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Um presídio por facção: Rio faz divisão informal de presos para evitar confrontos

Presos são divididos por facções para evitar confrontos - Shutterstock
Presos são divididos por facções para evitar confrontos Imagem: Shutterstock

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

13/01/2017 04h00

No Rio de Janeiro, além do sexo, tipo de crime e pena, também é levada em conta a facção a que o preso pertence na hora de determinar em que unidade o detento irá cumprir a sua pena. A triagem é feita de forma informal e, de acordo com dois agentes penitenciários ouvidos sob a condição de anonimato, é a forma encontrada pelo Estado para evitar confrontos entre os presos.

A Seap (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária) informa apenas que “todos os internos ingressam em uma unidade de triagem, onde são avaliados e transferidos para outra unidade de acordo com o perfil”. Segundo um agente penitenciário, traçar esse “perfil” inclui questões sobre em que região o preso mora e, principalmente, a qual facção pertence. 

Há cadeias comandadas apenas pelo Comando Vermelho, outras destinadas ao Terceiro Comando Puro, Amigos dos Amigos e até uma separação apenas para milicianos. Há ainda os presídios “neutros”, em que são colocados aqueles sem facção, como idosos e estupradores, que costumam ser rejeitados pelos grupos criminosos.

Até outubro, os poucos presos do Primeiro Comando da Capital no Estado ficavam junto aos do CV. Após o rompimento entre as facções, eles foram transferidos para alas a parte. A Seap informou que tomou medidas necessárias para resguardar os detentos, mas não quis dar mais detalhes sobre as transferências por segurança.

“A pior facção para custodiar é o Comando Vermelho”, conta um agente que trabalhava no Instituto Penal Vicente Piragibe, no complexo prisional de Bangu. Em 2013, 31 presos escaparam do local, uma das unidades separadas exclusivamente para o CV.

“Eles vão para o combate. As outras facções, ADA, Terceiro Comando Puro, vêm de outra origem, nunca tiveram uma política de enfrentamento com a polícia. São melhores para trabalhar, aceitam mais”, diz.

A organização por facções influencia na própria rotina com os presos. Nas cadeias do CV, lembra o agente, “nunca vem um preso sozinho falar com você”. “Se vier sozinho os outros acham que ele pode passar informação”, conta. “As cabeças [líderes da facção] não dão trabalho, cumprem tudo direito. Eles jogam os presos na hierarquia mais baixa para te provocar, agredir, testar, ver até onde você vai.”

Isabel Lima, coordenadora da área de Violência Institucional e Segurança Pública da Justiça Global, vê com reservas a divisão por facções. “É preocupante que o Estado opere com essa lógica, principalmente levando em conta que as facções surgem e se fortalecem no ambiente prisional”, afirma. Para ela, mais que o aumento de vagas em presídios bradado pelo governo, é necessário começar a falar em desencarceramento -- 42,7% dos presos no Rio estão detidos provisoriamente. “Isso é urgente”, diz.

O defensor público Marlon Barcellos, coordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário da Defensoria Pública do Rio, ressalta os riscos da medida. “Você atende ao Estado evitando os conflitos dentro dos presídios, mas pensando no âmbito da segurança pública, reforça os laços e acaba recrutando mais gente para esses grupos, que atuam fora da cadeia muitas vezes com ordens de quem está preso.”

Atualmente, o Rio possui cerca de 50 mil presos. Superlotado, o sistema tem, de acordo com Barcellos, capacidade para receber 27.500 detentos.

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