz que o caso tem relação com má gestão. “Junto com crise financeira é inequívoco que houve uma gestão temerária do dinheiro público. Há uma incapacidade de gestão dos recursos.”

O governo estadual e a presidência da Assembleia Legislativa não haviam se manifestado até as 23h desta quarta-feira (22) sobre as indicações de má gestão de recursos públicos feitas pelo professor Rafael dos Santos.

Publicado na sexta-feira (17), o decreto que declara a calamidade financeira justifica a medida em função da "grave crise econômica que assola o Estado", que impediria o Rio de "honrar seus compromissos" para a realização da Olimpíada de 2016.

O texto autoriza o governo a "adotar medidas excepcionais necessárias à racionalização de todos os serviços públicos essenciais, com vistas à realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016", mas não esclarece quais as implicações da medida.

O governo cita a queda na arrecadação, principalmente no ICMS e nos royalties do petróleo, e diz temer um "total colapso na segurança pública, na saúde, na educação, na mobilidade e na gestão ambiental" devido à falta de recursos. A previsão do déficit do Estado para este ano é de R$ 19 bilhões.