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Greve suspende visitas em Bangu: "nos tratam como bicho", diz mulher de preso

Parentes de presos formam fila na porta do Complexo Penitenciário de Bangu, no Rio - Hanrrikson de Andrade/UOL
Parentes de presos formam fila na porta do Complexo Penitenciário de Bangu, no Rio Imagem: Hanrrikson de Andrade/UOL

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

17/01/2017 15h00Atualizada em 17/01/2017 16h41

A porta do Complexo Penitenciário de Bangu, na zona oeste carioca, foi o limite para quem tentou ir às unidades prisionais com visitas programadas para esta terça-feira (17). Na segunda (16), a categoria decidiu cruzar os braços para pressionar o Executivo a quitar os salários atrasados e atender outras reivindicações.

Entre as pessoas surpreendidas pela suspensão da visita estava Ana Clara*, 23, mulher de um detento que se encontra na Cadeia Pública Jorge Santana. Ela disse ter chegado ao local por volta de 19h do dia anterior na tentativa de garantir um bom lugar na fila. As senhas começam a ser distribuídas por volta de 2h.

Durante a madrugada, a jovem soube que a greve havia sido aprovada, mas disse "não ter levado fé". Por volta de 12h, ainda permanecia na porta do complexo penitenciário, mas sem muita esperança.

"Quem cometeu um crime está lá dentro pagando. Mas parece que estamos pagando também. A gente não tem nada a ver com isso", afirmou ela. "Nos tratam como bicho."

Ana Clara levava consigo bolsas com biscoitos, leite e sabonete, entre outros itens. Nesta terça, ela também entregaria ao marido uma marmita com arroz e frango. "Isso aqui já era. Estragou", disse.

Segundo ela, o gasto semanal com suprimentos destinados ao detento é de R$ 150, que se somam aos R$ 30 que ela paga com transporte de ida e volta até São João de Meriti, na Baixada Fluminense. "Quem está aqui é porque ama muito", resume.

Maria Carolina*, 19, mora em Paraty, na região da Costa Verde do Estado, e diz vir ao Rio toda semana para visitar o namorado, preso na Cadeia Pública Pedro Melo da Silva. Na visão dela, os familiares dos presos "não têm culpa" pelo caos financeiro no Estado e pela crise no sistema penitenciário.

Contudo, a jovem diz reconhecer que a situação dos servidores é extremamente delicada e que "cada um tem o seu direito".

"São R$ 78 só de ida que eu perdi aqui hoje. Ainda vou voltar para a rodoviária e pagar mais uma passagem. Eles estão sem receber, mas a gente não tem culpa", declarou ela, cujas despesas com suprimentos chegam a quase R$ 250 reais.

Monique*, 23, levou o filho de nove meses na tentativa de visitar nesta manhã o marido, sob custódia na Cadeia Pública Jorge Santana. Seria a segunda vez que o detento teria oportunidade de estar com o filho.

"A primeira vez que eu trouxe ele aqui tem quase quatro semanas. Ele está esse tempo todo sem ver o pai", reclamou ela, que saiu de casa às 5h20 para chegar ao portão do complexo penitenciário por volta de 9h. Mãe e filho moram em Maricá, na região metropolitana, e levaram quase quatro horas na viagem.

Segundo o Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Rio, os agentes e inspetores penitenciários compareceram ao trabalho, mas não estão desempenhando qualquer tarefa que não seja "essencial" --como alimentação, emergência médica e cumprimento de alvará de soltura.

Além das visitas, também foram vetadas a entrada de novos presos e a saída de detentos para audiências em varas criminais. A entidade que representa a categoria informou que ainda não há uma estimativa de adesão à paralisação.

Reivindicações

Sem o pagamento das horas extras do segundo semestre de 2016 e também sem as gratificações por metas desde 2015, os agentes reclamam ainda o pagamento do salário de dezembro e do 13º. Eles prometem permanecer assim até a próxima segunda, quando haverá uma nova assembleia.

Os agentes também reclamam das más condições de trabalho -- ao UOL, dois agentes relataram sob a condição de anonimato uma rotina de insegurança e pressão. "Tem presídios com 3.000 pessoas e um efetivo de oito, nove, dez pessoas trabalhando em um dia bom", afirmou um agente.

Em nota, a Seap afirmou que, mesmo com a greve, possui um "plano de segurança para manter a rotina das unidades prisionais". "A situação está dentro da normalidade", informou o órgão, em nota.

Já a Secretaria de Fazenda informou que o salário de dezembro dos servidores da segurança pública deve ser depositado até o fim da semana, mas não soube informar quando o restante dos funcionários irá receber. Até o momento, apenas os professores tiveram o 13º, pago com recursos do Ministério da Educação, depositado. O restante dos servidores teve o salário de novembro quitado apenas nesta segunda.

*Os nomes foram modificados a pedido das entrevistadas