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São Carlos: Polícia acusa família de enterrar caixão vazio para ficar com seguro

Exumação em São Carlos encontra um saco de serragem em vez de um corpo após suposto golpe - Divulgação/Milton Rogério/São Carlos Agora
Exumação em São Carlos encontra um saco de serragem em vez de um corpo após suposto golpe Imagem: Divulgação/Milton Rogério/São Carlos Agora

Eduardo Schiavoni

Colaboração para o UOL

01/06/2017 04h00

A Polícia Civil de São Carlos desvendou um golpe que, segundo as investigações, tinha como objetivo dar um desfalque milionário em seguradoras no interior de São Paulo. Um ex-agente funerário, a filha dele e o genro, que é vendedor de seguros, além de um médico, que assinou um atestado de óbito falso, foram denunciados.

Um caixão sem corpo chegou a ser enterrado, mas depois de uma denúncia anônima, a polícia encontrou a suposta morta e frustrou o golpe. Ela, Cristiane da Silva, 39, agora tenta provar que está viva e recuperar sua identidade civil.

Segundo as apurações, um ex-agente funerário, Eduardo Bezerra da Silva, 47, usou documentos de uma moradora de rua para fazer cinco apólices de seguro em quatro seguradoras diferentes. Os valores variavam entre R$ 800 mil e R$ 1,4 milhão, e ele colocou a filha, Sara Bezerra, como beneficiária. O grupo contava ainda com o genro do ex-agente, Thomas Lopes, um corretor de seguros, e um médico, Hugo Gusmão, que trabalhava na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) e forneceu o atestado de óbito.

O esquema começou a ser arquitetado em junho do ano passado, quando Eduardo Bezerra da Silva conheceu a moradora de rua. Ele se aproximou dela e afirmou que iria ajudá-la. O ex-agente funerário deu dinheiro a Cristiane e levou-a até o Poupatempo, onde deu entrada na segunda via de documentos como RG e CPF. De posse dos protocolos, ele mesmo retirou os documentos. Cristiane, que é de Matão (SP), deixou a cidade de São Carlos meses depois, até então sem saber do golpe.

Em outubro, o genro de Eduardo fez seis apólices de seguros de vida em nome de Cristiane e colocou a mulher dele como beneficiária. A partir de então, o ex-agente funerário começou a cooptação do médico, que era conhecido da família, para o esquema.

O profissional da saúde só aceitou participar do golpe em janeiro de 2017. Ele atestou, na noite de 28 de janeiro, o falecimento de Cristiane, colocando morte súbita como causa do óbito. O endereço do ex-agente foi colocado como sendo residência da mulher declarada morta.

No dia seguinte, com o atestado de óbito e documentação, Eduardo Bezerra da Silva, que na época ainda trabalhava em uma funerária da cidade, preparou um caixão, que foi lacrado, e fez o enterro no cemitério Nossa Senhora do Carmo. Para isso, ele fez o pagamento dos custos do serviço, no valor de R$ 131,92, e comprou um túmulo para Cristiane, no valor de R$ 1.548,18.

O grupo esperou mais de dois meses para continuar o golpe. Em 20 de março, a filha do ex-agente foi ao cartório e, munida do atestado de óbito, conseguiu a declaração oficial de óbito, necessária para fazer o resgate das apólices.

Investigação

Nessa época, a Polícia Civil da cidade já havia recebido a denúncia e investigava o caso. O grupo ficou sabendo da investigação e não chegou a tentar resgatar as apólices.

Em abril, o delegado Walkmar da Silva Negré, responsável pelo caso, localizou a moradora de rua, em Matão. Ela contou à polícia detalhes da “ajuda” que recebeu do ex-agente funerário, que foi identificado na sequência pelas autoridades policiais.

“Conseguimos localizá-la e ela contou o que tinha acontecido. A partir daí, continuamos as investigações e chegamos à identidade dos envolvidos”, conta Walkmar.

Após seguir as pistas, o delegado resolveu abrir inquérito contra os quatro envolvidos por estelionato, falsidade ideológica e associação criminosa. Além disso, solicitou à Justiça a exumação do caixão onde Cristiane supostamente estaria enterrada, o que aconteceu no último fim de semana.

O coveiro Aparecido Gonçalves, que participou tanto do enterro quanto da exumação do corpo, se disse surpreso com a audácia dos criminosos. Segundo ele, havia apenas uma pedra e um saco com material semelhante a serragem quando o caixão foi aberto. “Foi a primeira vez que eu desenterrei um caixão, abri e não vi o corpo”, disse.

Segundo o delegado, Cristiane não teve nenhuma relação com o crime e não será indiciada. A advogada dela, Sandra Nucci, informou que a cliente foi enganada e que irá trabalhar, agora, para provar ao Judiciário que ela está viva.

Outro lado

O advogado de defesa dos envolvidos, João Carlos Cazu, afirmou que os seus clientes estão interessados em esclarecer o caso da forma mais rápida possível e que a ação do grupo não registrou nenhum prejuízo financeiro às seguradoras.

“Eu não posso dar detalhes, porque o inquérito está em fase de investigação, mas o importante é que todos os envolvidos estão empenhados em esclarecer isso da melhor forma possível. Tudo que está sendo feito é para provar o que realmente aconteceu e punir os responsáveis”, disse.

A Polícia Civil não divulgou quais são as seguradoras prejudicadas, mas informou que elas já foram notificadas e que estão levantando a existência das apólices, que serão juntadas como provas no inquérito.

A polícia também não divulgou o nome da funerária onde o ex-agente trabalhava na época que começou a arquitetar o golpe, mas disse que ele pediu demissão dias depois de realizar o sepultamento falso e que a empresa não estava ciente da ação. Já a Prefeitura de São Carlos informou que o médico Hugo Gusmão não trabalha mais na UPA e que irá apurar o suposto desvio de conduta do profissional.