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Extradição de acusado de matar menino Joaquim pode levar até 6 anos na Espanha

O padastro de Joaquim, Guilherme Longo, estava foragido desde o ano passado - 22.nov.2013 - Silva Junior/Folhapress
O padastro de Joaquim, Guilherme Longo, estava foragido desde o ano passado Imagem: 22.nov.2013 - Silva Junior/Folhapress

Eduardo Schiavoni

Colaboração para o UOL, em Ribeirão Preto

04/05/2017 04h00

O brasileiro Guilherme Longo --acusado da morte do enteado, o menino Joaquim Pontes Marques, de 3 anos, em 2013- está preso desde quinta-feira (27) na Espanha. Ele, que não podia deixar o Brasil sem autorização judicial, usou o nome falso do primo Gustavo Triani, para fugir do país.

Ao ser preso na quinta, Longo passou a ser investigado pelo país europeu por uso de documentos falsos. Se denunciado pela Justiça espanhola, porém, Longo só poderá ser extraditado para o Brasil depois do julgamento e, se condenado, após o cumprimento da pena. Isso indica que, no total, a extradição do acusado para o Brasil pode demorar mais de seis anos para ser executada. 

Foragido desde setembro de 2016, Guilherme Longo foi preso em Barcelona após ser localizado por meio de uma denúncia feita pela internet a Arthur Paes, pai do menino Joaquim. Longo foi denunciado por homicídio triplamente qualificado, cuja pena pode chegar a 30 anos de prisão. O padrastro de Joaquim era um dos homens mais procurados do Estado. A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo oferecia recompensa de até R$ 50 mil a quem desse informações sobre o suspeito.

Além do processo de extradição, que pode ser longo, a Interpol esclareceu ainda que a Espanha deve decidir, antes da extradição, se processará Longo pelo uso de documento falso e, se for o caso, se vai querer que o brasileiro cumpra a pena na Europa. A pena prevista para o uso de documentos falsos é até três anos de prisão. A decisão sobre essas questões cabe exclusivamente às autoridades espanholas e que só se dará durante o processo de extradição.

Segundo a Interpol, procurada através da assessoria de imprensa da Polícia Federal, apesar de advogados e integrantes do Ministério Público terem chegado a declarar que Longo estaria no Brasil em dois dias após a prisão, só o processo de interdição pode levar mais de dois anos. De acordo com a lei espanhola, antes de atender ao pedido de extradição, o país tem a obrigação de garantir que a pessoa extraditada seja abrigada em um estabelecimento que se enquadre no padrão internacional de direitos humanos de tratados internacionais.

Menino Joaquim tinha 3 anos quando foi morto em 2013 no interior de São Paulo - Reprodução - Reprodução
Menino Joaquim tinha 3 anos quando foi morto em 2013 no interior de São Paulo
Imagem: Reprodução
Segundo o professor de Direito Penal e Internacional Daniel Pacheco, da USP (Universidade de São Paulo), "nesses casos, é comum que o país que recebe a solicitação envie uma equipe ao país que pede a extradição para averiguar a situação". "Se o presídio não atender às exigências internacionais de direitos humanos, a Espanha pode não enviar o Guilherme Longo ao Brasil.”

“Nesses casos, é comum que o país que recebe a solicitação envie uma equipe ao país que pede a extradição para averiguar a situação. Se o presídio não atender às exigências internacionais de direitos humanos, a Espanha pode não enviar o Guilherme Longo ao Brasil”, conta o professor de Direito Penal e Internacional Daniel Pacheco, da USP (Universidade de São Paulo).

“Não se pode colocar um tempo para a tramitação de um processo judicial, mas podemos estimar que, se condenado, é muito difícil que todo o trâmite e o cumprimento da pena sejam finalizados em menos de seis anos”, conta o também professor de Direito Internacional da USP Caio Gracco. Nesse período, ressalta o professor, o processo no Brasil ficaria suspenso e só teria andamento depois que ele cumprir a pena na Espanha. “Com isso, não há chance de o crime prescrever”, conta.

A própria acusação contra Longo no Brasil já dá como certa a denúncia espanhola. Alexandre Durante, assistente de acusação que representa o pai do menino Joaquim no processo, acredita que o caso deve se arrastar. “Acredito que, pelo fato de usar um documento que não era nele para entrar no país e permanecer lá, o Guilherme deve responder na Espanha para só depois voltar ao Brasil”, disse.

Procurado, o pai de Joaquim, Arthur Paes, afirmou que tem consciência que ele pode ficar preso na Espanha e comemorou o fato. “Enquanto ele estiver preso na Espanha, pelo menos tenho a certeza que nenhum promotor vai ter da brilhante ideia de colocá-lo de volta na rua por algum motivo jurídico qualquer”, disse.

A reportagem tentou contato com Antonio Carlos, advogado que representa Guilherme Longo, mas ele não foi localizado para comentar nem retornou às ligações.

Semelhanças com foragido do mensalão

Segundo Gracco, o caso de Guilherme Longo tem muitas similaridades com o de Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil condenado a 12 anos e sete meses de prisão por formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro no mensalão. Ele fugiu od país em novembro de 2013 usando documentos do irmão morto, mas foi preso em Maranello, na Itália, em fevereiro de 2015.

No caso de Pizzolato, que tinha cidadania italiana, a Justiça daquele país abriu mão de punir o crime do uso irregular dos documentos e optou por enviá-lo ao Brasil, o que ocorreu em outubro de 2015. “Não se pode dizer que as Justiças da Itália e da Espanha sejam iguais, e é preciso lembrar que o Guilherme Longo não foi julgado no Brasil, mas é possível que a Espanha abra mão do direito de punir Guilherme Longo para que ele seja julgado no Brasil”, avalia Grecco.

O Ministério Público acredita que a hipótese ocorrida no caso de Pizzolato acabará se repetindo com Longo e que, devido à gravidade do crime no Brasil, a Justiça espanhola poderá abrir mão do direito de punir o brasileiro. “Acredito que eventual crime de falsidade cometido lá não vá atrasar o seu processo de extradição e que as autoridades espanholas dariam prioridade para a Justiça brasileira”, conta.

Entenda o caso

Segundo as investigações, Joaquim foi vítima de uma dose excessiva de insulina, aplicada pelo padrasto. Seu corpo foi jogado no rio, perto de sua casa em Ribeirão. O acusado inicialmente negava o crime, mas depois confirmou à RecordTV. Em seguida desmentiu e alegou ter inventado a história porque teria ganhado dinheiro para conceder a entrevista. Entretanto, em outra reviravolta antes da fuga, deixou uma carta na qual novamente deu a entender que teria matado o enteado.

No período em que Longo ficou foragido, o pai biológico de Joaquim, Arthur Paes, fez campanha para localizá-lo. Chegou a instalar outdoors na região de Ribeirão Preto. Ao chegar ao Brasil, Longo será encaminhado ao presídio de Tremembé, no interior paulista, onde deverá aguardar pelo julgamento, ainda sem data definida. Ele estaria na Espanha há poucos dias e ainda procurava um lugar para morar.